Por Gru.a
Abrigos do Vale (texto fornecido pelos autores)
Os Abrigos do Vale fazem parte de um conjunto de 3 edificações projetadas para um sítio no Vale das Videiras, região serrana do Rio de Janeiro: “Pavilhão” (primeiro a ser construído, em 2016), “Abrigo Alto” e “Abrigo Baixo” projetados em 2019 e finalizados em 2022. Cada um, com 30m2 de área interna, tem espaço reservado para dormir – fechado por uma leve cortina -, uma sala ligada a um deck frontal, uma pequena copa e um banheiro completo.
Pavilhão, Abrigo Alto e Abrigo Baixo, respectivamente.
Fotografias: Rafael Salim e Federico Cairoli (Pavilhão) / Rafael Salim (Abrigos)
Os Abrigos do Vale seguem o mesmo sistema construtivo e módulos espaciais: vãos de 3m e 5m com apoios que variam de pilares em madeira a muros de alvenaria cerâmica. O vigamento de madeira maciça sustenta a cobertura em painéis de telha trapezoidal termoacústica, que se debruçam formando beirais de até 1,75m.
Fotografia: Rafael Salim
Nos ambientes mais controlados (quarto e banheiros) uma fina laje em concreto armado funciona como forro, criando uma dupla camada de isolamento em relação ao exterior.
Abrigo Alto: Planta de piso inferior, térreo e cobertura + cortes
Abrigo Baixo: Planta de piso inferior, térreo e cobertura + cortes
No trecho que se debruça sobre a vista do vale, o “Abrigo Baixo” tem como fechamento um pano de painéis em compensado sarrafeado que se abre em duas alturas diferentes, remetendo ao sistema tradicional de portas de fazenda. Enquanto o “Abrigo Alto” tem como fechamento um pano de vidro em toda sua extensão, que, somado ao fechamento superior, conforma uma caixa translúcida e reflexiva.
Fechamentos Abrigo Baixo e Alto, respectivamente
Fotografias: Rafael Salim
Pavilhão das Videiras
O projeto para o pavilhão anexo a uma residência no Vale das Videiras, Rio de Janeiro, parte da premissa de disponibilizar um espaço aberto e, ao mesmo tempo, protegido do forte sol e chuva que incidem sobre a região. Localizada num platô pré-existente, a edificação foi pensada em função de sua relação com a casa situada no terreno, ativando o espaço intermediário entre as duas edificações.
Implantação
O grande plano de cobertura se inclina suavemente em direção ao vale, trazendo para o espaço interior a presença da encosta que se ergue paralelamente à nova construção.
Fotografia: Rafael Salim e Federico Cairoli
Abaixo da grande cobertura foram projetados uma cozinha, associada a um espaço para refeições, uma sauna e um espaço de 30m² de área coberta em que o solo vegetal se manteve intacto.
Pavilhão: Planta + corte
A associação de diferentes sistemas estruturais se dá de maneira a explorar as características de cada um deles: fundações em concreto moldado in-loco, pilares e vigas em madeira maciça, muros em alvenaria estrutural e lajotas em concreto pré-fabricado e ligações em aço.
Fotografia: Rafael Salim e Federico Cairoli
Sobre o projeto: Entrevista exclusiva para MDC.
por Pedro Varella (P.V.) e Caio Calafate (C.C.)
MDC – Como vocês contextualizam essa obra no conjunto de toda a sua produção?
P.V. / C.C. – As obras que estamos apresentando nesta publicação têm um lugar importante no conjunto da nossa obra, pois atravessam seis anos da produção do escritório. O Pavilhão e os Abrigos do Vale da Videiras foram construídos dentro de um mesmo sítio, entre 2016 e 2022, um arco de tempo bastante amplo. Antes deles, algumas questões já vinham sendo exploradas em obras que acabaram não sendo construídas, e, por sua vez, a sua realização vem mobilizando temas que tocam as obras que as sucederam, inclusive dentro do próprio sítio, como a Academia, já construída, e a Lavanderia, em obras.
O Pavilhão, primeira obra realizada dentre as três, foi uma espécie de exercício inaugural tectônico/construtivo de todo o conjunto, e, porque não, da produção de pequenas arquiteturas desenhadas no escritório. Nesta obra, a primeira que arrancamos do chão ao teto, pudemos operar algumas ideias que já vínhamos debatendo no escritório desde sua fundação, em 2013, como a relação da arquitetura com o solo, as questões relacionadas aos encaixes dos diferentes materiais, a serialidade/modularidade, a poética das coberturas e sua relação com o céu e, no limite, com o cosmos. Nos abrigos, que vieram cerca de dois/três anos depois, demos continuidade a essas pesquisas, adicionando outras temáticas que se impuseram pelas contingências geográficas/topográficas do trecho do sítio onde vieram a se implantar, e também pelo programa (abrigo), que exigiu a criação do hermetismo demandado pelo uso, condição distinta daquela exigida pelo Pavilhão. Assim sendo, o problema das vedações se impôs como uma novidade. No caso do Abrigo Alto, assim chamado por situar-se no trecho alto do terreno, desenhamos (como mediação com a paisagem) uma caixa de vidro que permite ampliar as visuais em direção ao horizonte. No caso do Abrigo Baixo, situado no trecho baixo do terreno, mais próximo à estrada de acesso, projetamos as fenestrações frontais com lâminas de compensado, guardando privacidade ao mesmo.
