Danilo Matoso – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com Wed, 25 Oct 2023 02:29:06 +0000 pt-BR hourly 1 //i0.wp.com/28ers.com/wp-content/uploads/2023/09/cropped-logo_.png?fit=32%2C32&ssl=1 Danilo Matoso – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com 32 32 5128755 Danilo Matoso – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2012/12/20/oscar-niemeyer-em-belo-horizonte-muito-ainda-que-ser-dito/ //28ers.com/2012/12/20/oscar-niemeyer-em-belo-horizonte-muito-ainda-que-ser-dito/#respond Fri, 21 Dec 2012 01:13:56 +0000 //28ers.com/?p=8230 Continue lendo ]]> serie-oscar

Danilo Matoso Macedo

Croquis de Oscar Niemeyer alusivo à sua participação no projeto da sede do Ministério da Educação e Saúde Pública, em 1936, com a colaboração inicial de Le Corbusier.

Parece que tudo já foi dito sobre Oscar Niemeyer ?parafraseando Drummond.

Assim seria se o mestre centenário, como um deus mitológico, não teimasse em assumir forma humana e descer à terra das obras monumentais para, com astúcia e poder, subtrair aos arquitetos locais a possibilidade de primazia em suas próprias gerações. Sua lição profissional, na verdade, sempre foi a da vitalidade que pulsa na lavra cotidiana dos assuntos do ofício da arquitetura. Por mais que seu traço leve teime em ocultar o peso dessa maturidade, ela é visível nas hábeis soluções de planta, na escala humana, na inteligente implantação de suas obras em Belo Horizonte.

E sempre há algo mais que ser dito sobre a obra de Oscar Niemeyer.

A capital mineira oferece um ponto de vista privilegiado para uma visão panorâmica do trabalho do arquiteto. Está próxima do Grande Hotel de Ouro Preto, obra de 1938 fundamental na constituição de um doméstico, tátil e multicolorido nativismo moderno, por assim dizer, com uma articulação de materiais recorrente em sua trajetória profissional de quase oitenta anos. A profícua relação com Juscelino Kubitschek prefeito se iniciaria em Pampulha, no início da década de 40, com a casa do estadista, o Cassino, a Casa do Baile, o Iate Clube, o Golfe Clube e a Igrejinha. Ela amadureceria dez anos depois com Juscelino governador, nos edifícios da Praça da Liberdade e da Praça Sete de Setembro, e no Colégio Estadual Central. Ela chegaria ao ápice em 1957, evidentemente, nos edifícios de Brasília.

Na Capital Federal, a arquitetura de Oscar Niemeyer atingiria um alto nível de concisão formal e conceitual, a que ele cada vez mais se afeiçoaria. Se os volumes puros do Colégio Estadual Central já prenunciavam esse viés, ele pode ser bem apreciado nos espaços abertos encimados por vigas de concreto aparente no Pampulha Iate Clube e, mais recentemente, na alvura da Cidade Administrativa, talho purista na periferia da cidade que ocupação humana agora talvez comece a cicatrizar.

Niemeyer tratou de aquilatar pessoalmente suas realizações, à frente da revista Módulo, que circulou ?com um hiato de onze anos ?desde 1955 até o final da década de 80. Além de seus projetos e de outros arquitetos brasileiros, a revista trouxe à tona seu profícuo discurso escrito, iniciado com uma vigorosa campanha explicativa simultânea à construção de Brasília. Uma energia que infelizmente aos poucos esmaeceu ?após a Módulo ?numa coleção de anedotas e máximas articuladas em textos invariavelmente similares, que em todo caso bem servem para neutralizar o achaque das centenas de admiradores e dos críticos. O escritório de Niemeyer em Copacabana, de fato, parece ser parada obrigatória de toda celebridade do mundo da arquitetura que aporta no Rio de Janeiro, e espalhados nas mesas da sala de recepção encontram-se diversos livros com obras dos maiores arquitetos do mundo no último século, sempre com dedicatórias de seus autores. Trata-se de um reconhecimento refletido não apenas nos prêmios internacionais que recebeu, como também nas dezenas de trabalhos realizados em diversos países.

A influência de Oscar Niemeyer na arquitetura mundial é ainda imensurável. Cabe-nos agora documentar não apenas o rico acervo que o mestre vem deixando, como registrar a notável habilidade de muitos de seus colaboradores, de modo a atenuar o seu ofuscamento pelo brilho de nosso arquiteto maior. Desde Nauro Esteves, responsável pelo desenvolvimento das obras dos anos 50 em Minas Gerais; passando por Milton Ramos, que trabalhou na obra do Palácio do Itamaraty, e depois viria a ser autor do projeto do Aeroporto de Confins; até o pernambucano Glauco Campello, responsável por obras em Brasília e na Itália. Isso sem esquecer os engenheiros Joaquim Cardozo e Marco Paulo Rabello ?um responsável por grande parte dos cálculos estruturais, e outro à frente da construção de muitas das melhores obras. Estes são apenas alguns entre dezenas de profissionais hoje espalhados pelo mundo e com destacadas carreiras autônomas.

E sempre haverá algo mais que ser dito sobre a obra de Oscar Niemeyer.

Brasília, abril de 2012
Texto publicado originalmente, com pequenas alterações, na edição de maio de 2012 da revista Encontro, de Belo Horizonte.


Danilo Matoso Macedo
Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004), editor da revista mdc.

contato: danilo@mgs.28ers.com | www.danilo.28ers.com


Veja todas as matérias da série Oscar Niemeyer 1907-2012.

Veja todas as matérias sobre Oscar Niemeyer já publicadas na revista MDC.

Colaboração editorial: Luciana Jobim

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Danilo Matoso Macedo

Há homens que veem tudo de uma só cor, quase sempre preto. Eu vejo preto, branco, roxo, vermelho, amarelo. Vejo tudo de todas as cores do arco da velha. Aquele que vê uma cor só é mais pobre do que aquele que vê as sete cores. O homem que tem uma ideia só sobre um assunto é mais pobre do que aquele que tem duas. Dois valem mais do que um, pelo menos assim me ensinaram.

Rubens Borba de Moraes, Domingo dos séculos, 1924

Ao tomar conhecimento da revista MDC, Joaquim Guedes, imaginou ser a letra M correspondente a movimento. Talvez ele tenha se decepcionado ao constatar que nossas aspirações eram mínimas. Ponderou então, relembrando um antigo professor marxista, que os dois atributos do ser são a matéria e o movimento. E que se movimento é vida, ou nós lemos a vida e fazemos boa arquitetura ou não lemos e não fazemos nada

A Semana de Arte Moderna, realizada no Teatro Municipal de São Paulo em 1922, não iniciou a arte moderna no Brasil, mas certamente colocou em movimento um modo moderno de discuti-la. Glorioso de antemão, no dizer de Mário de Andrade, o evento cumpriu seu propósito de alavancar jovens artistas, não só da metrópole em formação como de outras paragens ?como o próprio Rio de Janeiro ? para um plano de destaque na cultura nacional. Vinte anos depois, já era História rememorada e celebrada pelo próprio Mário.

Mitificado, combatido, recuperado, novamente combatido, o modernismo brasileiro ainda persiste entre nós. Mas a que modernismo brasileiro nos referimos?

Seria o expressionismo de Anita Malfatti e Di Cavalcanti? A estilização de Victor Brecheret e Vicente do Rego Monteiro? Ou o pontilhismo da belorizontina Zina Aita? Talvez a arquitetura despretensiosamente vernácula do polonês Georg Przyrembel. Ou a erudita arqueologia iconográfica dos edifícios de Antônio Garcia Moya…

Se a arte moderna nunca teve uma só causa, tendo bem servido tanto a fascistas como a comunistas, tampouco teve um só estilo. Mesmo assim, costumamos tratar por moderno um grupo restrito de obras. Na arquitetura, basta observar nas ruas que a maior parte da produção edilícia de nossas cidades permanece excluída do ensino em nossas escolas: desde o neocolonial, ainda presente em nossas residências, até o Déco ainda vigente na arquitetura corporativa. Vários estilos e obras, considerados modernos por seus contemporâneos eruditos e mais vanguardistas há um século, mantêm-se até hoje à margem da cultura arquitetônica habitualmente historiografada ?salvo alguns esforços isolados. E se mesmo Aita, Przyrembel e Moya, participantes da própria Semana de Arte Moderna de 1922, permanecem desconhecidos até do público especializado, que dizer de tantos outros…

Recuperando a figura do arquiteto paulista Antônio Garcia Moya, Sylvia Ficher comemora com a revista MDC os 90 anos da Semana de 22, num texto que será publicado na íntegra em três partes. O ar de novidade de fatos tão antigos talvez seja sinal de que neste campo há sempre muito o que por em movimento…


Antonio Garcia Moya, um arquiteto da Semana de 22
por Sylvia Ficher

Parte 1 : ou pro Mario, o Moya era moderno…

Parte 2 : ou la mala suerte…


danilo matoso macedo
Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004), editor da revista mdc.

contato: correio@danilo.28ers.com | www.danilo.28ers.com

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Ruth Verde Zein
Danilo Matoso Macedo

Latin America, for example,
still has no body of theory of its own to show.

Hanno-Walter Kruft, A history of architectural theory.


Como é o lugar
Quando ninguém passa por ele?
Existem as coisas
Sem ser vistas?
(…)
Que fazem, que são
as coisas não testadas como coisas,
minerais não descobertos ?e algum dia
o serão?

Carlos Drummond de Andrade, A suposta existência.


A série Panoramas da Arquitetura Brasileira, que a partir de agora publicamos na seção Ensaio e Pesquisa, tem origem no Simpósio Temático Panoramas da Arquitetura Brasileira Moderna e Contemporânea, organizado por Ruth Verde Zein no I ENANPARQ ?Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, em 30 de novembro de 2010. Naquele evento, nove autores de panoramas apresentaram e discutiram suas obras, seus valores, seus processos de investigação e produção. A reunião tornou claro o impacto daquelas pesquisas na constituição da cultura arquitetônica contemporânea.

A historiografia da arquitetura do século 20 amadureceu um ritual de valoração de obras e autores para além de seu prestígio e reconhecimento locais. Com a expansão das revistas e das exposições, com seus catálogos, a consagração no próprio campo arquitetônico passou a independer do desempenho ou da popularidade das obras. Consolidaram-se assim as funções do crítico de arquitetura, do curador de exposições e do editor de revistas. Suas obras são possíveis portas de entrada de arquitetos e edifícios no panteão da história, e as narrativas desta são influentes elementos formativos das gerações de arquitetos do presente, num ciclo de reprodução de valores.

Do ponto de vista da organização formal, os produtos desse processo crítico e historiográfico poderiam ser divididos em:

a) coletâneas de textos, cuja reunião concertada alavanca uma visão narrativa implícita;

b) catálogos de obras, cuja seleção e reunião implicam uma visão crítica determinada;

c) narrativas panorâmicas, ou seja, esforços para propor explicitamente concatenações de fatos históricos, obras, autores e ideias;

A constituição desta série deve por isso ser tão plural e irrestrita quanto possível. Orientam-nos porém ao menos três objetivos bem determinados. Primeiramente, busca-se explicitar o próprio processo pelo qual as obras são selecionadas e incluídas numa determinada cultura arquitetônica, cujos valores tornam-se mais claros e passíveis de apreciação crítica. Em segundo lugar, compartilham-se as dificuldades, os dilemas e as limitações que a tarefa envolve, potencialmente servindo de estímulo e baliza para aqueles que hoje se dedicam a ela. Por fim, pretende-se tratar especificamente do campo de pesquisa que tem por objeto a própria história da arquitetura, e de sua teoria, em nosso país, cuja falta de divulgação sistemática tem levado a um relativo isolamento intelectual em relação ao meio internacional.

Sintomaticamente, por outro lado, alguns livros panorâmicos clássicos sobre nossa arquitetura são justamente aqueles que, de algum modo, tiveram algum tipo de fecundação estrangeira. Desde o catálogo elaborado por Philip Goodwin para a exposição Brazil Builds, realizada no Museu de Arte Moderna de Nova York em 1943, passando pelo Modern Architecture in Brazil, peça encomendada pelo Itamaraty a Henrique Mindlin para divulgação no exterior  em 1956 ?com introdução de Sigfried Giedion, até Arquitetura contemporânea no Brasil, escrito no final da década de 1960 pelo pesquisador francês Yves Bruand, ?e só publicado, em português, em 1983.

Também no estudo de nossa arquitetura colonial, os textos canônicos são provenientes de estudos de estrangeiros, como L’architecture religieuse baroque au Brésil, de 1956, encomendado pelo IPHAN a Germain Bazin, curador do Louvre; os artigos de John Bury ?compilados por Myriam A. Ribeiro em 1990; e a obra fundamental do norte-americano Robert Chester Smith, publicada na Revista do Patrimônio desde 1940, bem como em periódicos internacionais. Smith é responsável ainda pela introdução de um tipo de panorama ainda raro entre arquitetos brasileiros: a bibliografia comentada. É dele A guide to the art of Latin America, de 1948, e o capítulo sobre arte (e arquitetura) do Manual Bibliográfico de estudos brasileiros, organizado por William Berrien e Rubens Borba de Moraes no ano seguinte.

Se estes pesquisadores contaram com o apoio do Itamaraty e do IPHAN, do restrito grupo de intelectuais do patrimônio veio o conhecimento e parte da base empírica que lhes sustentou. São os trabalhos originais de Lucio Costa, Luis Saia, Joaquim Cardozo, Paulo Santos, seguidos por Sylvio de Vasconcellos e Carlos Lemos ?hegemonia confirmada em autores como Edgar Graeff, Benjamin de Araújo Carvalho, Eduardo Mendes Guimarães ou João Boltshauser. Dentre suas obras panorâmicas destaca-se a influente síntese Quatro séculos de arquitetura, de Paulo Santos, escrita em 1965 e publicada como livro em 1977. Na mesma linha, Carlos Lemos publicava o também sintético Arquitetura Brasileira em 1979, cuja abordagem da arquitetura moderna viria a ser aprofundada no capítulo que lhe coube do abrangente História Geral da Arte no Brasil, organizado por Walter Zanini em 1983. Juntamente aos estrangeiros, esses autores estabeleceram alguns paradigmas conceituais que desde então vêm servindo de base para outros estudos e debates sobre a arquitetura brasileira.

Poucas visões destoavam então daquele uníssono, como a editoria da revista Habitat, conduzida por Lina Bo Bardi nas décadas de 1950 e 1960 ?bastante crítica quanto à arquitetura carioca ? ou o Quadro da arquitetura no Brasil, publicado por Nestor Goulart Reis Filho em 1970, que partia de pressupostos analíticos urbanísticos, bastante distintos. A partir dos anos 1980, porém, a expansão da pesquisa e pós-graduação em arquitetura ampliou de maneira exponencial a quantidade e qualidade de estudos monográficos e setoriais sobre os mais variados temas, obras e arquitetos brasileiros.

Uma nova geração passa a propor as suas próprias leituras, revendo, ampliando e questionando as abordagens anteriores e já canônicas, divulgando-as inicialmente através de artigos pontuais, seja em publicações não acadêmicas (como a seção Ensaio & Pesquisa da revista Projeto ou a seção Documentos da revista AU), seja em publicações universitárias (como a revista Oculum da PUC-Campinas, entre outros). Paulatinamente esses estudos começam a ser publicados em livros cujas abordagens panorâmicas consolidam ou mesmo ultrapassam os paradigmas canônicos existentes. A partir do final dos anos 1990, essas publicações se consolidam, contando-se hoje com alguns panoramas mais amplos, temporal e geograficamente, sobre a arquitetura brasileira. Eles propõem novas abordagens visando uma compreensão de universos históricos mais extensos, complexos e não-lineares.

Esses trabalhos, abordando amplos períodos de tempo, atingindo ou não o momento contemporâneo, nascem de uma variedade de posturas conceituais: podem reforçar, revalidar e dar continuidade aos enfoques propostos pelos panoramas clássicos; podem contrapor-se ou alternar-se àquelas leituras; podem buscar estabelecer novos paradigmas e a abertura para outras possibilidades de interpretação. Em quaisquer casos, os esforços que vem sendo elaborados nesse sentido podem também ser entendidos como releituras da tradição da historiografia moderna brasileira, com vistas à compreensão crítica da nossa produção contemporânea.

Mas apesar desta produção recente, grande parte do ensino e da prática de arquitetura brasileiros segue empregando, nem sempre de maneira crítica, somente aqueles manuais anteriores à década de 1970. Sua leitura, embora útil e informativa, exuma pautas conceituais afinadas a momentos históricos passados. Quase sempre proclama de maneira linear, triunfal e frequentemente excludente, a autonomia, a consistência, a originalidade e a independência da modernidade arquitetônica brasileira, por exemplo.

Esse recurso aos clássicos é natural. Até mesmo pela dificuldade inerente a esse tipo de encargo, ainda há relativamente poucos estudos e pesquisas, realizados e publicados, tratando de nossa arquitetura de modo panorâmico, ou seja, abrangendo de maneira consistente e concertada períodos temporais ou geográficos amplos. Talvez o maior indicador dessa escassez seja a quase total ausência em nosso país de livros-texto abrangentes que deem conta com razoável profundidade de toda a história da arquitetura brasileira, desde a colônia até os dias de hoje.

Por isso, as narrativas de longo curso especificamente são um desafio conceitual importante. Sua produção é mesmo uma necessidade para aqueles que trabalham com a formação, o ensino e a pesquisa. Entretanto, não há seguramente uma maneira certa que determine como realizar tal tarefa; e assim pesquisas ou publicações tratando panoramicamente da arquitetura brasileira, abrangendo amplos períodos temporais e/ou geográficos, exige dos autores ou organizadores que definam com certa clareza os critérios de inclusão (e conseqüentemente, de exclusão) que adotam, os quais assumem de fato uma certa visão de mundo específica, que varia caso a caso.

Nem sempre porém a variedade de abordagens conceituais está clara e explicitamente indicada, e poucas vezes é facilmente perceptível aos leitores. Tal omissão frequentemente está ligada a uma certa compreensão vaga e difusa da mítica existência inconsútil de uma (e apenas uma) arquitetura para cada lugar e período, definida quase sempre de maneira excludente e linear. Esse hábito, nascido de uma visão ideologizada, no limite perpetua uma visão excludente da arquitetura contemporânea ao ser incapaz de compreender um panorama que já se complexificou exponencialmente. E talvez essa tarefa hoje sequer admita delimitações excessivamente rígidas de cunho regional ou nacional, tais como foram celebradas na primeira metade do século 20.

No caso brasileiro, esta abordagem unívoca está relacionada a uma certa confusão conceitual entre os temas de identidade nacional e os temas arquitetônicos, estes aparentemente apoiando e fomentando aqueles, num vínculo que é sempre reforçado embora talvez não seja nem necessário, nem indissolúvel, mas cuja presença constante ainda sombreia o campo. Ela impede ou dificulta abordagens multifacéticas ?ou que priorizem outros paradigmas que não o da identidade nacional ou o do desenvolvimentismo ?que acalentaram as primeiras visões panorâmicas da arquitetura moderna brasileira.

Com vistas a levantar estas questões, dentre outras, propõe-se, com a série Panoramas da Arquitetura Brasileira, o reconhecimento crítico de algumas das publicações de referência, debatendo as perspectivas delineadas pelos projetos, construções e pesquisas em andamento nesta primeira década do século 21. Inicialmente, a série contará com os aportes de Marlene Milan Acayaba e Sylvia Ficher, Hugo Segawa, Carlos Eduardo Comas, Roberto Montezuma, Renato Anelli, Abílio Guerra, Maria Alice Junqueira Bastos e Ruth Verde Zein. Pretende-se ainda expandir estas colaborações com outros autores igualmente fundamentais que não puderam tomar parte do simpósio temático do ENANPARQ devido a contingências circunstanciais. Espera-se com isso contribuir para uma compreensão ampla e diversa dos processos e discursos formativos de nossa visão historiográfica, abrindo novos caminhos dentro daquilo que se considera arquitetura, e possivelmente iluminando novos campos para o arquiteto ?tanto o projetista quanto o pesquisador.


Ruth Verde Zein
 Arquiteta, com mestrado (1999) e doutorado (2005) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pós-doutorado (2008) pela FAU-USP. Prêmio Capes 2006 de Teses. É professora e pesquisadora da Universidade Presbiteriana Mackenzie. É autora de, entre outros, Brasil: Arquiteturas após 1950 (com M. A. J. Bastos, Perspectiva, 2010), Sala São Paulo: A Arquitetura da Música (com A. R. Di Marco; Altermarket, 2007), Rosa Kliass: Desenhando Paisagens, Moldando uma Profissão (com R. Kliass, Senac, 2006) e O Lugar da Crítica: Ensaios Oportunos de Arquitetura (Ritter dos Reis/Proeditores, 2002).

Danilo Matoso Macedo
Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004), editor da revista mdc.


Colaboração editorial: Débora Andrade

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Danilo Matoso – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2011/02/25/sede-da-fundacao-habitacional-do-exercito-brasilia-df/ //28ers.com/2011/02/25/sede-da-fundacao-habitacional-do-exercito-brasilia-df/#comments Fri, 25 Feb 2011 05:22:51 +0000 //28ers.com/?p=4576 Continue lendo ]]>

Foto: Joana FrançaMGS + Associados

Danilo Matoso Macedo | Elcio Gomes da Silva | Fabiano José Arcadio Sobreira
 Newton Silveira Godoy | Filipe Berutti Monte Serrat | Daniel de Castro Lacerda

Em concurso, a FHE ?Fundação Habitacional do Exército ?escolheu esta proposta para a realização de sua sede, com aproximadamente 30 mil metros quadrados de área construída.

De modo coerente com os objetivos da instituição, o seu edifício-sede manifesta os princípios de robustez, facilidade de acesso e transparência. A implantação em poucos volumes puros estabelece uma relação de complementaridade com a paisagem adjacente e o Oratório do Soldado ?projeto de Milton Ramos ? ampliando a área de influência do conjunto.

Foto: Joana França

O edifício de escritórios é composto por dois blocos desnivelados entre si e separados por um átrio central. A iluminação difusa e ventilação natural climatizada deste último ambientam com qualidade e economia energética os espaços de trabalho. O paisagismo complementa o conjunto em relação mimética com o cerrado adjacente e em desenho referente à praça Duque de Caxias ?de Burle Marx ?próxima.

A tecnologia construtiva alia a tradição e simplicidade da estrutura em concreto armado à rapidez de montagem e qualidade de acabamentos industrializados, tais como componentes de cobertura, vedação, forro e piso.

1. imagem institucional e implantação

Foto: Leonardo Finotti

O edifício destinado a abrigar a Fundação Habitacional do Exército deveria ter imagem coerente com os objetivos da instituição. Deveria manifestar com clareza e concisão os princípios de:

. Robustez – coerente com a solidez econômico-financeira;

. Facilidade de acesso ?desejável ao bom acolhimento de associados da POUPEX e à demonstração da função assistencial da FHE;

. Transparência ?correspondente à abertura da instituição à cooperação com outras instituições públicas atuantes na concretização de investimentos imobiliários no país.

Estas diretrizes sugeriam naturalmente a implantação em poucos volumes de natureza monolítica, articulados de modo a compor uma relação unitária de complementaridade entre as paisagens bucólica e monumental, o entorno imediato e as novas edificações.

Além do cerrado natural existente nas imediações do terreno, é de suma importância a presença do Oratório do Soldado ?projeto de Milton Ramos ?a noroeste, a praça Duque de Caxias, Projeto de Burle Marx próximo, bem como a norte o estacionamento de mais de mil vagas, que seria, inclusive, utilizado pelos servidores e associados da Fundação.

Implantou-se assim toda a área de escritórios num único volume horizontal de 150m x 50m, alinhado à divisa sul do terreno ?de modo a configurar entre si e a via de acesso uma grande praça em relação de continuidade visual com o estacionamento e o cerrado. Além do bloco de escritórios, delimitam a área o volume do auditório – na porção leste – e o Oratório do Soldado – a noroeste.

A inclusão deste último na composição volumétrica do conjunto é manifesta definitivamente na planta circular do volume do auditório, estabelecendo um claro diálogo entre estes dois pólos edificados na paisagem (Fig. 01).

Uma ampla marquise liga o edifício principal à via de acesso, propiciando um desembarque coberto e fazendo as vezes de uma acolhedora varanda de entrada para o conjunto. As formas livres de sua borda encontram reflexo ainda no paisagismo da praça de entrada, delimitada a oeste apenas por uma lâmina d´água e um talude. O nível médio do greide da rua determinou a altura do acesso e do térreo, minimizando custos com terraplenagem.

A permeabilidade e transparência da marquise encontram continuidade no pilotis pouco ocupado e de uso aberto. Esta abertura é finalmente completada pelo grande átrio interno de 15m de largura, ocupado apenas pelos elementos de circulação vertical e iluminado por sheds ao alto. A articulação dos pavimentos em meio-nível acentua a continuidade e fluidez do conjunto.

2. setorização e funcionalidade

A setorização interna é coerente com a implantação e com o disposto no Programa Básico de Necessidades fornecido pela instituição nas bases do concurso. O Auditório e seu foyer podem ser acessados diretamente tanto pelo público interno quanto pelo externo. Também voltado ao público externo estão o atendimento aos associados da POUPEX, o Protocolo e a agência do Banco do Brasil, abertos com a devida proteção solar para o paisagismo da praça frontal. O balcão de recepção e controle de entrada serve também como bilheteria do Auditório e um espelho d’água complementa o controle de acesso sem representar uma barreira visual. A generosa marquise de entrada, de desenho integrado à fluidez do paisagismo, serve como foyer externo complementar para todo o prédio. O acesso é encaminhado de modo direto e claro por um plano de divisão que recebeu um painel artístico de Mirella Marino ?dentro da tradição moderna brasileira e em consonância com os demais edifícios institucionais da cidade.

Transposto o controle de entrada, o pilotis abre-se num amplo vão livre de aproximadamente 860m² e alto pé-direito, que abriga a área de mesas da cantina, o espaço de estar para os funcionários, um salão de múltiplas atividades ?que pode ser articulado em diversos layouts com divisórias baixas removíveis (Fig. 02).

Foto: Joana França

Este grande vão está plenamente integrado aos demais espaços internos do edifício por meio de um amplo átrio que percorre toda a longitude do edifício, cujo paisagismo do térreo ameniza todo o conjunto, melhorando a ambiência não apenas das áreas de entrada, mas sobretudo dos espaços de trabalho.

De modo a manter a leitura de permeabilidade visual e de flexibilidade de usos do térreo, todo espaço fechado ali implantado foi disposto em formas livres desencontradas da estrutura. O mesmo ocorre com as áreas da administrativas implantadas sob o bloco sul, de fechamento em vidro, recuado do perímetro da edificação e abrindo–se também para o átrio interno ?onde estão situados os núcleos de circulação vertical (Fig. 03).

Os pavimentos superiores foram setorizados de acordo com o estabelecido no Programa Básico de Necessidades, com a adição, no bloco norte que conforma o átrio, de um nível intermediário entre o segundo e o terceiro pavimentos. Esta localização em meios-níveis facilita a integração entre os três andares, mantendo a relação hierárquica da instituição, com os postos de maior hierarquia nos pavimentos mais altos (Fig. 04):

Cada um destes pavimentos ?incluindo o bloco sul do térreo ?foi dotado de uma área de apoio e serviços composta por Sala de Reunião, copa, sanitários e compartimentos técnicos. A cobertura do bloco norte abriga os reservatórios superiores d’água e os chillers do sistema de condicionamento de ar.

O Auditório foi implantado em volume separado, com flexibilidade de acesso e situando-se ao lado da rampa de entrada do subsolo ?alinhada com a divisa leste do terreno. Esta implantação permite o acesso de caminhões a uma doca no subsolo com pé-direito duplo, de modo a facilitar a descarga de cenários e equipamentos de espetáculos que venham a ocorrer no auditório. A prolongação desta mesma doca atente a carga/descarga do almoxarifado adjacente. Como o desnível do Auditório situa o palco no subsolo, e foram também aí localizados seus camarins, depósito e apoio.

Foto: Leonardo Finotti

O Programa Básico de Necessidades definia ampla área destinada a abrigar atividades de uso prolongado no subsolo ?Almoxarifado, Arquivo de Processos, Alojamento da Segurança, Refeitório e Vestiário dos Funcionários de limpeza. De modo a preservar a salubridade destes ambientes, o subsolo foi segmentado em duas áreas distintas, separadas por um depósito, sob os blocos sul e norte. Assim, enquanto as 70 vagas situam-se sob o bloco sul, as demais áreas situam-se sob o bloco norte.

O paisagismo da praça frontal foi articulado em formas livres, refletindo aquele existente na vizinha Praça Duque de Caxias, com vegetação de pequeno porte típica do cerrado. Ele estabelece a desejada continuidade com a paisagem circundante ao mesmo tempo em que delimita claramente a área da FHE. Embora similar em desenho de planta, firmando uma necessária unidade e integração do conjunto, a vegetação ganha porte e exuberância dentro do átrio central do edifício, ambientando todos os pavimentos.

3. conforto e energia

A implantação norte e sul das fachadas de iluminação do prédio permite o controle da radiação solar sobre as áreas de trabalho. A fachada sul, aberta em pano de vidro, descortina a paisagem do Eixo Monumental para as áreas de trabalho, com brises verticais em peças metálicas protegendo-as da insolação direta de Verão. Estes brises foram dimensionados segundo o ângulo horizontal máximo de 23º, o que resulta numa placa vertical de mascaramento de aproximadamente 50cm para o vão de 1,25m das esquadrias. A partir deste módulo máximo, outros submódulos foram criados de modo a evitar a monotonia da fachada, identificando o edifício à distância pelos veículos que passam em velocidade. Os brises foram apoiados no topo de uma passarela de concreto, que permite o acesso de limpeza e manutenção mantendo o efeito de tela do conjunto dos brises deslocados do pano de vidro. É o mesmo efeito de tela o proposto para a fachada norte, sobre cujo pano de vidro foi instalada uma placa em alumínio composto anodizado bronze, estruturado sobre uma treliça metálica.

Foto: Joana França

O efeito tela consiste na criação de um colchão de ar circulante pela convecção gerada com o aquecimento do invólucro externo exposto ao sol. Pela baixa pressão que gera, esta corrente permite a exaustão natural dos pavimentos reduzindo o uso de condicionamento mecânico do ar na maior parte do ano. Com as janelas abertas, as faces externas agem como bombas de baixa pressão que produz, no verão, uma confortável circulação cruzada de ar pelas áreas de trabalho ?tomado do átrio central. A economia de energia elétrica propiciada pelo desligamento do sistema de condicionamento de ar é bastante significativa, dada a elevada potência destas máquinas. A iluminação natural difusa proporcionada pelos sheds do átrio central e pelas divisórias de vidro junto à circulação permite um bom grau de luminosidade das áreas de trabalho sem diminuição do índice de compacidade (perímetro/área) do edifício em seu conjunto. (Fig. 05)

Além do o sistema de ventilação natural acima proposto, a elevada inércia térmica do sistema de proteção solar da fachada propicia um isolamento, com janelas fechadas, que maximiza a performance de um sistema central de condicionamento de ar. No caso, foi adotado o sistema VRF (Fluxo de Refrigerante Variável) composto por condensadoras situadas no pavimento técnico de cobertura do bloco norte, o qual abastece fan-coils centrais com circulação de ar dutada em cada pavimento.

Foto: Leonardo Finotti

No Auditório, chillers também no pavimento técnico abastecem as casas de máquinas situadas sob a platéia, dutando-se o ar pela parede dupla de alvenaria e concreto do invólucro do volume cilíndrico.

Já o subsolo é refrigerado por sistema misto, no qual as partes centrais foram dotadas de sistema de ar condicionado e as demais áreas contam com exaustão final por grelhas de piso na face sul do térreo e no átrio central ?este último recebendo ar apenas das áreas de uso permanente, cuja baixa temperatura contribui para o resfriamento do conjunto.

Foto: Leonardo Finotti

3.2. Auditório

O auditório foi projetado segundo as diretrizes modernas de conforto visual e acústico.

O palco generoso ?que pode abrigar confortavelmente uma orquestra de até 70 músicos, por exemplo ?tem acesso de nível a docas de carga/descarga e depósito, interligado aos camarins dos artistas/palestrantes. A platéia abre-se segundo um confortável ângulo de 100º a partir da boca de cena, escalonando-se em degraus de altura variável em forma parabólica, permitindo bom desenvolvimento da propagação acústica aliada a uma correta visibilidade de cada espectador. As paredes laterais revestidas de finos painéis de madeira funcionam com caixas de ressonância, favorecendo a realização espetáculos de teatro, palestras e outros de voz humana sem amplificação. O forro em placas de alumínio ?as mesmas da fachada ?teve geometria estudada para propagar o som de modo equânime até o fundo da sala. As antecâmaras de entrada e as paredes duplas completam o tratamento acústico da sala, permitindo o isolamento máximo de ruídos externos.

4. qualidade e adequabilidade dos sistemas construtivos

O esqueleto do edifício foi construído com tecnologia local comum, com estrutura em concreto armado. As lajes dos pavimentos são nervuradas, executadas com fôrmas de fibra-de-vidro de 90cmx90cm e vigas-faixa coplanares com as nervuras. A altura final de 32,5cm permite um entreforro generoso de 55cm abaixo e piso elevado com 15cm livres acima, com bom isolamento acústico. com forro em fibra mineral modulado em sistema padronizado de 62,5cmX62,5cm, ao qual estão ajustadas as luminárias e grelhas de insuflamento de ar.

Todo o edifício foi modulado em 1,25m. Os vãos estruturais são de 6,25m X 10m, com balanços laterais de 2,5m, ajustadas aí as circulações dos pavimentos, em torno ao átrio central. (Fig. 06) A cobertura deste último em sheds metálicos é de pouco peso e teve execução rápida.

O sistema de pele de vidro fumê sobre esquadrias de alumínio anodizado preto provê a estanqueidade e segurança necessárias, recuando à sombra os volumes inferiores, em contraste com o fechamento de concreto aparente. A leveza dos brises e da placa norte reduz a sobrecarga da estrutura pois proporciona a já mencionada inércia térmica sem necessidade de concentração de massa nos vedos.

A decisões quanto aos materiais construtivos associam a simplicidade, solidez e tradição próprios da estrutura de concreto armado, com elementos e componentes altamente industrializados na construção dos demais elementos, o que permitiu uma obra limpa, com características de montagem industrial, e não de feitura artesanal, reduzindo consideravelmente o tempo mobilização financeira da obra. Como resultado, alcançou-se a imagem de durabilidade e solidez almejadas, construídas de modo simples e rápido.

Foto: Leonardo Finotti

[texto fornecido pelos autores do projeto]


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Área construída: 27.630 m²
Área do terreno:
15.000,00 m²
Data do projeto:
2005/2007
Data da construção:
2008/2009
Arquitetura: MGS – Macedo, Gomes & Sobreira + Associados
Autores:
Danilo Matoso Macedo, Elcio Gomes da Silva, Fabiano José Arcadio Sobreira, Newton Silveira Godoy, Filipe Berutti Monte Serrat, Daniel de Castro Lacerda
Colaboradores: Joana França, Carla Rabelo, Simone Fonseca, Hélvio Franco, Ana Valéria de Resende Silva, Igor Campos, Ailton Cabral
Fiscalização Gerência de Engenharia: Fundação Habitacional do Exército
Projeto de Paisagismo: Paula Farage e Vanessa Matos
Projeto de Cenotecnia: Cineplast – Sérgio Caliani
Projeto de Luminotecnia: Franco e Fortes Lighting Design – Gilberto Franco
Projeto de Estruturas: Engest Engenharia e Estrutura – Lucílio Antônio Vitorino
Projetos de Instalações Hidráulicas, Sanitárias, Elétricas e Eletrônicas: Cremasco Projetos de Instalações e Serviços Técnicos de Engenharia – Carlos Antônio Cremasco
Projetos de Ar Condicionado e Exaustão, Detecção, Combate a Incêndio: Air System – Ricardo Santos Dias Gibrail
Consultoria de Acústica: Conrado Silva de Marco
Painel Artístico: Mirella Marino
Programação Visual e Sinalização: Duo Arquitetura & Design – Carlos Eduardo Barros de Menezes, Sergio Moura Brasileiro do Valle, Tiago Rezende de Almeida Santos e Bruna Barbosa de Lima
Construção: PaulOOctávio
Fotos: Joana França e Leonardo Finotti
Website/contato: www.mgs.28ers.com

Colaboração editorial: Débora Andrade

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Danilo Matoso – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2009/10/24/praca-da-soberania-cronica-de-uma-polemica/ //28ers.com/2009/10/24/praca-da-soberania-cronica-de-uma-polemica/#comments Sat, 24 Oct 2009 04:43:09 +0000 //28ers.com/?p=3607 Continue lendo ]]> Sobre o projeto da Praça da Soberania, de Oscar Niemeyer.

Danilo Matoso Macedo

[1]

soberania-perspectivaEm 9 de janeiro de 2009, em seu escritório de Copacabana, Oscar Niemeyer apresentou o estudo preliminar do projeto para a Praça da Soberania, em Brasília, ao governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, e a seu Secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho. À semelhança de outros projetos recentes de Niemeyer, o projeto era marcado pela simplicidade de formas, materializadas em grandes superfícies brancas e aberturas fechadas por vidro preto. Próximo à Plataforma Rodoviária, uma praça cimentada no canteiro central da Esplanada dos Ministérios correspondia ao estacionamento subterrâneo abaixo, destinado a abrigar três mil veículos. Sobre o concreto, um edifício curvo elevado em pilotis ?o Memorial dos Presidentes, encomenda do presidente Lula ?contraposto por um obelisco inclinado ?o Monumento ao Cinqüentenário ?de altura comparável aos noventa e dois metros das torres do Congresso Nacional mais adiante.

Antes mesmo de qualquer consulta aos arquitetos que trabalham no GDF, ou de qualquer estimativa de preço da obra, o governador declarou aos presentes: Vamos fazer! No dia seguinte, a reunião foi relatada na capa do Correio Braziliense, [2] com a manchete: Para se espantar e curtir. Imediatamente, os arquitetos brasilienses se espantaram e voltaram a curtir a dor de feridas antigas e novas, todas ainda abertas. O espanto ficou por conta do obelisco de mais de cem metros de altura e do edifício curvo, numa área originalmente destinada ao vazio ?disposição presente desde o Plano Piloto, e expressamente assim mantida quando do tombamento da cidade pela Unesco em 1987. Já as penas curtidas tinham um duplo viés.

soberania-perspectiva-2De um lado, a iconoclastia tradicional de arquitetos inconformados com as feições recentes das obras de Niemeyer. Para estes colegas ?e também para alguns apreciadores das obras complexas, multicoloridas e multiformes das obras anteriores a Brasília, como a Pampulha ?a simplicidade recente parece simplismo apenas. E o que os admiradores da nova produção de Niemeyer ainda consideram síntese, os críticos já consideram descuido.

De outro lado, o descontentamento geral da comunidade de arquitetos projetistas brasilienses devido à realização de mais uma grande obra pública, com contratação de projetos por escritórios privados, sem a realização de concurso de arquitetura. A lista recente não é pequena, e o privilégio da contratação sem concurso não é exclusivo de Oscar Niemeyer: desde a encomenda do projeto urbanístico para o bairro Setor Noroeste,[3] bem como para o Parque Burle-Marx[4] e a via interbairros, passando pela nova Estação Rodoviária,[5] pela sede do Governo do Distrito Federal na Cidade Satélite de Taguatinga,[6] pela reforma do Estádio Bezerrão, no Gama,[7] e culminando no projeto para o Estádio Mané Garrincha,[8] em Brasília, com vistas à Copa do Mundo de Futebol. O monopólio de Niemeyer, de fato, se restringe à Esplanada dos Ministérios e adjacências. É sabido que, eticamente, o arquiteto evitou a contratação particular para a elaboração dos projetos arquitetônicos iniciais quando da construção da capital. Num gesto nobre, Oscar preferiu ser contratado como funcionário da Novacap, recebendo apenas seu salário à época.[9]

soberania-plantaO mesmo não ocorreu quando do retorno do arquiteto do exílio na década de 1970. Sobretudo após o tombamento da cidade, o escritório de Niemeyer passou a ser diretamente contratado para toda e qualquer grande obra pública do Governo Federal, pelo sistema de notória especialização. É um tipo de prática que ocorre em maior ou menor escala em diversas cidades brasileiras, com notórios especialistas locais, nacionais e, mais recentemente, internacionais. No caso do escritório de Niemeyer, o privilégio foi reforçado e garantido por uma portaria do IPHAN, estabelecendo que excepcionalmente, e como disposição naturalmente temporária, serão permitidas, quando aprovadas pelas instâncias legalmente competentes, as propostas para novas edificações encaminhadas pelos autores de Brasília ?arquitetos Lucio Costa e Oscar Niemeyer ?com complementações necessárias ao Plano Piloto original.[10]

Para se espantar e curtirO projeto da Praça da Soberania, entretanto, parece ter dado impulso a algum tipo de questionamento destes processos. O Governo do Distrito Federal contratou Oscar Niemeyer para realizar o projeto sem licitação e sem concurso público. O governador aprovou a proposta publicamente, levando a imprensa a uma reunião de trabalho com o arquiteto, em lugar de cercar-se de seus técnicos, e antes mesmo de submeter o projeto ao IPHAN. E a proposta era no coração da cidade, num local importante para a população e sabidamente non-aedificandi. E causou a todos espanto, como queria seu autor.