MDC – Como foi o mecanismo de contratação do projeto?
P.V. / C.C. – Estas obras tiveram contratação direta por cliente particular.
MDC – Como foi a fase de concepção do projeto? Houve grandes inflexões conceituais? Vocês destacariam algum momento significativo do processo?
P.V. / C.C. – Um dado particular deste projeto foi o trabalho de investigação das tecnologias construtivas tradicionais e passíveis de construção com equipe locais, de onde a utilização das fundações e lajes em concreto armado e o trabalho de alvenaria estrutural se apresentaram como boas opções. Junto a isso, trouxemos repertórios não tão convencionais na área, embora razoavelmente simples do ponto de vista executivo, como o telhado em telha termoacústica e junções metálicas. A concepção das três obras obedeceu a premissas que propusemos ao cliente, que desde o início, aprovou as escolhas. Em todas as três obras dedicamos muito tempo preliminar em visitas de observação e exploração das questões geográficas do terreno, algo que vemos como fundamental não apenas nestas, mas em todas as demais obras da nossa produção.
MDC – Nas etapas de desenvolvimento executivo e elaboração de projetos de engenharia houve participação ativa dos autores? Houve variações de projeto decorrentes da interlocução com esses outros atores que modificaram as soluções originais? Se sim, podem comentar as mais importantes?
P.V. / C.C. – Tivemos sempre um diálogo profícuo tanto com os projetistas de engenharia quanto com a equipe de obra. As três obras são relativamente simples do ponto de vista construtivo e programático, o que indica um processo com participação de poucos projetistas. Além dos arquitetos da nossa equipe, tivemos apenas a participação de um engenheiro calculista, o que foi essencial para que chegássemos a um bom dimensionamento das peças estruturais. No caso dos abrigos, o diálogo com os construtores locais – prévio ao desenvolvimento dos projetos – foi fundamental para que fossem elaboradas soluções condizentes com sua cultura construtiva.
MDC – Os autores dos projetos tiveram participação no processo de construção/implementação da obra?
P.V. / C.C. – Como a obra foi construída em local distante, fora da cidade em que atuamos, o trabalho exigiu comunicação intensa e atenta com o construtor, tanto nas fases preliminares quanto nos acabamentos finais. Foram realizadas visitas pontuais ao canteiro de obras. Esses momentos foram essenciais para a adequação de detalhes construtivos às possibilidades dos fornecedores. Isso se deu de forma mais intensa com os elementos fabricados em serralheria e marcenaria.
MDC – Vocês destacariam algum fato relevante da vida do edifício/espaço livre após a sua construção?
P.V. / C.C. – Sim. Tem algo bonito que já se apresenta no Pavilhão. Uma vegetação toma hoje os pilares de madeira, ensejando algum entrosamento entre a construção e os elementos naturais.
MDC – Se esse mesmo problema de projeto chegasse hoje a suas mãos, fariam algo diferente?
P.V. / C.C. – Certamente. A despeito de gostarmos muito das obras, em todos os casos teríamos considerações a fazer, seja pelo simples desejo de fazer diferente, pela necessidade de antecipar problemas não previstos, mas, sobretudo, para dedicar mais tempo ao desenvolvimento de detalhes que gostaríamos de aperfeiçoar.
MDC – Como vocês contextualizam essa obra no panorama da arquitetura contemporânea do seu país?
P.V. / C.C. – Vemos como uma pequena contribuição a pesquisa e produção de arquitetas e arquitetos cuja obra admiramos e esperamos poder dialogar.
projeto executivo
PARTE 1:
ABRIGO ALTO
11 pranchas (pdf).
1,51mb
PARTE 2:
ABRIGO BAIXO
13 pranchas (pdf).
1,79mb
PARTE 3:
PAVILHÃO
9 pranchas (pdf).
1,07mb
ficha técnica – Abrigo Baixo e Abrigo Alto
Local: Vale das Videiras, Rio de Janeiro – RJ
Ano de projeto: 2019
Ano de conclusão: 2022
Autores: Pedro Varella, Caio Calafate, André Cavendish, Ingrid Colares, Antonio Machado
Área construída: 70m²
Cálculo estrutural: Rodrigo Affonso
Projeto de Iluminação: Maneco Quinderé
Construção: Alexandre M.
Fotos: Rafael Salim
ficha técnica – Pavilhão Videiras
Local: Vale das Videiras, Rio de Janeiro – RJ
Ano de projeto e conclusão: 2016
Autores: Pedro Varella, Caio Calafate, Sergio Garcia-Gasco, André Cavendish
Área construída: 150m²
Cálculo estrutural: Rodrigo Affonso
Projeto de Iluminação: Maneco Quinderé
Construção: Aleandro Souza da Silva
Fotos: Federico Cairoli e Rafael Salim
Fotos de obra: Gru.a
Contato: info@gruaarquitetos.com
galeria
colaboração editorial
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VARELLA, Pedro. CALAFATE, Caio. CAVENDISH, André. COLARES, Ingrid. MACHADO, Antonio. GARCIA-GASCO, Sergio. “Abrigo Alto, Abrigo Baixo e Pavilhão”. MDC: Mínimo Denominador Comum, Belo Horizonte, s.n., set-2023. Disponível em //www.28ers.com/2023/09/06/abrigo-alto-abrigo-baixo-e-pavilhao. Acesso em: [incluir data do acesso].