A partir da matéria no Correio Braziliense, manifestações de repúdio começaram a circular por telefonemas e e-mails exaltados entre arquitetos ainda durante o final-de-semana. Na segunda-feira, dia 12 de janeiro, foi publicado na revista mdc um texto de Sylvia Ficher ?Oscar Niemeyer e Brasília : criador versus criatura.[11] Tratava-se de um pequeno desabafo passional da historiadora e professora da UnB, que tocava em diversos pontos nevrálgicos do debate em torno às obras recentes de Niemeyer desde o Panteão da Pátria (1985), passando por um sumário juízo negativo de valor sobre a praça para concentrar seu fogo no ataque ao monopólio de Oscar Niemeyer em Brasília. O texto circulou em diversas rodas por e-mail na internet, tendo sido novamente publicado na Revista da Semana da Editora Abril, no Portal Vitruvius[12] ?o mais popular site de arquitetura do país ? no portal da Universidade de Brasília e em diversos blogs. Em que pese o extenso passado de rigorosas pesquisas de Sylvia Ficher, tratava-se aqui de um artigo de opinião, e não um arrazoado científico. O tom pessoal do artigo causou indignação aos admiradores e colaboradores mais próximos de Oscar Niemeyer. Por outro lado, fosse o texto uma extensa e embasada argumentação técnica, não teria tido o alcance e a popularidade que teve.

No domingo seguinte, dia 18 de janeiro, o jornalista Elio Gaspari dedicou sua coluna na Folha de S.Paulo[13] a uma associação entre a condenação de Sylvia Ficher à Praça da Soberania e a sua própria condenação a um texto que Niemeyer publicara naquele mesmo jornal reabilitando historicamente a figura de Joseph Stálin.[14] Com a repercussão do ataque de Sylvia à obra de Niemeyer, o desabafo local da pesquisadora começou a ganhar contornos de polêmica nacional.

No dia 20 de janeiro, o pesquisador e professor da UnB Frederico Holanda enviou à revista mdc um curto artigo também pessoal ?A praça do espanto,[15] condenando diretamente o projeto para a Praça da Soberania e associando sua aridez à já existente no adjacente Complexo Cultural da República ?última grande obra de Niemeyer inaugurada na Capital. A publicação do texto de Holanda na revista mdc foi acompanhada por outro texto do jovem arquiteto e pesquisador Carlos Henrique Magalhães[16] intitulado Pela soberania do vazio.[17] Argumentação mais arrazoada que as anteriores, o texto de Carlos evocava a obra pregressa de Oscar Niemeyer e os princípios norteadores do Plano Piloto de Brasília como base para defender a preservação do vazio acima do gramado da Esplanada ?onde Niemeyer pretendia implantar o obelisco e o Memorial dos Presidentes. Ao mesmo tempo, Conceição Freitas publicava em sua coluna no Correio Braziliense o texto Niemeyer versus Niemeyer.[18] A jornalista reforçava os argumentos de Sylvia e recuperava ?a partir de um comentário na revista mdc[19] ?um texto de Nicolai Ouroussoff,[20] escrito em 2007, em que do crítico de arquitetura do New York Times questionava a pertinência da contratação de Niemeyer para reforma e ampliação de suas próprias obras construídas há mais de cinquenta anos.

No dia seguinte, Sylvia Ficher voltava a se manifestar no texto Verso e reverso em Niemeyer,[21] agora acompanhada do arquiteto Jorge Guilherme Francisconi, ambos membros do Conselho de Planejamento Territorial do DF ?Conplan. O artigo, publicado no Correio Braziliense, manifestava que aquele órgão colegiado vinha sendo obrigado a aprovar a execução de projetos de Niemeyer em áreas de impacto, por força dos precedentes estabelecidos e do já mencionado artigo personalista da Portaria 314 do IPHAN. E o Conplan, unanimemente constrangido, enviara ao IPHAN um questionamento sobre a legitimidade do dispositivo legal. Era uma denúncia explícita de uma espécie de venda do direito de construir, que seria operada pelo escritório do arquiteto em Brasília.

A nova praça para BrasíliaSurpreendentemente, foi o próprio Oscar Niemeyer que se encarregou de elaborar sua primeira defesa, com artigo de sua lavra publicado na quinta-feira, dia 22 de janeiro, no Correio Braziliense. No texto, intitulado simplesmente A nova praça para Brasília,[22] Oscar Niemeyer justificava sua proposta com base nas grandes reformas urbanas de Paris e Barcelona ocorridas no século XIX, argumentando que mesmo os centros históricos precisam ser alterados. E se Brasília precisava ser modificada, ele possuía o direito e a obrigação de conceber e propor a praça. O texto ainda revelava oposição ao projeto de ninguém menos que a filha de Lucio Costa ?a também urbanista Maria Elisa Costa ? por ocupar o vazio da Esplanada dos Ministérios. Por fim, o arquiteto desqualificava seus críticos, ao tratá-los por pessoas até então desconhecidas que se permitiam falar sobre o assunto.

O tom confrontativo ?ainda que contraditório ?do texto de Niemeyer visava a anular os argumentos seus novos críticos arquitetos, mas acabou por reavivar antigos questionamentos da corporação às suas obras, despertando ainda o antagonismo em especialistas e pesquisadores de outras áreas. A pecha de desconhecidos gerou reações raivosas de moradores da cidade, que passaram a reivindicar em blogs e cartas aos jornais ?muitas vezes de modo deselegante ?o direito dos desconhecidos a opinar sobre o local em que habitam. Com efeito, no dia seguinte, o presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil ?IAB-DF ?enviava uma Mensagem ao arquiteto Oscar Niemeyer[23] cujo tom reverente e introdução elogiosa não impediram a conclusão solicitando o estudo de nova localização para o monumento.

Em 24 de janeiro, o Correio Braziliense estampou, na mesma página, a carta do IAB e a segunda defesa do projeto da praça,[24] desta vez feita pelo arquiteto Glauco Campello ?antigo colaborador de Niemeyer, pioneiro da construção de Brasília e ex-presidente do IPHAN. Prudente, Glauco se limitava a uma apologia dos valores plásticos e simbólicos da Praça da Soberania e suas edificações em si, sem mencionar a relação com o entorno urbano ou o processo de contratação do arquiteto. Até então, o Correio Braziliense vinha dando voz ao debate de maneira esparsa. No dia seguinte o jornal iniciaria uma verdadeira campanha em torno do tema, envolvendo definitivamente no debate a população da Capital Federal.

Praça na Esplanada inflama BrasíliaCom a manchete Praça na esplanada inflama Brasília,[25] a polêmica em torno ao projeto foi capa do Correio em sua edição de domingo. Três páginas de matérias, conduzidas por Conceição Freitas, deixavam de lado definitivamente as questões envolvidas em torno à contratação de Oscar Niemeyer e colocavam foco na relação entre a praça e a cidade Patrimônio da Humanidade. As reportagens faziam um apanhado da polêmica,[26] um histórico das obras de Niemeyer em Brasília (sessenta e seis ao todo)[27] e colhiam declarações de outros dois professores da UnB: Cláudio Queiroz e Frederico Flósculo.[28] Enquanto um ?ex-colaborador de Oscar Niemeyer na Argélia ?assumia a defesa do projeto em todos os sentidos, o outro limitava-se a expressar certa perplexidade em relação ao gesto que ele classifica de contraditório em relação à propostas originais da cidade.

Também era publicada na íntegra a carta de Maria Elisa Costa mencionada por Niemeyer, manifestando, antes de ser apresentado o projeto,[29] sua opinião contrária à localização da praça na Esplanada. Tratava-se de um documento pessoal, em que ela expunha suas preocupações quanto às edificações: o obelisco poderia competir com as torres do Congresso Nacional, e o Memorial dos Presidentes poderia obstruir a visão da rodoviária. A urbanista sugeria ainda ao amigo a alteração da proposta, com o atendimento ao programa do Memorial subsolo e a localização do obelisco no trecho oeste do Eixo Monumental, fora da Esplanada dos Ministérios.

A guinada do debate para o campo exclusivo do patrimônio histórico e artístico parecia, em princípio, favorecer Oscar Niemeyer. Afinal, o tema da contratação por notória especialização e o monopólio de projetos monumentais caia para segundo plano, e era a própria portaria do IPHAN de regulamentação do tombamento que garantia a exclusividade do arquiteto. Sintomaticamente, dentro no campo do patrimônio, a discussão ganhava contornos personalistas. Tratava-se agora de um projeto de Niemeyer oposto ao projeto de Lucio Costa ?como a filha deste encaminha apreensiva. E neste ponto fica exposto o tombamento de Brasília como a preservação de uma idéia[30] exclusiva dos dois arquitetos, e não de um construto social concreto ?obra coletiva. Aqui, entretanto, a relação entre a produção de Oscar Niemeyer em Brasília e os órgãos de preservação do patrimônio ganharia contornos diferentes. De fato, na reportagem de Conceição Freitas, o superintendente do IPHAN em Brasília, Alfredo Gastal, e a representante da Unesco, Jurema Machado, manifestavam-se contrários ao projeto de Niemeyer argumentando conflito deste com os valores tombados.

A declaração dos representantes dos órgãos máximos de preservação do patrimônio no Brasil e no mundo alavanca, no dia seguinte, o início de uma investigação do Ministério Público sobre a legalidade do projeto da praça ?sob o ponto de vista do tombamento, e não da contratação do projeto sem licitação ou concurso.[31] O caráter aparentemente oficial da oposição desses órgãos ao projeto leva à repercussão do caso na imprensa nacional como um problema administrativo. Quando, em 27 de janeiro, a Folha de São Paulo publica sua primeira matéria jornalística sobre o tema, o faz opondo exclusivamente Oscar Niemeyer a Alfredo Gastal.[32] Mais uma vez uma discussão que se iniciara como um levante público a um ato do governo local ganha contornos personalistas. A posição de Gastal, em todo caso, apoia-se na mesma portaria 314 do IPHAN, que estabelece: nos terrenos do canteiro central verde são vedadas quaisquer edificações acima do nível do solo existente, garantindo a plena visibilidade ao conjunto monumental.[33]

O enfoque incompleto da Folha foi reproduzido em diversos jornais no país inteiro, incluindo O Globo ?fenômeno passível de aferição pela grafia errada (Gaspal) que a matéria do jornal paulista trazia, e que foi reproduzida nas reportagens em outros veículos. Cabe lembrar, em todo caso, que não se tratava de uma disputa administrativa, mas política. Todas as autoridades em questão haviam se manifestado exclusivamente à imprensa, e não oficialmente. Não havia sido iniciado qualquer projeto de aprovação e nenhuma equipe de técnicos havia sido convocada para emitir parecer arrazoado. E como não existia processo de aprovação do projeto ou ato administrativo motivador, não poderia haver ilegalidade. A discussão entre as autoridades e arquitetos era pautada pelos jornalistas, e não pelos fatos.

Gastal e LeléSe para o restante do Brasil a imprensa pintava o retrato de um querela burocrática, em Brasília, a campanha do Correio ganhava cada vez mais apelo político e popular. O jornal passou a cobrir diariamente o debate, abrindo uma enquete online sobre o projeto, que se manteve sempre com cerca de 75% de reprovação pelos internautas ?chegando a mais de quatro mil votos. Pode-se dizer, inclusive, que foi a fome de matérias do Correio ?em pleno marasmo de janeiro ?que deu novo impulso à discussão. O jornal passou a contatar sistematicamente Oscar Niemeyer, bem como todos os especialistas e autoridades relacionadas ao patrimônio histórico em Brasília, cobrando manifestações e respostas de todos. Pressionado, o arquiteto recorreria ao auxílio de seus ex-colaboradores e amigos, como foi o caso de Cláudio Queiroz e Glauco Campello, e como seria o caso, em seguida, de João Filgueiras Lima ?o Lelé ?e de Ítalo Campofiorito.

Lelé publicaria sua defesa na terça-feira seguinte. Seu texto se chamava Mais uma obra prima,[34] e também refletia cautela por parte do autor ao evitar uma análise da praça e sua relação com a cidade. Lelé se limitava a resumir o currículo profissional de Oscar Niemeyer e as características reconhecidas de sua arquitetura. Ao cerne da questão o arquiteto dedica poucas palavras: ?em>Vemos no projeto dessa praça uma composição ousada e singela de beleza indiscutível, em que predomina seu monumento central triangular ancorado no solo e com sua aresta superior levemente curva, que lhe confere uma surpreendente elegância e leveza.?/p>

A reação de Lelé dava voz a um grupo numeroso de arquitetos próximos a Niemeyer a quem o caráter passional e pouco argumentativo de textos como o de Sylvia Ficher e Frederico Holanda havia soado simplesmente como falta de respeito ao mestre, que tanto já fizera pela arquitetura brasileira. Agravavam esta impressão negativa os inúmeros comentários de leitores – a maioria desqualificações sumárias ?feitos abaixo dos textos em sites de notícias. Não fosse o histórico cinquentenario[35] de Oscar Niemeyer de desqualificação sistemática de qualquer crítico de sua obra, poder-se ia imaginar que também era esta a impressão causada a ele mesmo, e que motivara o adjetivo de desconhecidos aos opositores do projeto.

Os defensores de Oscar aparentemente não haviam tomado conhecimento de artigos como os de Carlos Henrique Magalhães e de Andrey Schlee. Este último, arquiteto, historiador e diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília ?FAU-UnB, publicaria seu primeiro texto sobre o tema ?De obeliscos e espetos ?na revista mdc no dia 28 de janeiro.[36] Talvez pressentindo que poderia ser enquadrado como desconhecido, o experiente pesquisador e admirador confesso de Oscar Niemeyer precedia sua argumentação propriamente dita por um breve histórico e uma genealogia dos obeliscos na arquitetura universal e na obra do arquiteto. O arrazoado, como o de Magalhães, relembrava os princípios fundamentais do urbanismo da cidade, que nortearam sua construção e motivaram seu tombamento. Para Schlee, definitivamente não poderia ser adotado o argumento de complementação para áreas expressamente non-aedificandi do Plano Piloto tombado.

Coincidentemente, o também diretor da UnB ?do Instituto de Ciências Sociais, Gustavo Lins Ribeiro, se manifestou por escrito no Correio Braziliense no mesmo dia, no ponderado e imparcial texto Cavalos de Tróia,[37] em que igualmente reforçava os valores originais do Plano Piloto e da Esplanada, a serem preservados.

Niemeyer na trincheiraEsta edição do Correio, por outro lado, parecia dar a entender que Niemeyer não apenas se sentia pessoalmente agredido, como também protegido pelas muralhas de sua história, de sua competência e sobretudo de seus amigos, mas não necessariamente com as armas da razão: Niemeyer na trincheira: “não abro mão?/em>,[38] estampava a capa do jornal em letras garrafais. O arquiteto afirmava: Eu me sinto muito apoiado pelos meus amigos, de modo que vou continuar. Estou numa trincheira e não abro mão. Sou um arquiteto, com um trabalho feito.[39] Realmente, na mesma reportagem, assinada pelo jornalista Raphael Veleda, Cláudio Queiroz vinha mais uma vez em defesa do projeto, agora articulando um discurso sobre a obra propriamente dita. Para Queiroz, a inclinação do obelisco seria suficiente para torná-lo menor que o Congresso Nacional quando visto a partir da Plataforma Rodoviária. Seria um truque arquitetônico, um toque só alcançado por gênios como o Oscar.

Ironicamente, é nesta matéria que um dos amigos de Niemeyer se manifesta contra o projeto da praça. A crítica vinha do arquiteto Carlos Magalhães,[40] representante oficial de Niemeyer em Brasília e, juntamente com Fernando Andrade, um dos responsáveis pelo seu escritório local. Magalhães, talvez justificadamente desejoso de que a polêmica tivesse fim, disparava: O Oscar é muito grande para se submeter a essa bobagem. Ele tem que compreender que Brasília não é mais dele e está se defendendo sozinha. O desenrolar dos fatos nos dias seguintes demonstraria que a apreensão de Magalhães procedia.

A esta altura do debate, os diversos envolvidos já davam entrevistas a emissoras de rádio e televisão, reforçando seus pontos de vista. Enquanto a professora Sylvia Ficher insistia no telenoticiário local que as obras públicas deveriam ser realizadas por meio de concurso público, Cláudio Queiroz seguia tentando explicar o truque arquitetônico de Oscar. Entretanto, o foco do debate havia sido definitivamente deslocado para a questão do patrimônio histórico e artístico, e a próxima rodada se concentraria no detalhamento deste tema. Os tradicionais defensores e detratores do projeto de Brasília eram unânimes em concordar que a praça não estava de acordo com os princípios fundadores da cidade, conforme tombada pela Unesco em 1987, a divergência passaria a ser agora acerca da propriedade ou não da alteração por um de seus supostos autores.

A campanha do Correio prosseguia, e no dia seguinte o assunto novamente seria manchete: Debate sobre praça chega ao Planalto.[41] Segundo o jornal, o governador levaria o assunto ao presidente Luís Inácio Lula da Silva, em reunião entre os dois agendada para o dia 6 de fevereiro ?duas semanas em seguida. A discussão político-ideológica esteve sempre margeando o debate sobre a Praça da Soberania. Não apenas o fato político em si de uma obra de vulto como esta junto ao centro de decisões do país, mas também o engajamento político do comunista Niemeyer e sua relação pessoal com dirigentes de ideologia diversa. De fato, conhecedor do capital simbólico de seu afeto, Niemeyer sempre retribuiu com amizade a generosidade dos gestores em convidá-lo a projetar ?pelo menos em entrevistas a jornais. Assim, não apenas Juscelino Kubitschek foi seu amigo, mas também o foram o governador de São Paulo, Orestes Quércia ?que lhe encomendou o Memorial da América Latina ? e o governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz ?responsável pela encomenda do Setor Cultural Sul. Agora o governador José Roberto Arruda e o Secretário de Cultura Silvestre Gorgulho eram tratados por amigos nas entrevistas ao Correio. O amigo Arruda entretanto parecia não retribuir a confiança do arquiteto, deixando-o sozinho no debate sobre a Praça.

Questionado sobre a aprovação instantânea do projeto de Niemeyer no escritório de Copacabana, José Roberto Arruda já declarara em entrevista à Secretaria de Comunicação da UnB, na segunda-feira,[42] que o GDF não dispunha de previsão orçamentária para a execução do projeto da Praça da Soberania. Agora desejava compartilhar o ônus político pela obra grandiosa com o presidente Lula ?que, segundo Niemeyer, havia encomendado o Memorial dos Presidentes. No dia seguinte, entretanto, o Palácio do Planalto negaria a presença do assunto na pauta da reunião.

Outro aspecto de fundo político dizia respeito à ideologia do próprio arquiteto, considerado figura histórica do PCB. Niemeyer é de uma geração antiga do Partidão de defesa do comunismo do sentido lato, cujos valores hoje talvez soem ingênuos. Para alguns dessa geração, a construção de monumentos públicos de acesso livre à população é um ato de socialização da construção civil, é a construção de edifícios para o povo.[43]

Talvez esta lente seja a única pela qual seja possível compreender não apenas os argumentos vindouros de Niemeyer para justificar a Praça da Soberania, mas também a posição de outros defensores de mesma estirpe, como Frank Svensson, que assim comentou o texto de Sylvia Ficher na revista mdc: Para mim a preocupação de fundo de Oscar Niemeyer, arquiteto engajado politicamente, é de como afirmar arquitetonicamente a atualíssima questão da soberania nacional! Para quem não desposa desse engajamento é compreensivel que os valores e critérios de julgamento sejam outros.[44] Esta afirmação de Soberania, entretanto, manifestada logo após a já mencionada publicação de um texto indulgente a Joseph Stálin, não foi vista com bons olhos não apenas por arquitetos, mas pela população em geral e por jornalistas como Elio Gaspari.

Para estas pessoas, especialmente sensibilizadas pela força do chavismo na América Latina, a Praça da Soberania era mais uma expressão de totalitarismo ?acusação frequentemente feita à Esplanada dos Ministérios e à Praça dos Três Poderes ?que um espaço para o povo. Com esse cenário político de fundo compreendem-se os motivos da grande abrangência de uma polêmica, em princípio, arquitetônica: tratava-se tanto de um ato de revolta contra as arbitrariedades do governo populista local, quanto um ato de repúdio político à recente defesa de Stálin feita pelo arquiteto.

Se nesse dia o viés político da reportagem do Correio parecia desviar o debate para este campo, na mesma página constava um artigo de outro ex-colaborador de Oscar Niemeyer que também frequentara as esferas do patrimônio brasiliense. Nada menos que o redator do decreto de tombamento do Plano Piloto: Ítalo Campofiorito.

Num breve texto intitulado Quando o novo não desfigura o moderno,[45] Ítalo fazia uma repreensão às autoridades do patrimônio que haviam se manifestado a respeito do assunto, argumentando que somente a decisão do Conselho Consultivo do IPHAN ?órgão máximo do Instituto ?poderia constituir parecer definitivo do mesmo sobre o assunto. Ítalo, entretanto, não se furtava a apresentar um argumento de autoridade no texto ?sintonizando-se assim com as demais argumentações em favor da Praça. O arquiteto explicava que na legislação de preservação de Brasília se vedam construções no “canteiro central verde? na intenção óbvia de evitar futuras edificações espúrias que prejudicassem a integridade visual e artística da Sede do Congresso. Posso testemunhar da intenção, já que a redação em pauta copia a do decreto, que é de minha lavra.

Houvesse sido concluída neste ponto, a polêmica em torno à Praça da Soberania talvez não houvesse afetado a visão que os brasilienses e arquitetos guardavam de Oscar Niemeyer e de seus projetos. O arquiteto se notabiliza há tempos tanto pelo hábito de interferir em espaços cívicos com ousadia quanto pelo absoluto descaso pela preservação de sua própria obra. Ele ainda é Oscar Niemeyer: o mais fecundo inventor de formas de nossa arquitetura, o inesgotável improvisador de soluções, o ‘playboy?endiabrado[46] com uma experiência profissional inigualável no mundo. Levar o tema da Praça para a discussão nas altas esferas de órgãos de preservação possivelmente implicaria em sua aprovação ?se nela se empenhasse o arquiteto tão influente no IPHAN. E com o tempo a população certamente se acostumaria à nova leitura que a Praça da Soberania ofereceria da Esplanada.

A campanha do Correio Braziliense, entretanto, demandava novas manchetes e mais combustível para a polêmica. No dia seguinte, a manchete do jornal estampava uma frase de Niemeyer: “A briga está boa?/em>.[47] O texto publicado nesta edição de 30 de janeiro seria o primeiro de uma série de declarações do arquiteto que refletiam ou uma profunda desarticulação de idéias ou uma intenção clara de alteração no modo de se pensar o patrimônio arquitetônico e urbanístico de Brasília.

A briga está boaO título ?Uma explicação necessária[48]– dá a entender que se trata do tradicional texto arrazoado homônimo que acompanhava os projetos de arquitetos da geração de Niemeyer. O arquiteto pouco explica de seu projeto, no entanto. Primeiramente, deixa claro que se trata de uma encomenda do Correio, que insiste para que ele escreva alguma coisa sobre essa celeuma que está ocupando este jornal. Logo, Niemeyer evoca as defesas que solicitara a Ítalo Campofiorito, Lelé e Glauco Campello, e estabelece um diálogo socrático ?recurso caro ao arquiteto desde a década de 1970 ?como se um amigo lhe pedisse para comentar o Plano Piloto, dividido entre pobres e ricos. Os primeiros em seus apartamentos confortáveis ligados às escolas, ao comércio local, como convém; os outros, mais de três milhões de brasileiros, esquecidos pelas cidades-satélites sem escolas, postos de saúdes e as áreas de recreio indispensáveis.

Era o discurso do comunista que voltava à tona. À primeira vista, a colocação parecia fora de lugar ?afinal, Oscar não deixara claro em que a Praça da Soberania contribuiria para a redução das desigualdades. A já mencionada visão popular que Niemeyer tem da construção de monumentos, entretanto, torna coerente o discurso. Em seguida, Oscar se lançava ao auto-elogio ao falar da importância e visibilidade que suas obras têm no exterior. Por fim, Niemeyer afirma ter sugerido ao amigo Silvestre Gorgulho a criação de uma comissão de arquitetos da melhor categoria que se incumbisse dos problemas da arquitetura e do urbanismo desta cidade, encaminhando as soluções que lhes pareçam mais justas e necessárias.

Neste momento, o arquiteto parecia não tomar conhecimento da existência do já mencionado Conplan, órgão encarregado de tratar das questões urbanísticas do Distrito Federal. Embora Sylvia Ficher e Jorge Guilherme Fancisconi dele fizessem parte, era público e notório que se tratava de um colegiado formado majoritariamente de membros do governo, e por representantes da sociedade civil indicados pelo próprio governador, que submetiam suas decisões ao Secretário de Desenvolvimento Urbano e Meio-Ambiente, a quem cabia acatá-las ou não. Niemeyer parecia ignorar também a sugestão de seu amigo Ítalo Campofiorito, de tratar da querela no Conselho Consultivo do IPHAN. A sugestão de Niemeyer desqualificava não apenas a competência de seus críticos, mas também os órgãos que poderiam jogar a seu favor.

A mesma página do jornal trazia uma reportagem introduzindo o tema e mencionando cautelosas declarações do ex-presidente do IAB-DF Otto Ribas, para quem o problema não seria a construção da praça, mas do obelisco. Trazia ainda um curto texto do Instituto Histórico e Geográfico do DF ?assinado por ninguém menos que o ex-diretor da Novacap, Ernesto Silva. Juntamente a Affonso Heliodoro Santos, o pioneiro ressaltava a contrariedade da proposta de Niemeyer ao Plano Piloto original tombado, motivo pelo qual o IHG-DF era contrário a sua execução.[49]

No dia seguinte, sábado, o ritmo frenético do Correio parecia haver esgotado a produção recente de novas manifestações qualificadas sobre a questão da Praça da Soberania. Mas isso não significava o abandono do tema. Ao contrário, a jornalista Graça Ramos oportunamente usou-o para trazer à tona uma antiga proposta do paisagista Roberto Burle-Marx para a Esplanada.[50] No projeto, em lugar do gramado constava uma espécie de parque, com lagos, pontes e árvores. Embora se tratasse de proposta evidentemente descabida no contexto atual, Graça Ramos aproveitava o ensejo para relembrar que no ano de 2009 seria celebrado o centenário do paisagista, e que diversos eventos e publicações marcariam a efeméride. A edição do jornal trazia ainda trechos de uma entrevista com Maria Elisa Costa,[51] que reforçava os pontos de vista expressados na carta a Oscar, anteriormente publicada. Para a urbanista, o monumento poderia ser implantado em outro lugar, e não na Esplanada. A partir do diagnóstico social de Niemeyer no artigo anterior, ela sugeria Taguatinga ?centro demográfico do Distrito Federal ?como local apropriado.

No dia seguinte, Niemeyer publicaria seu terceiro texto sobre a Praça, intitulado pelo jornal de Contraste incômodo.[52] Nele, o arquiteto refutava a possibilidade de realizar o monumento ou a praça em outros lugares e insistia, evocando até mesmo a memória de Juscelino Kubitschek, que a demanda e a decisão de construir eram do governador. Com esta manobra, Niemeyer transferia para Arruda o ônus político e o bônus popular da realização do projeto e da obra. Reforçava ainda o pedido de criação de uma comissão de notáveis para avaliação do desenvolvimento urbano da cidade, com a qual ele daria por bem-sucedida esta luta. Mas Arruda já se havia entrincheirado ele mesmo na evasiva da questão orçamentária, deixando o arquiteto sozinho.[53]

O Correio começaria então a dar mostras de incapacidade de gerar matérias sobre o tema no mesmo ritmo que antes. Numa pequena reportagem,[54] a jornalista Nahima Maciel extraia de Cláudio Queiroz a declaração talvez mais jocosa de todo o debate, ao sugerir que fosse, de fato, criada a comissão sugerida por Niemeyer, e que seus integrantes fossem Glauco Campello, Ítalo Campofiorito e Lelé. Na mesma página, o advogado Reginaldo de Castro apresentava argumentos jurídicos para demonstrar,[55] citando como norma um texto de Glauco Campello, a viabilidade legal da execução da Praça da Soberania, conforme proposta por Niemeyer.

Tombamento de Brasília é uma besteiraO elemento de choque desta segunda-feira, 2 de fevereiro, entretanto, não estaria no Correio, mas novamente na Folha de S.Paulo. O jornal paulista trazia uma entrevista exclusiva com Oscar Niemeyer, realizada no domingo por Denise Menchen.[56] O título atribuía a Niemeyer uma frase não encontrada na entrevista:?em>Tombamento de Brasília é uma besteira.?O arquiteto colocaria em desfile vários dos temas e máximas recorrentes em seus textos ao longo de mais de setenta anos de carreira, mas sem conseguir concatená-los com a coerência de costume. E iniciaria seu discurso ?antes de qualquer pergunta do jornalista ?criticando a desigualdade social de Brasília, segundo seu entendimento refletida na exclusão dos pobres do Plano Piloto. Entretanto, quando perguntado sobre a relação da Praça da Soberania com a solução do problema da desigualdade, o arquiteto diria que a ela era indispensável, por faltar a Brasília uma praça importante, como em todas as cidades do mundo existe. Ao ser questionado sobre a alteração no Plano Piloto representada pela obra, o arquiteto afirmava que ali é o lugar certo, não está perturbando nada. Em dois momentos, Niemeyer se justifica pela sua própria importância e pela importância de seus defensores (Italo, Glauco, Lelé, Jayme Zettel). Se a defesa com evasivas e argumentos de autoridade decepcionava, os ataques do arquiteto na entrevista surpreenderiam. Inicialmente, Niemeyer atacava o tombamento da cidade (o mesmo tombamento que lhe garantia a contratação por notória especialização): uma cidade não pode ser tombada porque sempre aparecem modificações. Em seguida, atacaria a Plataforma Rodoviária, projeto de Lucio Costa constante já Plano Piloto original, que articula o cruzamento entre os Eixos Monumental e Rodoviário: a rodoviária não é um prédio importante. O que caracteriza Brasília são os palácios. É desnecessário assinalar que o ataque de Niemeyer à cidade e ao seu tombamento não contariam a seu favor perante a opinião pública. Mais que isso, afirmar que a cidade mais monumental do país carece de uma praça monumental soava no mínimo curioso. Afinal, apenas no Eixo Monumental, há a Praça do Buriti, a praça da Torre de Televisão, as praças elevadas da própria Plataforma Rodoviárias e, evidentemente, a Praça dos Três Poderes. Além disso, Brasília possui praças gigantescas projetadas por Burle-Marx praticamente em desuso, como a Praça de Portugal ?junto ao Setor de Embaixadas ?e a Praça Duque de Caxias ?no Setor Militar Urbano. A entrevista havia, ao fim e ao cabo, encurralado o arquiteto contra seus próprios argumentos.

Enquanto isso, no mesmo dia, o arquiteto e ex-professor da FAU-UnB, Ricardo Farret, publicava na revista mdc o pequeno texto Espaço público e imaginário social,[57] em que comentava o surpreendente desenrolar público do debate, relembrava polêmicas análogas que ele mesmo tivera a oportunidade de travar com Oscar Niemeyer (quando da reforma da Catedral Metropolitana de Brasília), e sobretudo apontava para o fato de que o Governo do Distrito Federal está se especializando em apresentar propostas urbanísticas por meio da imprensa, sem que se saiba as suas razões e grau de prioridades. Estão aí o Plano Lerner, a retomada do Projeto Orla, para citar só dois exemplos. A oportuna lembrança de Farret trazia à tona um dos problemas mais prementes na preservação do Plano Piloto de Brasília: a ausência de um Plano Diretor ou de um Plano de Preservação claro.[58]

As respostas à entrevista de Niemeyer começaram a vir à tona no dia 4 de fevereiro. A revista mdc publicou em sua seção Ensaio e Pesquisa o texto de Andrey Schlee A praça do ‘maquis?/a>.[59] Tratava-se de um trabalho escrito um ano e meio antes para apresentação em um seminário em que o pesquisador apresentava a Praça dos Três Poderes em seu desenho original de Lucio Costa ?como platô construído frente à paisagem natural do cerrado ? bem como as origens deste desenho em fortificações e praças coloniais implantadas à beira do mar. Em seguida, demonstrava como as sucessivas adições de edifícios como o Panteão da Pátria, o anexo do STF e a Procuradoria-Geral da República vinham liquidando com o cerrado e descaracterizando a praça. A publicação do texto pela revista era claramente uma resposta à afirmativa de que a cidade necessitava de uma nova praça. Schlee publicou simultaneamente um novo texto de opinião, intitulado Não se preocupe em entender,[60] retornando a uma interpretação da Praça da Soberania e do Complexo Cultural da República como expressões de uma arquitetura concebida com nada de detalhes, nada de filigranas por razões puramente plásticas, artísticas. O pesquisador partia de um paralelo com as imagens dos quadros de De Chirico para evidenciar a aridez das plataformas de concreto carentes de paisagismo em Brasília, onde as coisas estão dispensadas de lógica funcional e situadas no mágico sossego de seu isolamento.

Niemeyer desiste da praça na EsplanadaAs refinadas críticas de Andrey Schlee infelizmente ficariam apenas como registro histórico. O debate propriamente dito havia sido concluído na edição do Correio Braziliense daquele mesmo dia, com a manchete ?sobre uma foto do arquiteto ?ocupando toda a primeira página do jornal: Niemeyer desiste da praça na esplanada.[61] A capitulação foi publicada dentro de uma reportagem de Nahima Maciel,[62] com o pequeno texto de Niemeyer intitulado Decisão.[63] Nele, o arquiteto reafirmava seus argumentos em favor do projeto e relembrava a solidariedade de seus amigos, como Lelé. Em que pesasse a segurança em suas propostas Niemeyer lera nos jornais que o governador José Roberto Arruda, por falta de verba e de tempo, reconhecia ser agora impossível realizar a construção da praça que tanto desejava. Daí a desistência do debate. Em todo caso, o projeto continuaria a ser desenvolvido normalmente, na esperança, quem sabe, de um dia a sua realização tornar a ser cogitada. Entretanto, as declarações do governador não eram fato novo. Tudo leva a crer que a desistência certamente ocorrera em função da repercussão negativa da entrevista na Folha. Além disso, era um alívio para Niemeyer poder voltar a seus afazeres cotidianos.

Nos dias que se seguiram, muitos dos que vinham debatendo compartilharam do alívio com o fim do debate, elogiando no Correio a decisão do arquiteto. No dia 5 o jornal fez um apanhado de declarações dos envolvidos na querela.[64] No dia seguinte, Maria Elisa Costa ainda reforçaria uma defesa talvez preparada na segunda-feira, afirmando que a Esplanada já tem sua praça: a plataforma Rodoviária.[65] Um toque final de humor ainda foi acrescentado com a divulgação,[66] no sábado 7 de fevereiro, de que o carnavalesco Joãosinho Trinta havia proposto a Niemeyer a realização de um carro alegórico da Praça da Soberania, a ser colocado em evolução da Escola de Samba Beija-Flor em 2010. No carro, todos os ex-presidentes ainda vivos seriam convidados a desfilar como destaques.

No domingo, dia 8 de fevereiro, foram ainda publicados no caderno de cultura do jornal Estado de São Paulo um texto de Hugo Segawa ?provavelmente escrito antes do fim da polêmica ?intitulado Por um olhar desimpedido,[67] acompanhado por uma entrevista do diplomata André Corrêa do Lago. O historiador Segawa fazia uma retrospectiva histórica da Esplanada e da Plataforma Rodoviária, retomando seus valores fundamentais, expressados na legislação vigente do patrimônio, concluindo que se a Praça da Soberania viesse a soerguer-se no local originalmente planejado, o viajante não mais vislumbraria o eixo monumental. Veria a fachada envidraçada do Memorial dos Presidentes. A entrevista do diplomata Corrêa do Lago,[68] permeada pelo mesmo espírito encomiástico que vinha dominando as matérias realizadas após a decisão de Niemeyer, continha uma sentença premonitória: os gênios jamais jogam a toalha.

Salvo manifestações esporádicas já fora do calor da disputa, pouco se falaria da Praça da Soberania nos meses seguintes. A pedido dos editores da revista mdc, Cláudio Queiroz escreveria um arrazoado sobre a praça, intitulado Praça da Soberania – assertivas,[69] explicando suas declarações feitas em entrevistas durante o debate. Para Queiroz, o projeto era um gesto finalístico destinado a promover a restauração da própria Esplanada e de suas principais visuais, em que a própria verticalidade das torres do Congresso estariam intimidadas, em presença das principais edificações dos setores bancários e hoteleiros. O obelisco cumpriria ainda a função de restaurar, por contraste arquitetônico a volumetria do centro cívico face a linearidade elegante da Rodoviária restabelecendo a totalidade urbana, anteriormente marcante, pela ligação virtual com a Torre de TV, cuja expressão, valor e significado diluíram-se, após a evolução conclusiva dos setores hoteleiros e bancário.

Mas Niemeyer voltara a seus afazeres: realizava novos projetos, acompanhava as obras em andamento ?sobretudo as de Niterói ?e organizara mais um livro com uma coletânea de seus trabalhos recentes, a ser lançado na galeria de sua filha, Ana Maria, no final de maio. Um pouco antes do lançamento, o arquiteto gentilmente convidou os professores e estudantes da UnB para realizar uma visita às obras de Niterói, onde ele daria uma palestra sobre seu trabalho. O convite, feito por João Filgueiras Lima, foi aceito pelos acadêmicos, que no dia 29 de maio eram recebidos por Niemeyer no Caminho que leva o seu nome na cidade fluminense.

Soberania-Perspectiva-1No final da palestra, Niemeyer apresentou seu projeto para a Praça da Soberania, na verdade nada menos que uma nova proposta, também era publicada na edição do Correio Braziliense daquele dia com a manchete Niemeyer muda Praça da Soberania.[70] No projeto, o obelisco, com a mesma forma mas com cinquenta metros a menos, ficava deslocado do eixo da Esplanada. O Memorial do Cinquentenário e o Memorial dos Presidentes eram deslocados para as laterais do canteiro central dois blocos longitudinais ?um curvo, com uma marquise, e outro reto, elevado sobre pilotis. Na mesma semana ainda havia sido lançado o quarto número da revista Nosso Caminho, que Niemeyer e sua esposa vinham editando desde 2008, em que o arquiteto publicava a nova versão do projeto.

Soberania-Perspectiva-2

No dia seguinte, o Correio Braziliense publicava uma matéria de uma página sobre a visita do grupo da UnB ao Rio no dia da apresentação do projeto.[71] Uma foto, de autoria do Secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho, mostrava os estudantes e professores em volta do arquiteto, e o texto jornalístico de Diego Amorim e Gizella Rodrigues ?com títulos como A praça não interfere no Plano Piloto e Espaço a ser completado ?dava a entender que havia consenso sobre o a nova proposta. Aos olhos da opinião pública, o projeto teria obtido a aprovação de alguns de seus maiores críticos: os professores da UnB. Era uma verdadeira ação coordenada de Niemeyer para apresentar e aprovar publicamente seu projeto quatro meses após o fim da polêmica inicial.

A praça não interfere no Plano PilotoO texto explicativo que acompanhava o projeto não foi publicado no jornal, embora estivesse exposto na galeria de Ana Maria Niemeyer no Rio de Janeiro. Seu título, não menos afirmativo, era: Uma modificação irrecusável. Nele, o arquiteto explicava como havia alterado o projeto em função das críticas recebidas, conforme ele mesmo dava a entender em sua entrevista no Correio: Encontrei uma forma de conduzir melhor o trabalho. Coincidentemente, alguns pontos correspondem à questão de visibilidade que eles (arquitetos que criticaram o projeto) tanto defenderam.Tudo indicava que o debate seria reacendido, caso o próprio governador José Roberto Arruda não houvesse colocado uma pá de cal no assunto. No dia 31 de maio, domingo, na capa do Correio constava a nota: governador diz que, por falta de recursos, obra não será construída na sua gestão.[72]

Não obstante, dez dias depois o presidente do IAB-BA, Paulo Ormindo Azevedo ?referência nacional na área de patrimônio histórico ?publicaria na revista mdc o texto intitulado Niemeyer não dorme nos louros…[73] Para Azevedo, a reação crítica à proposta de Niemeyer fora movida em grande parte por uma dissimulada “oscar-jeriza?/em>. O arquiteto fazia coro com Cláudio Queiroz, classificando a obra de um complemento e uma correção, e traçando um paralelo entre o obelisco do cinqüentenário e o monumento a George Washington, no mall da capital norte-americana. Azevedo desloca ainda o problema da área do patrimônio histórico, afirmando que, se nas décadas de 1940 a 1960 tivéssemos a burocracia preservacionista que temos hoje no plano federal e estadual, não seria construída a Pampulha.

Na semana seguinte, também na revista mdc, o arquiteto e pesquisador da FAU-UnB, Eduardo Rossetti, publicaria na revista mdc o último texto especializado de que temos notícia sobre o assunto, intitulado Oscar Niemeyer além da crônica de uma praça anunciada.[74] Rossetti parte de um breve histórico sobre a polêmica da praça, para concluir que, ao fazer uma nova proposta, o arquiteto simplesmente fizera questão de dar a última palavra sobre o assunto. A partir da praça, era feita então uma avaliação panorâmica da produção recente de Niemeyer, com programas cada vez maiores e mais complexos e soluções mais simples, em que Niemeyer assinala a permanência de suas estratégias projetuais, especulando, depurando, reforçando e ampliando o seu reconhecido repertório formal. Para Rossetti, entretanto, a ênfase na questão formal era um reducionismo em si mesma, concluindo que em meio às decisões excludentes e às subordinações que regem o ato de projetar ?ou seja, elaborar a invenção arquitetônica ?a forma continua a ser a questão fundamental que Oscar Niemeyer propõe e deixa a todo o campo, para além da crônica de uma praça anunciada, efetivamente.

Os demais polemistas entretanto pareciam ter acompanhado a declaração de Sylvia Ficher sobre o assunto: Não faz mais sentido eu ficar dando opinião, dizendo se o projeto é bom ou ruim, se melhorou ou piorou. Quem tem que decidir se vai ou não fazer é o Iphan e o GDF.[75] De fato, o debate aparentemente retornou para as esferas da arquitetura e da Administração Pública. Até o presente momento, em todo caso, não se tem notícia de qualquer encaminhamento do projeto para avaliação pelos órgãos de patrimônio.

A rigor, o debate sobre a Praça da Soberania evidenciou o longo caminho a ser percorrido pelo campo arquitetônico brasileiro até que se possa realizar um debate público efetivo sobre seus valores. O primeiro problema foi a dificuldade em definir o que deveria ser discutido. A questão das contratações de projetos de obras públicas sem licitação ou concurso ?o cerne da crítica inicial de Sylvia Ficher ?parece continuar sendo um tabu no campo da arquitetura.

Um segundo problema aparente é a incompreensão generalizada em nosso meio sobre os processos de contratação da Administração Pública, e frequentemente em debates sobre o tema os argumentos passam pelo viés do juízo de valor pessoal sobre a qualidade da obra do arquiteto ou dos arquitetos em questão. O personalismo, os privilégios e idolatrias herdados dos oligopólios coloniais parecem persistir entre nós mesmo no trato da coisa pública. E mesmo ao discutir valores que, até por uma questão de autonomia de campo, deveriam ser tratados de maneira sistemática, arrazoada e demorada, os arquitetos e gestores públicos preferem arriscar-se a declarar publicamente suas opiniões particulares imediatas sobre temas em que deveriam se manifestar como técnicos e como administradores do espaço público ?mais que como políticos.

Em todo caso, é através da prática saudável do debate público, como o que teve início na Praça da Soberania ?e não das negociatas a portas fechadas ?que se pavimenta o caminho necessário para a construção de um campo arquitetônico mais republicano e de arquitetos mais envolvidos com sua própria cidadania que com questões endógenas. Esperamos todos que este tenha sido apenas o início de uma série de discussões que podem passar a ter lugar a cada grande obra pública. Os meios de comunicação estão abertos para isso e a população está desejosa de discutir a construção de suas cidades. Resta saber da disposição dos arquitetos para o debate.


notas

[1] Texto apresentado em setembro de 2009 no 8º Seminário Docomomo Brasil, na mesa Brasília: cidade real, cidade tombada, objetivando realizar uma síntese da polêmica, dando a conhecer ao público nacional o seu desenrolar local.

[2] Miranda, “Novo marco na esplanada.?e Macedo, “Brasília: Oscar Niemeyer projeta nova praça na Esplanada dos Ministérios.?/p>

[3] Mader, “Novo bairro aproveita lições do laboratório – Entrevista: Paulo Zimbres.?/p>

[4] Mader, “Presente verde.?/p>

[5] Toscano, “Começa em 15 dias obra da nova rodoviária.?e Reis, “Terminal Rodoviário de Brasília.?/p>

[6] Campos, “Complexo substituirá o Buritinga em 2009.?/p>

[7] Naves, “Sinal Verde.?/p>

[8] Correio Braziliense, “A capital do futebol.?/p>

[9] Niemeyer, As curvas do tempo, 111.

[10] IPHAN, Portaria n.314, de 08 de outubro de 1992 (Art.8º, §3º)

[11] Ficher, “Oscar Niemeyer e Brasília : criador versus criatura.?/p>

[12] Ficher, “Oscar Niemeyer e Brasília : criador versus criatura.?/p>

[13] Gaspari, “A praça da soberania de Niemeyer.?/p>

[14] Niemeyer, “Quando a verdade se impõe.?/p>

[15] Holanda, “A praça do espanto.?/p>

[16] Magalhães acabara de concluir um mestrado sobre a obra de um dos colaboradores de Niemeyer: o arquiteto Milton Ramos.

[17] Magalhães, “Pela soberania do vazio.?/p>

[18] Freitas, “Niemeyer versus Niemeyer.?/p>

[19] Cf. //28ers.com/2009/01/12/oscar-niemeyer-e-brasilia-criador-versus-criatura/#comment-56

[20] Ouroussoff, “Even if his own work isn’t broken, a brazilian architect fixes it.?/p>

[21] Francisconi e Ficher, “Verso e reverso em Niemeyer.?/p>

[22] Niemeyer, “A nova praça para Brasília.?/p>

[23] Campos, “Mensagem ao arquiteto Oscar Niemeyer.?/p>

[24] Campello, “Praça da Soberania.?e Campello, “A Praça de Niemeyer em Brasília.?/p>

[25] Correio Braziliense, “Praça na Esplanada inflama Brasília.?/p>

[26] Freitas, “Soberana Brasília.?/p>

[27] Freitas, “Niemeyer, 101 anos, 66 obras.?/p>

[28] Freitas, “Concepções divergentes.?/p>

[29] Costa, “Carta de Maria Elisa Costa a Oscar Niemeyer.?/p>

[30] Para desenvolvimento deste tema, Cf. Pessoa, “Brasília e o tombamento de uma idéia.?/p>

[31] Macedo, “Projeto da Praça da Soberania será investigado pelo Ministério Público.?/p>

[32] Carvalho, “Projeto de praça de Niemeyer para Brasília é ilegal, diz Iphan.?/p>

[33] IPHAN, Portaria n.314, de 08 de outubro de 1992 (art.3º, V)

[34] Lima, “Mais uma obra-prima.?/p>

[35] Cf. Niemeyer, “Criticada a arquitetura brasileira : fala Oscar.?/p>

[36] Schlee, “De obeliscos e espetos ou ‘Para se espantar e curtir’.?/p>

[37] Ribeiro, “Cavalos de Tróia.?/p>

[38] Correio Braziliense, “Niemeyer na trincheira.?/p>

[39] Veleda, “Niemeyer assume a defesa do seu projeto.?/p>

[40] Não se confunda Carlos Magalhães, colaborador de Niemeyer desde a década de 1950 com Carlos Henrique Magalhães, o jovem pesquisador a escrever Pela soberania do vazio.

[41] Correio Braziliense, “Debate sobre praça chega ao Planalto.?e Veleda, “Arruda quer opinião de Lula sobre a praça.?/p>

[42] Notícia apagada dos arquivos do website.

[43] Para um desenvolvimento desse tema, veja-se a seção Teoria em: Pereira, Arquitetura, texto e contexto, 148-153

[44] Cf. //28ers.com/2009/01/12/oscar-niemeyer-e-brasilia-criador-versus-criatura/#comment-158

[45] Campofiorito, “Quando o novo não desfigura o moderno.?/p>

[46] Expressão do crítico de arte Mario Pedrosa em: Pedrosa, “O depoimento de Oscar Niemeyer – II,?294

[47] Correio Braziliense, “A briga está boa.?/p>

[48] Niemeyer, “Uma explicação necessária.?/p>

[49] Tecles, “Niemeyer contra-ataca.?/p>

[50] Ramos, “Um parque na Esplanada.?/p>

[51] Tecles, “Obelisco em Taguatinga.?/p>

[52] Niemeyer, “Contraste incômodo.?/p>

[53] Arruda, “A boa polêmica.?/p>

[54] Maciel, “Proposta de comissão divide os arquitetos.?/p>

[55] Castro, “Breves notas sobre a Praça da Soberania.?/p>

[56] Menchen e Niemeyer, “Oscar Niemeyer: tombamento de Brasília é uma besteira.?/p>

[57] Farret, “Espaço público e imaginário social « mdc . revista de arquitetura e urbanismo.?/p>

[58] Produto atualmente em elaboração por um escritório gaúcho de planejamento contratado por licitação de técnica e preço pelo GDF.

[59] Schlee, “A praça do maquis.?/p>

[60] Schlee, “Não se preocupe em entender.?/p>

[61] Correio Braziliense, “Niemeyer desiste da praça na Esplanada.?/p>

[62] Maciel, “Niemeyer abre mão da polêmica praça.?/p>

[63] Niemeyer, “Decisão.?/p>

[64] Sallum, “Elogios à decisão de Niemeyer.?/p>

[65] Freitas e Rebello, “A Esplanada já tem sua praça.?/p>

[66] Correio Braziliense, “E a praça de Niemeyer pode parar na Sapucaí….?e Macedo, “Esplanada em transe : Praça da Soberania será carro alegórico no carnaval de 2010.?/p>

[67] Segawa, “Por um olhar desimpedido.?/p>

[68] Greenhalg, Gama, e Lago, “Os gênios jamais jogam a toalha – Estadao.com.br.?/p>

[69] Queiroz, “A Praça da Soberania : assertivas.?/p>

[70] Correio Braziliense, “Niemeyer muda Praça da Soberania.?e Dubeux e Niemeyer, “Uma nova praça – entrevista.?e Macedo, “Oscar Niemeyer propõe segundo projeto para a Praça da Soberania.?/p>

[71] Rodrigues, “Praça muda, polêmica não.?e Amorim e Rodrigues, “A praça não interfere no Plano Piloto.?/p>

[72] Mader e Borges, “Praça de Niemeyer sai dos planos.?/p>

[73] Azevedo, “Niemeyer não dorme nos louros?« mdc . revista de arquitetura e urbanismo.?/p>

[74] Rossetti, “Oscar Niemeyer além da crônica de uma praça anunciada.?/p>

[75] Rodrigues, “Praça muda, polêmica não.?/p>


referências bibliográficas

Amorim, Diego, e Gizella Rodrigues. “A praça não interfere no Plano Piloto.?Correio Braziliense, Maio 30, 2009, seç. Cidades.

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Agradeço a Sylvia Ficher por haver gentilmente cedido seu levantamento bibliográfico sobre o debate sobre a Praça da Soberania: mais amplo que o aqui apresentado e para o qual serviu de base.


danilo matoso macedo
Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004), editor da revista mdc.

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NBR6492-DETALHESDanilo Matoso Macedo

A partir da próxima matéria, a seção Projetos e obras da revista mdc passará a disponibilizar arquivos com o Projeto Executivo ?ou Projeto de Execução ?completo. Entendemos que, com isso, amplia-se significativamente a relevância do material publicado. Ao acrescentar informação sobre as técnicas projetuais e construtivas adotadas na feitura da obra, procuramos trazer alguma contribuição ao delineamento de novos horizontes na crítica e de historiografia de nossa prática arquitetônica atual. Esperamos que uma nova crítica se forme e que nossa teoria se renove a partir da sistematização e da transmissão didática de um campo de conhecimento que até hoje tem sua cultura reproduzida quase que exclusivamente pela prática nos escritórios ?ao menos no Brasil. Esse medievalismo cultural da arquitetura talvez mereça aqui uma pequena digressão, necessária à explicitação de nossas intenções.

arquitetura é invenção ?de problemas?

Entablamento e capitel jônico, segundo o tratado de Vignola (1562)

Entablamento e capitel jônico, segundo o tratado de Vignola (1562)

Desde o surgimento, no século XV, do livro de arquitetura tal como o conhecemos hoje, nossa disciplina vem sendo transmitida majoritariamente por meio de textos, gravuras ou fotos naturalistas e desenhos técnicos simplificados de modo a caber nos formatos dos livros. Substituíam-se, e principalmente complementavam-se, com isso, os códices das corporações de ofício e as lições práticas por tratados de arquitetura concebidos e editados quase que à guisa de literatura. A cultura do livro impresso multiplicável foi componente ativo da revolução humanística da Idade Moderna no mundo ocidental. E as conseqüências da difusão arquitetônica completamente dissociada de qualquer contato direto com os edifícios, por assim dizer, prototípicos, levou em muitos casos à redução do escopo de nossa disciplina ao que pode ser transmitido por meio de livros e revistas: textos, imagens naturalistas e desenhos técnicos esquemáticos simplificados de escala reduzida. Os tratados da Renascença definem as “ordens?de arquitetura (colunas, capitéis, lintéis etc.) carentes de peso material. De que são feitos? Madeira, mármore, pedra, tijolo, estuque? Como são feitos? Por quem? Com que instrumentos? A que preço? Os livros não nos dizem. [1]

Com isso, a profissão e o profissional deslocavam-se do canteiro de obra dos artesãos para as côrtes dos nobres, dos intelectuais e sobretudo dos artistas. O desenho erudito desenvolvido junto à geometria descritiva acaba por se relacionar mais às especulações matemáticas e científicas do Iluminismo que à manufatura de edifícios e de seus componentes construtivos. Estes têm sua conformação ajustada à base de cinzéis, lixadeiras, desempenadeiras, sarrafos, gabaritos e outros instrumentos rudimentares para os quais as geometrias complexas advindas de equações espaciais fazem pouco sentido. Como nos lembra Alfonso Corona Martínez, os arquitetos do Renascimento inventaram uma competência profissional a partir dos meios de representação, ao dar importância maior aos problemas formais, de tal modo que estes somente poderiam ser resolvidos pelos arquitetos com o emprego de seu novo instrumental.[2]

As conseqüências e conflitos desse deslocamento da profissão até hoje se fazem sentir quando as soluções formais dos arquitetos deslocados do canteiro precisam ser construídas com integridade de modo a resistir às intempéries e à passagem do tempo. A cisão entre o canteiro e o desenho é problema antigo discutido repetida e exaustivamente a cada geração desde aqueles tempos. Entricheiram-se, de um lado, os arquitetos que vivem de textos, palestras e publicações em revistas, e de outro lado aqueles que vivem de produzir desenhos destinados à construção. Os argumentos de cada parte são repetitivos e talvez não valha a pena aqui mencioná-los senão em seus mais conhecidos pares dialéticos: teoria versus prática, “arquitetura do espetáculo?versus “arquitetura comum? artistas versus pedreiros, estrelas versus operários etc. Já lembramos recentemente[3] que, enquanto primeiro grupo goza de maior prestígio social, o segundo grupo projeta e constrói mais. Fosse a convivência entre estes grupos pacífica, e talvez nossas cidades houvessem sido construídas pelos arquitetos e urbanistas. A realidade, entretanto, é bastante distinta. Enquanto mestres de obras e técnicos em edificações efetivamente materializam nossas metrópoles ?que se expandem via de regra pelos bairros de classe média-baixa e baixa ?os arquitetos digladiam-se pela primazia da execução de poucos monumentos, edifícios públicos, moradias e escritórios das classes mais altas ?e vez por outra ou conjuntos habitacionais assistencialistas.

Essa inserção social e esse campo de atuação restritos descendem claramente daqueles construídos pelos arquitetos renascentistas ?e do que se convencionou chamar de arquitetura a partir de então, em oposição à mera construção[4]. Ocorre que, com a expansão das classes médias e a proliferação de arquitetos nesses extratos sociais intermediários, o número de profissionais excluídos é crescente. E mesmo os excluídos não se ocupam de tratar com competência dos seus problemas mais próximos: os edifícios das periferias (os responsáveis por mais de 70% da mancha urbana de nossas metrópoles). O motivo é muito simples: não foram preparados para fazê-lo. Aprenderam nas faculdades ?e lêem nas revistas e livros de arquitetura ?soluções para problemas que, ou não existem efetivamente, ou não lhes dizem respeito. Do mesmo modo, voltando aos dois grupos antagônicos, as estrelas costumam esbanjar uma despreocupação olímpica com a construção, uso e manutenção de seus edifícios, enquanto os técnicos pavoneiam-se ingenuamente de sua ignorância total sobre qualquer questão humanística que vá além do carisma de que usam para convencer seus clientes.

A história nos ensina que estes grupos não se reconciliarão. Preferimos, por isso, uma via alternativa, que teorize sobre os aspectos práticos e que cobre relevância social direta das problematizações teóricas. Se o arquiteto de escritório trata de desenhos técnicos e de técnicas construtivas, sobre eles também nos devemos debruçar em busca de constantes, princípios, valores e métodos passíveis de sistematização ?em busca da própria teoria ?e transmissão para as gerações futuras. Na mão inversa, se o arquiteto de revista trata de publicações, de livros, palestras e exposições, que elas digam respeito ao menos a soluções efetivas para os problemas de seu tempo, e não de frívolas questões endógenas.

a competência do arquiteto

Em nossa sociedade, arquitetos que projetam – e não possuem empreiteiras ?extraem seu sustento da entrega de desenhos. Mesmo que acompanhados por maquetes e textos, são os desenhos o cerne da documentação comercializada. Nesse sentido, o desenho é uma mercadoria como outra qualquer: possui seu valor intrínseco e seu valor como índice de uma obra que será construída. Mesmo que acompanhados pela carga simbólica conotada pela griffe do autor ?evidentemente parte do produto em questão ? são os desenhos que conectam criador e obra construída. Comprovam estes argumentos os croquis , os riscos originais que todos fazem questão de publicar junto aos projetos.

Existem definições claras sobre a natureza dos desenhos arquitetônicos. Segundo a Norma Brasileira, o projeto de arquitetura é elaborado nas seguintes etapas: levantamento de dados, programa de necessidades, estudo de viabilidade, estudo preliminar, anteprojeto (ou de pré-execução), projeto legal, projeto básico (opcional, voltado para órgãos públicos), e projeto para execução [ou Projeto Executivo] de arquitetura.[5] Este último é definido como etapa destinada à concepção e à representação final das informações técnicas da edificação e de seus elementos, instalações e componentes, completas, definitivas e necessárias à licitação (contratação) e à execução dos serviços de obra correspondentes.[6] A Tabela de Honorários do Instituto dos Arquitetos do Brasil[7] foi feita a partir dessas etapas. Enquanto se atribui um valor de 10% a 15% ao Estudo Preliminar, o Projeto Executivo corresponde a 50% da remuneração. Voltaremos a esta relação proporcional em seguida.

A responsabilidade do projetista sobre a obra construída é tanto maior quanto maior for a correspondência entre seus desenhos e a edificação concreta. Na prática atual, entretanto, esta constatação opõe-se ao senso comum corporativo corrente entre nós de que o arquiteto é dirigente da edificação. Assim o seria se sobre ela tivéssemos responsabilidade total ?o que não é o caso em nosso país. A obra construída é produto coletivo de todos os projetistas e de responsabilidade principalmente do construtor, e nesse grupo o arquiteto comumente assume apenas o peso do papel secundário que lhe cabe (vegetal, manteiga ou sulfite).

Indo mais além na argumentação, em nosso país não temos notícia de acionamento legal de algum arquiteto ou escritório de arquitetura devido a erros de projeto. Normalmente, a culpa por problemas em edificações recai sobre os empreiteiros e engenheiros projetistas, devido a problemas construtivos e a falhas nas instalações. No Brasil, o arquiteto ?o mesmo a encabeçar a ficha técnica em revistas, relegando aos demais os papeis de coadjuvantes ?não é responsabilizado por praticamente nada. Convido o leitor a vasculhar sua memória e a encontrar exemplos recentes de arquitetos considerados publicamente responsáveis por desabamentos, patologias estruturais e mesmo por acidentes de trabalho e enfermidades em moradores de seus edifícios. Verá que não se ouviu falar dos arquitetos. Os engenheiros em alguns casos foram presos ou execrados publicamente, porque deles efetivamente era a responsabilidade pelas decisões críticas.

Não nos enganemos atribuindo ao arquiteto contemporâneo uma competência que na prática não lhe cabe: o produto concreto imediato de seu trabalho são os desenhos, que são valorados por sua qualidade comunicativa e pelo que resulta dela ?a obra construída entendida em seu sentido meramente plástico. O desenvolvimento e detalhamento construtivo relevante de um projeto, para além das aparências portanto, implica em assumir mais responsabilidades. Ao assumir plenamente o encargo do projeto executivo, do detalhamento e da integração e compatibilização de projetos complementares, o arquiteto amplia consideravelmente o seu crédito efetivo pela obra construída ?e consequentemente seu campo potencial de atuação. Saber desenvolver e representar um projeto para execução deságua assim em mais competências profissionais.

Feita esta constatação, torna-se desconcertante o descaso do métier da arquitetura e engenharia brasileiras para com as convenções de desenhos. As normas são escassas[8], as disciplinas universitárias de desenho técnico são consideradas instrumentais (ou não finalísticas) e chega a ser um milagre que alguma comunicação efetivamente ocorra por meio de uma linguagem tão carente de gramática. Tanto nas engenharias quanto na arquitetura, a disciplina de desenho técnico foi reduzida a um reles semestre letivo, e o desenho técnico tem seu aprendizado nos estágios de escritório e marginalmente nas disciplinas de projeto.

As disciplinas de projeto e as demais disciplinas dos cursos universitários parecem tratar de tudo, menos do desenvolvimento de projetos nas sucessivas etapas necessárias à execução da obra. A prática dos escritórios de arquitetura é quase que integralmente composta pelo desenvolvimento de projetos de aprovação, de projetos executivos, de detalhamentos e de desenhos adicionais necessários à execução. Na verdade, vemos que a proporção valorativa sugerida pela Tabela de Honorários do IAB certamente sobrevalorizou as fases iniciais do projeto devido à carga simbólica da criação artística. A prática mostra que a relação estritamente quantitativa reduziria significativamente o valor daquelas. Um estudo preliminar desenvolvido em duas semanas tem seu desenvolvimento e obra arrastados por anos a fio, mas não se aprende sobre como lidar com isso nas universidades e pouco se discute sobre esta prática em nossas revistas e livros de teoria e história. Como observou John Summerson,

Ele [o arquiteto moderno], por diversos motivos, saiu de seu papel, deu uma olhada na cena ao seu redor e tornou-se obcecado não com a importância da arquitetura, mas com a relação da arquitetura com outras coisas. Isso é exatamente o que ocorreu.O arquiteto saiu de si mesmo, como se fosse uma segunda pessoa a sair da primeira num filme psicológico. Ele (prosseguindo momentaneamente com esta metáfora) deixou sua primeira personalidade na prancheta e assumiu a segunda (a personalidade ‘viva? numa volta ao mundo contemporâneo ?pesquisa científica, sociologia, psicologia, engenharia, as artes e diversas outras coisas.  Ao retornar à prancheta, sua primeira personalidade lhe parece constrangedora e extremamente desinteressante. Ali está ele desajeitadamente sentado, recendendo levemente a “estilos? Então a segunda personalidade senta-se ao lado dele e dolorosamente guia sua mão.[9]

Por bizarro que possa parecer, esta espécie de dupla personalidade do arquiteto não é exceção. Comprova isso o descompasso entre o que consta em nossa historiografia e o que de fato correspondeu à prática edilícia das sociedades ali descritas. Em alguns momentos, o ethos de uma personalidade invade os domínios da outra. É então que o arquiteto imbuído da cobrança social pela invenção ?no sentido lato ?torna-se incapaz de obedecer às mais simples convenções.[10]

o desenho arquitetônico, suas convenções e detalhes

Ocorre que, no Brasil, cada escritório de arquitetura inventa suas próprias convenções gráficas.  Aqueles encarregados de construir as obras devem aprender a ler o idioma de cada escritório, transformando-se em verdadeiros poliglotas iconográficos. De fato, se engenheiros civis, mestres-de-obras, serralheiros e marceneiros[11] acabam por aprender algo desse código na prática, o fazem de tanto sentirem no bolso as conseqüências de seus erros de interpretação. E se não aprendem a ler os desenhos, aprendem a conversar sobre eles minuciosamente com o arquiteto na obra.

Nessa babel, os arquitetos também padecem, já que dependem de engenheiros para desenvolver os projetos complementares. Os engenheiros ?sobretudo os ligados às instalações ?embora sejam bastante mais afeitos a seguir convenções de símbolos e metodologias de representação, tendem a tratar o desenho técnico mais como diagrama simbólico que como desenho figurativo. Dessa falta de compreensão das características físicas e dimensões da coisa tratada nascem os problemas de compatibilização ?cuja solução ou bem fica a cargo do arquiteto ou bem fica a cargo do empreiteiro ?onde tubos descem aparentes fachada abaixo, máquinas não cabem nos vãos destinados a elas, equipamentos ficam sem visita para manutenção etc.  A situação agravou-se ainda mais com o advento dos sistemas de CAD ?Computer Aided Design. No computador, a representação digital possui múltiplas possibilidades de elaboração, que resultam aparentemente num mesmo desenho impresso. O intercâmbio de arquivos entre engenheiros e arquitetos dentro desse universo infindável de variáveis é praticamente impossível sem uma padronização estrita do modo de trabalho. Evidentemente, a maior parte dos escritórios brasileiros de engenharia  e arquitetura ignora ou despreza olimpicamente os poucos padrões existentes.[12]

Mais uma vez, a origem dessas mazelas está na carência de conhecimento sistematizado sobre o tema em nosso país. Os arquitetos aprendem a desenhar estudos preliminares na faculdade e passam a vida folheando e estudando revistas e livros com plantas na escala de 1:500, e dali extraindo seus parâmetros de trabalho. Mesmo as revistas técnicas ?como a brasileira Techné, a alemã Detail ou a espanhola Tectónica ?limitam-se a exibir diretamente os detalhes da escala 1:1, passando ao largo das plantas, cortes e fachadas do projeto executivo, por uma simples impossibilidade material de publicar uma revista em formato A0. Estes desenhos gerais, os mais importantes de todo o projeto, onde todos os detalhes, eixos, especificações e dimensões estão indicados e mapeados, simplesmente não são publicados em tamanho legível. Enquanto isso, esquadrias e grampos de fixação de granito são reproduzidos ad nauseam.

À esquerda, detalhe do catálogo da Alcoa para pano de vidro. À direita, detalhe publicado no especial 'Detalles' da revista argentina Summa (dez.2004)

À esquerda, detalhe do catálogo da Alcoa para pano de vidro. À direita, detalhe publicado no especial 'Detalles' da revista argentina Summa (dez.2004)

Nesse ponto, o problema ganha nova complexidade, pois esbarramos no conflito entre a prática arquitetônica estrangeira e a brasileira. A representação do detalhe ampliado de vedação tem sua origem nas wall-sections norte-americanas ?desenhos autônomos que convencionalmente sintetizam o desempenho da vedação do edifício. São parte das convenções gráficas que os arquitetos são obrigados a dominar para obter seu diploma na maioria dos países europeus e nos Estados Unidos. Se nesses países as normas existem e são cumpridas, no Brasil as normas rareiam e são ignoradas. Lemos os desenhos nas revistas estrangeiras e copiamos os seus cacoetes e seus detalhes ?as wall-sections que não fazem sentido algum em alvenaria de tijolos ?/em>, no que muitas vezes se torna um tecnicismo inútil e um detalhismo perfeitamente dispensável. Um exemplo clássico desse tipo de prática corrente entre nós é a insistência que se tem em publicar os detalhes de caixilharia de alumínio, quando é sabido que as montagens desses perfis extrudados de grande complexidade é inteiramente determinada pelas linhas criadas pela indústria. Escolhido o modelo da esquadria, trata-se simplesmente de uma montagem de detalhes padronizados sobre os quais o arquiteto e o engenheiro têm pouca ou nenhuma influência.

A causa para este tipo de vício, mais uma vez, tem suas origens na própria afirmação da autonomia do campo arquitetônico. Como bem nos lembra Sérgio Ferro: a coisificação desta verborragia analítica não pedida só é explicável (…) pela urgência de iludir o próprio esvaziamento.[13] Além dos detalhes inúteis, incluem-se na crítica de Sérgio Ferro também os detalhamentos superabundantes. Nesse campo, de identificação mais dificultosa, incluem-se sobretudo os defensores da industrialização na construção ?que de tanto buscar novos padrões acabam simplesmente por inventar todo um novo sistema semi-industrial a cada projeto. Nesse vício incorrem muitos dos que são admirados pelo domínio da técnica construtiva: inventam detalhes complexos, supostamente indicativos de alta tecnologia, que serão de execução difícil, dispendiosa e de desempenho duvidoso. Um bom exemplo é o que Peter Blake chamou, há mais de trinta anos, de celebração da junta:

(…) em certos tipos de construção com painéis ou outros tipos de pré-fabricação, a junta entre as partes ?aquela infinitamente problemática e infinitamente multiplicada junta, a causa de vazamentos, empenamentos, corrosão, desbotamento, de muita confusão, preocupação e trabalho ?essa junta insignificante simplesmente não era recoberta e ocultada da melhor maneira possível; ela era intrincadamente articulada, interminavelmente expressada, voluptuosamente discutida pelos críticos e masoquisticamente celebrada. [14]

da prática à teoria do desenho

É desejável, portanto, que nos debrucemos mais detidamente sobre os desenhos e especificações que resultam nas obras construídas que admiramos, de modo a lhes conhecer os pormenores que tornaram possíveis a comunicação com os executores e sua feitura a contento. Se nosso produto de trabalho é o desenho, é natural e desejável que nos detenhamos com mais vagar na reflexão acerca do que nos consome mais tempo e esforço ?o Projeto Executivo e a obra ?que nos valores artísticos emanados dos Desenhos de Apresentação constantes nos estudos preliminares feitos em uma semana. É natural que desejemos desenvolver uma espécie de “Teoria do Projeto Executivo? ou “Teoria do Desenho?em>.

É nesta documentação, em sua clareza, em sua capacidade de comunicação e síntese de idéias, que está um dos fatores indicativos de um bom projeto de arquitetura ?e frequentemente de uma boa obra executada. Se a construção, por suas avantajadas dimensões, forçosamente é composta por vários elementos e componentes, é no modo como ordenamos esta composição e conciliamos as partes e materiais que está o cerne de nosso labor. É no desenvolvimento de cada parede, de cada janela, onde os valores fundadores do projeto são testados e reavaliados, e as partes questionam de volta o autor sobre a pertinência do todo. É nessa retórica do jogo construtivo que se determina a medida de coesão e integridade de uma obra, e consequentemente sua durabilidade ?preocupação premente em tempos de escassez de recursos não-renováveis.

Para ser levado à execução, um projeto passa por uma ampliação de escala, pela divisão do todo em partes sucessivamente menores, representadas em elevações, seções e perspectivas devidamente especificadas. Se este conjunto de desenhos é coeso em sua ordenação e homogêneo em sua representação, sua compreensão é enormemente facilitada. Ao representar plantas, cortes e fachadas do conjunto da edificação, o arquiteto escolhe os elementos e componentes cujo custo, complexidade ou importância para o conjunto requerem desenho ampliado. A partir dessa escolha inicial, o detalhamento é agrupado normalmente em sua ordem de execução e importância, em pequenos conjuntos autônomos que podem ser enviados a sub-empreiteiros. Esta aparente autonomia do detalhe exige um estrito controle do autor de modo a harmonizar os próprios elementos entre si, mantendo a unidade do conjunto e a coesão dos conceitos desenvolvidos.

Quando se desenvolve um projeto plenamente e se acompanha sua execução, cai por terra o mito do projeto ideal surgido platonicamente na cabeça do arquiteto a priori, do qual a matéria seria apenas um pálido reflexo. É ali, na lida com as coisas concretas, suas vontades, suas afinidades e limitações, que surgem as invenções duradouras.  Dentro desta visão, o conceito original do edifício, normalmente entendido como uma declaração inicial de intenções por seu autor, converte-se em objeto de diálogo com a realidade mediado pelo desenho, conforme nos explica Carlos A. Leite Brandão, para quem

nem o conceito é da pura ordem da subjetividade e da teoria, nem o projeto e a obra são da pura ordem da objetividade e da prática empírica. O conceito se faz na própria representação e na própria construção. E para o crítico interessa compreender os conceitos nessa fala do projeto, e não na idéia original do autor, a qual creio sempre permanecer inacessível, inclusive ao próprio autor. O conceito está na obra e no projeto, e não na subjetividade do arquiteto. Ele mora no desenho, na maquete ou na imagem virtual – e não no pensamento do autor ou no contexto sócio econômico – e é lá, em primeiro lugar, que ele deve ser perseguido pelo crítico ou intérprete. Essa representação, portanto, não é a mera perseguição de uma idéia que sempre insiste em fugir, mas um dos momentos em que o próprio conceito se formula[15]

O desenho de execução, portanto, vai além da apresentação de uma idéia. Ele é sua representação, e como tal estabelece uma relação dialética e dinâmica com ela.

A tecnologia digital rompeu a barreira imposta originalmente pelo meio do livro impresso. Hoje, pode-se publicar arquivos de pranchas inteiras de desenho no mesmo espaço em que antes se apresentava um texto e alguns diagramas. Com essa nova possibilidade, um novo campo de valoração da obra publicada vem à tona. É possível testemunhar o modo pelo qual o arquiteto comunicou-se com os executores, é possível aferir o grau de realização das intenções originais, é possível aprender com os erros e triunfos dos colegas, trazendo à tona um campo de conhecimento tão vital e tão esquecido pela cultura de nosso campo. Num momento futuro, talvez alguma tecnologia de CAD/CAM substitua o velho desenho técnico, mas esta é uma outra discussão…


notas

[1] Renaissance treatises define architectural “orders?(columns, capitals, lintels, etc.) that are singularly lacking in material weight. What are they made out of? Wood, marble, stone, brick, stucco? How are they made? By whom? With what instruments? At what price? The books don’t tell us. Carpo, Architecture in the Age of Printing, 7.

[2] Martínez, Ensaio sobre o projeto, 15.

[3] Macedo, “Deixar de pensar no estilo.?/p>

[4] A passagem de Sylvia Ficher explica a conotação desta expressão, tão recorrente na teoria da arquitetura: “Quando nós falamos em arquitetura clássica, somos nós que falamos em arquitetura clássica, que adjetivamos o termo arquitetura. Até meados do século XVIII, quando se dizia arquitetura ?obviamente estou me referindo ao contexto ocidental, europeu ?não era preciso adjetivar: arquitetura queria dizer arquitetura clássica, caso não fosse clássica, não era arquitetura. E não apenas quando se tratava de edifícios de exceção. Se uma edificação não é clássica, não é arquitetura: é uma construção. É por essa razão que ainda se fala uma bobagem dessas: ?strong>mera construção?#8230; […] O caso brasileiro é extremo. Ou seja, mais ainda do que nos Estados Unidos ou na Europa, aqui, naquele momento ?no nosso caso, da década de quarenta em diante ?Arquitetura é Arquitetura Moderna. Se não é Arquitetura Moderna, não é Arquitetura, tout court, não é entendida pelos arquitetos como Arquitetura: é construção […]?/em> in Ficher, “Reflexões sobre o pós-modernismo,?5.

[5] Associação Brasileira de Normas Técnicas, NBR 13532/1995, 3.

[6] Associação Brasileira de Normas Técnicas, NBR 13531/1995, 2.

[7] Instituto de Arquitetos do Brasil, Tabela de Honorários.

[8] Atualmente, a única norma da ABNT específica de desenho arquitetônico é a NBR 6492/1994 ?Representação de projetos de arquitetura.

[9] He has, for some reason or another, stepped out of his ‘rôle? taken a look at the scene around him and then become obsessed with the importance not of architectures, but of the relation of architecture to other things. This is exactly what happened. The architect has walked out of himself, rather like a second personality is seen to walk out of the first in a psycological film. He has (to pursue this metaphor for a moment), left the first personality at the drawing board and taken the second (the ‘live?personality) on a world-tour of contemporary life ?scientific research, sociology, psychology, engineering, the arts and a great manu other things. Returning to the drawing-board he finds the fist personality embarrassing and profoundly unattractive. There he stubbornly sits, smelling slightly of ‘the styles? So the second personality sits down beside him and painfully guides his hand. In Summerson, “The mischievous analogy,?197.

[10] A seguinte anedota ilustra bem o lamentável quadro de confusão mental de alguns de nossos colegas nesse sentido. Certa vez, participando de uma banca de um Trabalho Final de Graduação em arquitetura, advertimos que o aluno não havia dotado um edifício de seis pavimentos de escadas protegidas contra incêndio, em desacordo com as normas vigentes. Seu orientador saiu em sua defesa, afirmando: ?em>as regras estão aí para serem quebradas?

[11] Convém lembrar que, ao contrário dos engenheiros, a maioria ?senão a totalidade ?dos operários da construção civil carece de instrução formal no que concerne à elaboração e interpretação de desenhos técnicos, suas convenções e suas técnicas.

[12] Cf. Associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura – AsBEA. Diretrizes gerais para intercambialidade de projetos em CAD: integração entre projetistas, construtoras e clientes. Organizado por Henrique Cambiaghi, São Paulo: Pini, 2002.  199p.

[13] Ferro, “Arquitetura nova,?55.

[14] (…) in certain kinds of panelized or otherwise prefabricated buildings, the joint between parts ?that endlessly troublesome and endlessly multiplied joint, the source of leaks, of buckling, of corrosion, of discoloration, of much fuss and bother and expense ?this miserable joint was not merely not covered up and done away with as best as possible; it was intricately articulated, interminably expressed, volubly discussed by the critics, and masochistically celebrated. In Blake, Form Follows Fiasco, 61.

[15] Brandão, “Linguagem e arquitetura: o problema do conceito.?/p>


referências bibliográficas

Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 13531 : Elaboração de projetos de edificações – atividades técnicas. Rio de Janeiro, 1995.

——? NBR 13532 : Elaboração de projetos de edificações – Arquitetura. Rio de Janeiro, 1995.

Blake, Peter. Form follows fiasco: why Modern Architecture hasn’t worked. Boston / Toronto: Little, Brown, 1977.

Brandão, Carlos Antônio Leite. “Linguagem e arquitetura: o problema do conceito.?Interpretar Arquitetura, Novembro 2000. //www.arquitetura.ufmg.br/ia/.

Carpo, Mario. Architecture in the age of printing: orality, writing, typography, and printed images in the history of architectural theory. Traduzido por Sarah Benson. Cambridge, Mass: MIT Press, 2001.

Ferro, Sérgio. “Arquitetura nova.?In Arquitetura e trabalho livre, 47-58. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

Ficher, Sylvia. “Reflexões sobre o pós-modernismo.?MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Março 9, 2007.

Instituto de Arquitetos do Brasil. Tabela de Honorários : condições de contratação e remuneração do Projeto de Arquitetura da edificação. //www.iab.org.br.

Macedo, Danilo Matoso. “Deixar de pensar no estilo.?MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Janeiro 19, 2009. //28ers.com/2009/01/19/deixar-de-pensar-no-estilo/.

Martínez, Alfonso Corona. Ensaio sobre o projeto. Traduzido por Ane Lise Spaltemberg. Arquitetura e Urbanismo. Brasília: Unb, 2000.

Summerson, John. “The mischievous analogy.?In Heavenly mansions and other essays on architecture, 195-218. New York/London: W. W. Norton, 1963.


danilo matoso macedo
Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004), editor da revista mdc.

contato: correio@danilo.28ers.com | www.danilo.28ers.com

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cardozo

Livro

Maria do Carmo Pontes Lyra
Maria Valéria Baltar de Abreu Vasconcelos

Resenha por
Danilo Matoso Macedo

L’historien n’est pas celui qui sait. Il est celui qui cherche.
Lucien Febvre[1]

Vinte e nove anos. É o tempo transcorrido entre o início da pesquisa e a publicação do livro Cardozo : bibliografia de Joaquim Cardozo : vida e obra (Editora Universitária da UFPE, 2008. 289p.). O trabalho foi empreendido a partir de 1980 pela bibliotecária da UFPE Maria do Carmo Pontes Lyra, num tour de force concluído em 1984. Após sucessivas atualizações e a contribuição da também bibliotecária Maria Valéria Baltar de Abreu Vasconcelos, em 1998, Carminha ?como é carinhosamente conhecida no CAC-UFPE ?escreveu os agradecimentos àqueles que colaboraram com sua pesquisa. O livro foi dado aos prelos somente em 2008 ?data de sua catalogação bibliográfica ?e será efetivamente lançado em 8 de junho próximo.

O trabalho do bibliógrafo é árduo. Exige a uma vez conhecimento do tema tratado, disposição para extensivo labor de busca e habilidade nos contatos com outras pessoas, fontes e instituições ?requisitos plenamente cumpridos pelas autoras, a julgar pela qualidade da pesquisa apresentada.  A listagem de 991 referências divide-se em quatorze capítulos, separados pela forma do texto, pelo formato da documentação e por assunto.  Os títulos iniciam-se por Poesia, passando por Prosa, Teatro, Fonografia, Discursos e Correspondência, e chegando a Arquitetura, O Calculista, Gameleira. Todos os temas são compostos tanto de livros e artigos em jornais, quanto de manuscritos e desenhos não publicados disponíveis apenas em arquivos. Este amplo espectro é reflexo da personalidade humanística do bibliografado ?Joaquim Maria Moreira Cardozo (1897-1978).

Topógrafo, engenheiro, poeta, dramaturgo, desenhista, crítico de arte e historiador são apenas algumas das facetas conhecidas deste notável pernambucano responsável direto pelo mapeamento de parte do litoral nordestino, pela gênese do movimento moderno nas artes do Recife na década de 1910 e pelo cálculo estrutural de um sem-número de obras representativas de nossa arquitetura moderna brasileira ?dentre elas, a Igreja da Pampulha (Belo Horizonte, 1940) e o Congresso Nacional (Brasília, 1958), ambos projetados por Oscar Niemeyer. Nesse nosso tempo de especialistas, a imensidão de uma personalidade como a de Cardozo gera confusão. Arquitetos e engenheiros costumam acreditar que se trata de nosso calculista maior, que nas horas vagas escrevia poesia. Literatos vivem na crença de que um dos grandes poetas de nossa literatura moderna também trabalhava com engenharia para garantir o pão. Obras como o livro de Maria do Carmo e Maria Valéria desfazem a confusão e nos ensinam que Cardozo talvez não tivesse horas vagas.

O ano de 2009 é especial para a historiografia acerca de Joaquim Cardozo. Além da bibliografia, no mês de maio foi lançado Joaquim Cardozo : poesia completa e prosa (Nova Aguilar / Massangana, 2008. 686p.), e em setembro deverá ser lançada a coletânea Forma estática- forma estética : ensaios de Joaquim Cardozo sobre Arquitetura e Engenharia (Câmara dos Deputados, 2009). Todas as publicações, invariavelmente, prestam contas a trabalhos pioneiros de Maria da Paz e Geraldo Santana ?envolvidos em pesquisas sobre as obras literárias e edilícias de Joaquim Cardozo desde a década de 1960.  O potencial aproveitamento e interesse de obras de referência como essas pode ser atestado pelo crescente número de trabalhos acadêmicos em torno à produção do pernambucano, dentre os quais podemos destacar a dissertação de mestrado de Elisa Fonseca , Arte e técnica na obra de Joaquim Cardozo (UFRJ, 2007).

Os vinte e nove anos de idade da pesquisa de Maria Carmen atestam a uma vez o rigor das autoras, a importância do tema e a robustez da natureza do labor empenhado. Bibliografias como esta ?raríssimas na área de arquitetura e engenharia ?não ficam datadas, não possuem a relevância efêmera dos estudos subjetivos/interpretativos que compõem a maioria do que se publica em teoria e história da arquitetura brasileira. É um tipo trabalho de base que está na raiz e no cerne de nossa formação cultural. É uma publicação duplamente fecunda , tanto por reabrir o campo de pesquisas bibliográficas quanto por fornecer em boa hora subsídios à pesquisa da obra de Joaquim Cardozo. É obra de referência de presença obrigatória em nossas bibliotecas universitárias.

referência

LYRA, Maria do Carmo Pontes et  VASCONCELOS, Maria Valéria Baltar de Abreu. Cardozo : bibliografia de Joaquim Cardozo : vida e obra. Recife : Editora Universitária da UFPE, 2008. 290p.

aquisição

Editora Universitária da UFPE

lançamento

8 de junho de 2009
19h
Auditório do CTG  – Centro de Tecnologia e Geociência


notas

[1] O historiador não é aquele que sabe, mas  aquele que procura. Epígrafe emprestada de: Moraes, Rubem Borba de. Livros e bibliotecas no Brasil colonial. 2ed. Brasília : Briquet de Lemos Livros, 2006. 259p.

O exemplar para esta resenha foi gentimente doado por Geraldo Santana.

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Considerações sobre o ofício da arquitetura no Brasil

Pia Batismal na Capela de Santana do Pé-do-Morro - Ouro Branco (Éolo Maia,1980)

Danilo Matoso Macedo


[1]

Para que a nossa arquitetura tenha seu cunho original, como o tem as nossas máquinas, o arquiteto moderno deve não somente deixar de copiar os velhos estilos, como também deixar de pensar no estilo. O caráter da nossa arquitetura, como das outras artes, não pode ser propriamente em estilo para nós, os contemporâneos, mas sim para as gerações que nos sucederão. A nossa arquitetura deve ser apenas racional, deve basear-se apenas na lógica e esta lógica devemos opô-la aos que estão procurando por força imitar na construção algum estilo.

Gregori Warchavchik[2]

a ilusão da arquitetura sem estilo

Pode-se dizer que há cem anos almejou-se pôr fim à relação de dependência que a arquitetura tinha para com os estilos artísticos e para com os sistemas simbólicos deles derivados. Dentre todas as tentativas daqueles grupos mais ou menos articulados no ocidente talvez nenhuma tenha fracassado tão retumbantemente quanto esta, enunciada em praticamente todos os manifestos de então considerados modernos. De fato, não apenas persistiram os estilos históricos, como outros estilos foram criados a despeito e, sobretudo, a partir da prática daqueles arquitetos. Em que pese a queixa de Anatole Kopp,[3] a Arquitetura Moderna nunca deixou de tratar dos estilos: ao contrário, reforçou neles o foco do discurso arquitetônico.

Mais que criar um novo estilo, no Brasil, o discurso moderno esteve fortemente ligado à legitimidade da prática profissional – “no nosso caso, da década de quarenta em diante – Arquitetura é Arquitetura Moderna. Se não é Arquitetura Moderna não é Arquitetura, tout court.”[4] Não bastasse a hegemonia do estilo moderno no Brasil, seu questionamento, a partir da década de 1960, exacerbou justamente os aspectos relacionados às feições externas das construções. Parecia não haver escapatória: a prática de Arquitetura Moderna ou Pós-moderna era simplesmente uma questão de estilo.

Grande Hotel Araxá (Luiz Signorelli, 1936), Fonte Andrade Júnior (Francisco Bolonha, 1945), Paisagismo de Roberto Burle-Marx

Grande Hotel Araxá (Luiz Signorelli, 1936), Fonte Andrade Júnior (Francisco Bolonha, 1945), Paisagismo de Roberto Burle-Marx. Foto: Danilo Matoso

Até hoje, as publicações de arquitetura concentram-se neste aspecto. E defendem-no os arquitetos com unhas e dentes em encarniçadas disputas intelectuais – nos seminários acadêmicos – e profissionais – nos concursos de arquitetura. Discute-se, nas obras, o minimalismo, o modernismo, o pós-modernismo e qualquer novo “ismo” que vier a surgir – quanto maior a aproximação entre réplica e protótipo estilístico, melhor. Este argumento pode ser facilmente verificado em qualquer revista de arquitetura com mais de vinte anos de idade: veremos a sucessão do historicismo, do deconstrutivismo, do minimalismo, culminando hoje no pseudo-futurismo[5], no neo-modernismo holandês[6] – ainda carentes de denominação. Sabe-se, certamente, que não se verá hoje uma casa de Michael Graves na revista espanhola AV: o estilo pós-moderno saiu de moda.

Sabemos, entretanto, que a construção envolve mais que estilo. Envolve todas as questões de que se ouve falar desde o primeiro ano no curso de arquitetura, mas que são relegadas a segundo plano ao longo da carreira profissional pela maioria de nós: custo, processo de contratação do arquiteto, dos demais projetistas e do construtor, tempo de obra, técnicas construtivas, compatibilidade e durabilidade dos materiais etc.

No campo da construção, a arquitetura é demandada sobretudo quanto à integridade e durabilidade dos objetos propostos. A integridade, em oposição à tendência dos materiais à desagregação, é um dos bodes expiatórios das vanguardas do século XX. A luta das vanguardas contra a integridade tradicional dos edifícios – associada aos historicismos – culminou na paradoxal associação, recentemente promovida no métier, entre falta de integridade e boa arquitetura[7]. Arquitetura envolve ainda durabilidade. E durabilidade nos exige pensar além da última moda, além dos estilos passageiros, afinal o edifício vai durar mais que eles. A durabilidade contém, em si, dois outros importantes fatores derivados: a economia de recursos para reforma e manutenção, e a adaptabilidade do edifício a diversos usos.[8] São critérios objetivos de concepção e análise de projeto que raramente vêm à tona no discurso arquitetônico, e aos quais, ao fim e ao cabo, todo estilo presta contas.

Não há dúvidas de que, não apenas a arquitetura ainda é pensada em termos de estilo, como também esta é a discussão majoritária em nosso campo. É a discussão de estilo que subjetiviza todo e qualquer juízo de valor acerca de uma obra. E, se por um lado ela tem gerado a exaltação de profissionais e edificações de mérito duvidoso, por outro lado é o que assegura ao campo arquitetônico sua reserva de mercado. O estilo está no cerne do capital simbólico[9] que acaba por resguardar o lugar social dos profissionais. Pode-se facilmente constatar este fato na arrogância de qualquer estudante de arquitetura de primeiro ano, que acredita serem aqueles dois semestres de estudo, no campo da história da arte, suficientes para garantir-lhe competência e capacidade de discernimento superiores aos de qualquer engenheiro com cinqüenta anos de ofício. No Brasil, entretanto, os efeitos desta exclusão sistemática dos demais temas são mais perversos.

rebeldes sem causa

Ocorre que, na Europa, Estados Unidos, Canadá, e mesmo no Chile, Argentina ou Uruguai[10], a arquitetura é profissão bastante regulamentada – e as cidades são melhor construídas, diga-se de passagem. A regulamentação significa, principalmente, que naqueles países a prática de arquitetura segue diversos padrões normativos expressos tanto na legislação quanto nas normas técnicas elaboradas pela própria corporação. Significa ainda que um arquiteto com trinta anos de experiência não possui a mesma habilitação profissional que um recém-formado, coisa que ocorre no Brasil – onde ambos estão habilitados legalmente a assinar o projeto de um aeroporto internacional. Aqui, ao ouvir falar de normas, alguns colegas gabam-se de desconhecê-las. Afinal, um artista não conhece normas: tem coisas mais importantes de que se ocupar – como a feição minimalista, colonial, deconstrutivista ou holandesa de seu projeto. Se nos países mencionados o arquiteto orgulha-se de assumir para si a responsabilidade do projeto – e por isso cerca-se das normas, das leis e dos seguros profissionais -, no Brasil os arquitetos orgulham-se em não assumir responsabilidade alguma. Não nos responsabilizamos pela construção nem pela eficiência, pela integridade ou durabilidade do artefato entregue e, consequentemente, negligenciamos as gerações do futuro obrigadas, enfim, a lidar com palácios de papel e com as cidades caóticas que legamos.

As normas – a própria base do Estado Democrático de Direito, o cerne do contrato social -, que permitiriam uma convenção profissional: são elas as grandes negligenciadas pela arquitetura nacional.[11] Conta-se nos dedos das mãos as normas da ABNT diretamente ligadas à arquitetura.[12] Basta dizer que até hoje não possuímos sequer uma norma de Projeto Executivo e compatibilização de projetos, e que o grande manual de medidas e padrões usado em escritórios brasileiros – o Neufert [13]–  foi feito na Alemanha há mais de sessenta anos.

Alojamentos da UnB feitos usando sistema padronizado de construção (Sérgio Rodrigues, 1962)

Alojamentos da UnB feitos usando sistema padronizado de construção (Sérgio Rodrigues, 1962). Foto - Danilo Matoso

No Brasil não há padronização de materiais, de medidas, de metodologia de projeto ou de sistemas construtivos. Não há padrões organizacionais para os escritórios de arquitetura, improvisados em ateliês semi-domésticos, e não há padrões sérios de contratação de serviços de arquitetura – onde os próprios arquitetos trabalham ilegalmente. Os parâmetros de desempenho técnico restringem-se aos mirrados códigos de edificações – a maioria elaborada por engenheiros há pouco menos de cem anos – determinando cones de iluminação, tamanho mínimo de aberturas e de cômodos. Há poucos e louváveis estudos objetivos em nosso país sobre o custo das decisões arquitetônicas[14] . Os aspectos estéticos, formais, simbólicos e sobretudo estilísticos dos edifícios são, entretanto, pisados e repisados em publicações, seminários, bienais, e nos cursos de pós-graduação.

Evidentemente, a prevalência deste tipo de abordagem estilística em nosso meio deve-se às vantagens simbólicas de dominar este tipo de discurso – mesmo que apenas intuídas por alguns dos nossos inadvertidos colegas. Quanto mais mágica e inexplicavelmente irracional uma decisão de projeto se torna, maior a fatia do mercado reservada pelo seu hermetismo.

Há, entretanto, um mercado restrito para esta prática, na qual a simples presença do arquiteto torna um objeto magicamente significativo: é o mercado das pessoas de poder e gosto[15]. A consequência deste afunilamento é a restrição das demandas deste grupo àqueles que, originalmente, já pertencem a ele: os próprios arquitetos de poder e gosto. Que fique claro: a arquitetura no Brasil – e na maior parte do mundo – é atividade reservada aos provenientes de famílias ricas, poderosas ou tradicionais – não necessariamente nesta ordem. E, evidentemente, há exceções que confirmam a regra. Um breve estudo da biografia de nossos ídolos maiores – os arquitetos da chamada Escola Carioca[16], mostrará que, mesmo em se tratando de comunistas, alguns são mais iguais que outros.

É de se suspeitar que, no cerne de nossa alma colonizada, aqueles que detêm maior poder e gosto são os estrangeiros – preferivelmente os europeus. Daí o modo acrítico com que abrimos avidamente as revistas e livros de nossos colegas do hemisfério norte. Daí o modo submisso com que dedicamos nossas pesquisas às dores e penas que afligem os arquitetos norte-americanos ou ingleses, deixando praticamente desconhecidos e abandonados os arquitetos e edifícios que fizeram e fazem as cidades brasileiras.

Os arquitetos europeus e norte-americanos preocupam-se com estilo, hoje, por não haver assunto melhor de que tratar: a profissão em seus países está reconhecida e normatizada, a indústria oferece diversos novos materiais com garantia de execução; as cidades possuem infra-estrutura urbana, transporte e teto para todos. Para um arquiteto americano, submeter-se às normas e convenções é condição para o exercício profissional, e a fuga das normas é um saudável exercício de invenção e rebeldia. E, ao copiar-lhe a atitude, o arquiteto brasileiro torna-se apenas um rebel without a cause…

construindo barato

Mas não apenas o processo de produção é diferente. Os objetos, aqui e lá, também são diversos entre si. A inclemência de seus invernos levou os europeus e norte-americanos a construir paredes e janelas que são verdadeiras máquinas de isolamento entre ambientes interno e externo. São máquinas cujo desempenho depende da qualidade dos acabamentos, das soluções de encaixe etc. E se uma máquina falha, a responsabilidade pelos danos causados é do arquiteto. Aqueles que já tiveram contato com a prática de arquitetura nos Estados Unidos, por exemplo, sabem do valor que o profissional prancheteiro norte-americano dá a uma wall-section: o âmago de sua solução e de sua profissão. Por isso, o processo construtivo nesses países é substancialmente mais caro e elaborado que no Brasil. Em nosso país, o clima ameno permite soluções construtivas simples, pouco estanques e pouco elaboradas. Nos trópicos, para usar a figura lembrada por Angelo Bucci em suas palestras: se alguém dormir na praça, não morre de frio. Faz sentido, portanto, sermos menos criteriosos quanto às vedações, quanto aos acabamentos, e quanto à performance dos materiais no que tange ao isolamento e à resistência às intempéries mais brandas[17]. Não se justifica, entretanto, o desleixo com que tratamos a qualidade construtiva em nosso país.

São valores diametralmente distintos, os deles e os nossos, que não deveriam ser confundidos e misturados, como o são diariamente. São profissionais diferentes em sua inserção social, que produzem objetos diferentes para sociedades e lugares diferentes.

Camadas constituintes das paredes externas da Fundação Iberê Camargo - Porto Alegre (Álvaro Siza, 1998)

Camadas constituintes das paredes externas da Fundação Iberê Camargo - Porto Alegre (Álvaro Siza, 1998). Foto: Danilo Matoso

Dois exemplos recentes ilustram bem o exposto: a Cidade da Música, no Rio de Janeiro – projeto do francês Christian de Portzamparc e a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre – projeto do português Álvaro Siza. Ambas foram construídas quase inteiramente com concreto – a segunda, com concreto branco (ou seja: com cimento, areia e brita brancos e com aço galvanizado nas armaduras). Os peitoris desta foram feitos de mármore branco grego com espessura de cinco centímetros. Todo o interior do edifício foi revestido com  estrutura metálica e coberto com painéis de gesso acartonado, dentro dos quais corre uma serpentina que auxilia no controle de temperatura. Evidentemente, o resultado é impressionante. Como também o é o da análoga Cidade da Música (construída por dez vezes o custo normal do metro quadrado vigente no país). Nem a Oscar Niemeyer ou a Paulo Mendes da Rocha – nossos dois Pritzker – teria sido dada tamanha liberdade orçamentária. É claro: o maior capital simbólico, para nós, ainda é o dos estrangeiros.

Casa de Cora Coralina na cidade de Goiás Velho (século XVIII).

Casa de Cora Coralina na cidade de Goiás Velho (século XVIII). Foto - Danilo Matoso

Nossa boca está torta pelo cachimbo da pobreza e – mesmo sendo um país rico – somente sabemos projetar e construir mal. Nossos prédios necessitam de reformas significativas com menos de dez anos de vida: os revestimentos de fachadas despencam, a impermeabilização invariavelmente vaza, as portas e janelas emperram, as telhas voam com o vento… É possível, porém, atribuir qualidade construtiva a objetos de pouco valor diretamente agregado. Foi esta a façanha da arquitetura urbana do Brasil colonial, por exemplo, que inspirou os melhores dos nossos modernos. Não seria possível, portanto, uma arquitetura de qualidade pensada segundo nossos próprios parâmetros construtivos?

Se os exemplos em apreço nos ensinam algo, é que carece totalmente de sentido acreditarmos realmente que o que se publica em revistas internacionais – e consequentemente em revistas nacionais – pode ser transposto diretamente para nossa realidade. Repetimos: são problemas diferentes de profissionais diferentes, em profissões diferentes, num contexto material o mais diverso possível.

campo profissional e sociedade

O ciclo do auto-engano tem início cedo. Normalmente, o estudante de arquitetura médio já entra na faculdade acreditando que, se tiver a chance, será o novo Niemeyer: que será capaz de comover a todos com seu talento e com a força de sua arquitetura, e que construirá os monumentos de sua geração – a questão de estilo é também uma questão de ética pessoal[18]. Em seguida vem a primeira doutrinação: o estudo de história da arte como base para a história da arquitetura. Esta última, evidentemente, ensinada como história dos estilos. A missão do jovem arquiteto? Descobrir o estilo verdadeiro correspondente à sua época [19]. Via de regra, tal é a meta de nossos colegas. Daí a sede pelo original, pelo novo – com a vantagem de ser menos trabalhoso que buscar seu próprio zeitgeist estudando história e proporções clássicas (mérito e esforço de alguns arquitetos das décadas de 1970 e 1980).

Não mencionamos nossas escolas e estudantes ao acaso. A diferenciação mítica entre inventor e construtor

tem origem justamente no surgimento do ensino institucional, como preconizado na Academie Royale d’Architecture, criada por Colbert em 1671. Voltado para a formação dos architectes du roi – aqueles indivíduos encarregados do projeto e execução das obras públicas do reino de Luís 14 – e eivado por uma doutrina neoplatônica, esse ensino iria contribuir para a dissimulação da importância dos aspectos práticos da construção, enfatizando mais o caráter estético e formal das obras de arquitetura, deixando implícita sua concepção da profissão.[20]

Da chegada da Missão Francesa ao Brasil, e com ela a concepção da Arquitetura Brasileira como exercício de estilo, já se passaram quase dois séculos. E até hoje a poucos ocorre que a questão aqui é anterior. Não percebemos que, antes de nos preocuparmos com estilo, deveríamos preocupar-nos com atender à sociedade a que pertencemos. Em lugar de acotovelarmo-nos tentando construir uns poucos monumentos, edifícios comerciais e casas de elite, deveríamos tentar padronizar e simplificar métodos de projeto e construção, de modo objetivo e duradouro. Profissionais carentes de capital simbólico internacional – a maioria de nós – teriam assim instrumental técnico para atender às comunidades de classe média e classe baixa – a que muitos pertencemos. São as regras, as normas simples, da boa técnica de projetar e construir que servem às demandas dessas pessoas.

Já apontamos, em outro texto[21], que basta um passeio pelo Google Earth para constatar que no mínimo 70% de nossas cidades foram construídas na ilegalidade, sem assistência técnica alguma de engenheiro ou arquiteto. A estatística que intuímos foi confirmada em reportagem veiculada recentemente na televisão sobre materiais de construção[22], mostrando que “23% dos produtos vão para grandes obras e 77% para as pequenas construções e reformas”. As grandes obras, não devem ser confundidas com os Grands Travaux: são simplesmente aquelas obras feitas por construtoras que contratam arquitetos, e para quem estes aprendem a trabalhar, como veremos adiante.

Aquele cliente médio, responsável pela construção efetiva de nossas cidades, nos propõe um desafio muito simples: ajudá-lo a planejar e a construir sua edificação. Para tanto, o profissional adequado é aquele que projeta, orça a obra e, preferivelmente, constrói a edificação. Aquele que se limita ao desenho arquitetônico força o cliente a contratar mais mão-de-obra, a resolver mais problemas – normalmente inventados por ele mesmo – e a consumir mais recursos. De fato, a legislação brasileira[23] permite ao arquiteto realizar o cálculo estrutural e os demais projetos complementares da maioria absoluta das tipologias edilícias que constituem nossas cidades. E poderíamos fazê-lo: realmente poderíamos assumir para nós essa responsabilidade. Deparamo-nos, entretanto, com dois problemas bastante difíceis de contornar.

O primeiro é nossa formação deficiente e nossa simples desqualificação para projetar e construir a íntegra de uma edificação – embora tenhamos habilitação legal para fazê-lo: as matérias ditas técnicas estão sendo gradualmente extintas dos cursos de arquitetura; as cadeiras de projeto, por sua vez, deveriam chamar-se cadeiras de anteprojeto, pois não costumam ir além dessa fase de desenvolvimento que – todo arquiteto sabe – não ocupa mais que 5% do trabalho e esforço destinado à elaboração de um projeto completo de uma edificação. As cadeiras de anteprojeto – adotemos a pecha – ensinam o arquiteto a enganar-se a si mesmo e a acreditar realmente que aqueles valores estilísticos ali elencados são relevantes para a cidade e a população. Afinal, enganando a si mesmo fica mais fácil enganar aos demais – é o capital corporificado[24] que auxilia na construção da idéia de magia e intangibilidade nos valores da profissão. Acresce que, mesmo quando aprendem a desenvolver projetos e detalhá-los, os estudantes são treinados para projetar dentro de um sistema produtivo relacionado a grandes edifícios – onde o arquiteto é responsável apenas pelo projeto arquitetônico, deixando as instalações, a estrutura e, é claro, a construção, a cargo de terceiros. Quando este sistema é transposto do mundo acadêmico para a realidade do jovem arquiteto, há um conflito. O Brasil é carente de um sistema coeso de grandes escritórios – supostamente, os que são encarregados das grandes obras – onde aquele conhecimento restrito e segmentado é útil. A regra, portanto, é que o jovem arquiteto abra seu próprio escritório com outros colegas, onde se dedicará a pequenos projetos residenciais e de reformas – os 77%. Carente de instrução, o arquiteto aplicará os métodos de projeto descentralizados que aprendeu – envolvendo vários profissionais – a objetos pequenos, levando ao cliente a necessidade de contratar engenheiros para realizar o trabalho que poderia ser executado integralmente, com mais economia, celeridade e competência, pelo próprio arquiteto. De fato, há aqui um conflito entre o sistema de crenças que norteia e legitima a atuação profissional do arquiteto e a prática cotidiana de trabalho, determinada pelas condições de mercado.[25]

O segundo problema, relacionado ao primeiro, diz respeito justamente ao lugar social do construtor – hoje inferior ao do artista/projetista. Afinal, a maioria de nós, senão todos, gostaria de atingir o mais elevado status social possível. Portanto, não seria um bom conselho ao arquiteto médio de hoje incentivá-lo ao domínio total do processo de produção das edificações. Certamente, é mais atraente a ilusão de que se trabalha com invenções, em lugar das convenções implicadas por uma prática padronizada.[26] Ilusão porque não há nada mais convencional que os processos culturais de inovação e de modas. Arquitetos fora destas convenções da invenção, por assim dizer, – todas ligadas ao estilo – não conseguem publicar projetos nem vencer concursos. É impossível hoje em dia publicar, em revistas como a AU ou a Projeto, uma residência neocolonial – por exemplo. Já nas revistas que a população compra, a história é bastante diferente, todos sabemos.

pensamento, técnica e conhecimento arquitetônico

Costuma-se objetar a nosso ponto de vista qualificando-o de tecnicista, ou de burocrático. Argumenta-se que, com tantas regras e normas, não se ensinaria os alunos a pensar. É evidente que o conceito de pensamento desses críticos é bastante restrito. Acreditam eles, realmente, que a reflexão só tem lugar na forma de texto e no seio da escrita filosófica. Todo aquele com alguma experiência de projeto e construção sabe das dificuldades conceituais que envolvem o dia-a-dia do ofício, das centenas de pequenas e grandes decisões que devemos tomar para desenvolver uma construção. São as pesquisas materiais e as reflexões sobre as aptidões entre elas que permitem ao arquiteto conciliar num mesmo lugar vários componentes, e transformá-los em espaço construído. Não há porque qualificá-las num patamar inferior ao agrupamento de palavras para escrever um artigo teórico. São, por exemplo, questões de compatibilização entre dimensões, de afinidade entre materiais, de sua resistência, do encaixe de uma esquadria para que a água não escorra para dentro do edifício, de uma simples e corriqueira solução de sanitários públicos que não cause constrangimento aos usuários. Tudo isso é matéria passível de construção cultural, de teorização, aprofundamento, e normalização – como se faria com a prática em qualquer outra profissão.

Mas para o arquiteto só existem a história dos estilos e as teorias que as legitimam. Aqueles temas “pragmáticos” são comumente relegados a segundo plano em pesquisas acadêmicas e mesmo nas publicações especializadas em projeto, onde habitam em suplementos técnicos – impressos em papel-jornal – e junto à publicidade de materiais.

E mesmo dentro da história dos estilos, é notável a incompetência de nosso campo para construir uma historiografia real e objetiva de nossas próprias cidades. Conforme já apontamos, os arquitetos e obras nacionais são solenemente ignorados na maioria das pesquisas de fundo histórico. Estas subordinam toda a nossa evolução a movimentos e estilos estrangeiros, sem tomar conhecimento de sua realidade mais próxima. A pouca história da arquitetura do século XX que construímos, por exemplo, insiste em que os estilos neocolonial, e Art-Déco foram preparações para o moderno (falam até em proto-moderno), e que já se extinguiram, segundo a ordem natural das coisas. Um passeio por qualquer bairro de classe alta prova que os estilos históricos continuam bem requisitados e construídos – em casas e edifícios inteiros residenciais. Entretanto, carentes de historiografia oficial e de análise crítica[27], cada vez mais decaem em qualidade construtiva e conceitual. Aquele que optar pelo uso de um capitel, por exemplo, deverá adquirir pré-fabricados de gesso totalmente desvinculados dos modelos originais e carentes de integridade material. Evidentemente: usar capitel hoje em dia não é tarefa para arquiteto. O arquiteto, esse sim, fará um tremendo esforço para executar um rodapé embutido, um pano de vidro – para depois recobri-lo com brises -, uma parede fora do esquadro ou qualquer outro elemento dos estilos moderno ou deconstrutivista. “Era a solução natural que a técnica sugeria…” – ressoa o conhecido mantra

Não queremos, com isso, atacar nossa arquitetura moderna ou diminuir suas conquistas. Ao contrário: sugerimos aqui que a produção arquitetônica de nosso país seja estudada segundo seus próprios valores, construídos sobre sua própria história material. A partir desta abordagem de sentido amplo, a adoção de cada estilo passa a ser simplesmente uma questão de hábito, de ofício, passado de geração em geração. Como bem nos lembra Álvaro Puntoni: não abdicar de uma inteligência construída talvez seja o ponto de partida para o estabelecimento de um possível e desejável denominador comum na Arquitetura Contemporânea Brasileira.[28] Se um arquiteto aprende a projetar e construir bem em determinado estilo, ou modo, é mais produtivo que suas invenções ocorram no seio daquela linguagem. Afinal, fazer experimentalismo com bens alheios é, no mínimo, inconveniente. Convido a todo aquele que suspeitar de alguma mesmice excessiva derivada da hegemonia de alguma escola arquitetônica[29] a visitar um subúrbio metropolitano e constatar que, certamente, a monotonia do que se vê nas revistas não poderá ser encontrada nas ruas – palco natural da pluralidade.

rumo à maioridade

Andaimes para execução de forro durante as obras do Museu da República - Brasilia (Oscar Niemeyer, 1999)

Andaimes para execução de forro durante as obras do Museu da República - Brasilia (Oscar Niemeyer, 1999). Foto: Danilo Matoso

Somos um país com diversidade de pensamento e riqueza suficiente para pôr fim a este complexo de inferioridade colonizado, que nos coloca sempre em condição de dependência conceitual para com os arquitetos estrangeiros.[30] Dentre os muitos legados de Oscar Niemeyer à arquitetura nacional, talvez o mais relevante seja a demonstração de que não devemos e não precisamos nos colocar em condição de inferioridade em relação aos mestres europeus ou norte-americanos. Ao contrário: devemos criar os valores e as condições culturais próprios para reconhecer e apreciar nossos mestres também e, sem xenofobia, aprendermos a dialogar em pé de igualdade com a cultura arquitetônica global. Para isso, antes de tudo, é necessária a produção de conhecimento a partir do que a sociedade espera de nós: que saibamos construir nossas próprias moradas.

Nesse sentido, e a modo de encerramento, convém apontar alguns fatores que podem ser decisivos para uma mudança radical de pensamento pela comunidade de arquitetos – projetistas e pesquisadores.

No campo da prática profissional, as oportunidades que se afiguram são únicas. A nova Lei de Assistência Técnica Gratuita[31] enseja a formação de profissionais com perfil diferenciado, capazes de atender às demandas mais imediatas da população. Por sua vez, a iminente criação do Conselho Federal de Arquitetura, sugere a possibilidade de se estabelecer uma nova e mais extensiva regulamentação das atividades do arquiteto, favorecendo sua qualificação como projetista e construtor plenos, e não apenas projetista de arquitetura. Vem ao encontro disso a explosão de cursos de arquitetura no Brasil, tornando-o “um dos países com maior número de arquitetos registrados“, apresentando “o maior número de escolas de arquitetura do mundo (…) o que significa que a quantidade de arquitetos tende a crescer ainda mais rapidamente.”[32]

No campo da pesquisa acadêmica, as novas demandas do Ministério da Educação quanto à produção dos pesquisadores nas Universidades tem levado a um aumento significativo no número de seminários e publicações. Cabe agora por um fim à repetição do que se diz alhures e à subordinação incondicional de nossa prática à estrangeira: cabe realizar levantamentos de campo, inventários, medições, pesquisa em documentação primária e outras atividades que lidem com a arquitetura a partir de fontes primárias, e não com publicações e textos alheios.

É preciso operar uma mudança nas expectativas que os arquitetos brasileiros têm de seu ofício, voltando-o para o atendimento de sua própria sociedade, e não para a comunidade arquitetônica internacional. Desta, esperam os aplausos. Mas só receberão outros arquitetos – e ávidos por trabalho.


notas

[1] Dedico este texto aos meus colegas de ofício – em todos os sentidos: Alexandre Brasil, André Prado, Bruno Santa Cecília, Carlos Alberto Maciel, Fernando Maculan, Humberto Hermeto e Pedro Morais.

[2] WARCHAVCHIK, Gregori. Acerca da Arquitetura moderna (1925). In BARDI, Pietro Maria. Warchavchik e as origens da arquitetura moderna no Brasil. São Paulo: Museu de Arte de São Paulo “Assis Chateaubriand”, 1971.  s/n (grifo nosso)

[3] KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. Nobel/Edusp, 1990.  253p.

[4] FICHER. Sylvia. Reflexões sobre o pós-modernismo. MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte, n.4, p.5. nov.2007. Entrevista a Danilo Matoso.

[5] Por pseudo-futurismo englobo a arquitetura que tenta criar alegorias aerodinâmicas de uma arquitetura “futura”: projetos do escritório Future Systems, de Zaha Hadid etc.

[6] Mecanoo, MVRDV e, é claro, Rem Koolhaas.

[7] Veja-se as obras de Rem Koolhaas e a maioria dos seus seguidores, como MRVDV. Veja-se ainda o texto:  KAPP. Silke. Contra a integridade. MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte, n.2, p.8-10. fev.2006.

[8] Ironicamente hoje em dia o discurso da sustentabilidade em arquitetura poucas vezes passa pela durabilidade, mas sim pelo uso indiscriminado de máquinas de “economia energética” associadas a edifícios feitos com materiais carentes de gravitas e, a rigor, perecíveis – como os revestimentos de alumínio, vidro laminado e madeira: é o greenwash promovido pela arquitetura Echo-tech. Veja-se, a este respeito: SOBREIRA, Fabiano. “Concursos e sustentabilidade: os riscos da onda verde“. In Portal Concursos de Projeto. 16 dez.2008. Disponível em: < www.concursosdeprojeto.org >. Acesso em: 15 jan.2009.

[9] Termo bourdiano conforme desenvolvido, para o campo arquitetônico em STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Traduzido por Lenise Garcia Barbosa. Arquitetura e Urbanismo. Brasília: Unb, 2003. p.76-82

[10] Um bom indicador: na maioria destes países há exame de ordem para se exercer a profissão. No caso Norte-Americano, antes de prestar exame, são obrigatórios dois anos de prática supervisionada em escritório credenciado (Cf. www.aia.org) . O exame de ordem é baseado exclusivamente nos conhecimentos técnicos de projeto e construção. Cf. //www.ncarb.org.

[11] As raízes do descaso brasileiro para com tudo o que diga respeito a normas, regulamentações ou sentimento de coletividade vão além das questões específicas da arquitetura e já foram suficientemente exploradas há tempos em estudos sociológicos como o de Sérgio Buarque de Hollanda em Raízes do Brasil: Pouco importa aos nossos colonizadores que seja frouxa e insegura a disciplina fora daquilo em que os fresos podem melhor aproveitar, e imediatamente, aos seus interesses terrenos. Para isso também contribuiria uma aversão congênita a qualquer ordenação impessoal da existência” in HOLLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Edição Comemorativa – 70 anos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.  p.112.

[12] Talvez as únicas a regulamentar diretamente o processo de projeto sejam as NBRs 6.492/1994, 13.531/1995 e 13.532/1995.

[13] NEUFERT, Ernst. A arte de projetar em arquitetura: princípios, normas e prescrições sobre construção, instalações, distribuição e programa de necessidades, dimensões de edifícios, locais e utensílios. 5 ed. Barcelona: Gustavo Gili, 1976.  431p.

[14] MASCARÓ, Juan Luis. O custo das decisões arquitetônicas. 3 ed. Porto Alegre: JLM, 2004.  180p.

[15] Cf. STEVENS, O círculo privilegiado. p.105.

[16] Oscar Niemeyer, por exemplo, é neto de ministro da Suprema Corte. Lucio Costa nasceu em Toulon, França. Ambos pertenciam à aristocracia carioca.

[17] Cf. SANTA CECÍLIA, Bruno. “Tectônica moderna e construção nacional“. MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte/Brasília, n.1, p.6-9. jan.2006.

[18] Nos EEUU, o arquétipo deste personagem heróico chama-se Howard Roark e protagoniza o famoso romance de Ayn Rand: The Fountainhead. A autora conta que o personagem foi baseado na vida de Frank Lloyd Wright.

[19] A respeito dos estilos no ensino de projeto, ver SOBREIRA, Fabiano. “A desconstrução do princípio. Ensaio sobre o ensino do projeto de arquitetura.” Portal Vitruvius – Arquitextos – Texto Especial, no. 147 (Abril 2008). //www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp467.asp.

[20] FICHER, Sylvia. “Mitos e perspectivas: profissão do arquiteto e ensino de arquitetura.” Revista Projeto, São Paulo, n.185, p.79. maio 1995.

[21] MACEDO, Danilo Matoso. “Algumas funções públicas da arquitetura.” MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte/Brasília, n.2, p.14-21. fev.2006.

[22] Site G1. “Setor de material de construção deve crescer 10% em 2008,” Junho 17, 2008. //g1.globo.com/Noticias/Economia_Negocios/0,,MUL604253-9356,00-SETOR+DE+MATERIAL+DE+CONSTRUCAO+DEVE+CRESCER+EM.html.

[23] As atribuições profissionais do Arquiteto são definidas na mesma resolução do CONFEA que a dos engenheiros- Resolução 1.010/2005- ao contrário do que reza o mito popular sobre editícios de três pavimentos e similares.

[24] Cf. STEVENS. O círculo privilegiado, p.77.

[25] In: DURAND, José Carlos Garcia. A profissão de arquiteto: estudo sociológico. Rio de Janeiro: CREA-5a. Região, 1974. p. 3.

[26] Para a oposição entre invenção e convenção, cf. VENTURI, Robert. Complexity and Contradiction in Architecture. New York: Museum of Modern Art; distributed by Doubleday, Garden City, N.Y, 1966. p.41-44.

[27] Cf. PUPPI, Marcelo. Por uma história não moderna da arquitetura brasileira : questões de historiografia. Pandora. Campinas:  Pontes/ Associação dos Amigos da História da Arte/ CPHA/IFCH, 1998. 190p.

[28] PUNTONI, Álvaro. “Pensando em escolas.” MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte/Brasília, n.2, p.12. Fev.2006.

[29] Crítica comum à chamada Escola Paulista, de casas: Quatro pilares, duas empenas cegas de concreto, átrio interno e pavimentos desnivelados.

[30] Anedotas recentes a respeito de nossa submissão a arquitetos estrangeiros são narradas por José Eduardo Ferolla em FEROLLA, José Eduardo. Globo alisado ou globo azulado. MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo. Jan.2009. Disponível em: <www.28ers.com >. Acesso em 13 jan.2009.

[31] CfAssistência técnica gratuita agora é lei . in MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo.Belo Horizonte/Brasília, Jan.2009. Disponível em: <www.28ers.com >. Acesso em 13 jan.2009.

[32] MACIEL, Carlos Alberto. “Modernidade ainda que tardia.” MDC – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte/Brasília, n.1, p. 4-5, jan.2006.

danilo matoso macedo
 Arquiteto e Urbanista (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004).

contato: correio@danilo.28ers.com | www.danilo.28ers.com

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COMPLEXIDADE E CONTRADIÇÃO
NA ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA


Ano II . N.4 . nov.2007 . ISSN – 1809-4643

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Editorial

Há quarenta anos, Robert Venturi publicava o influente livro Complexidade e contradição em arquitetura. Nele, o arquiteto clamava por uma arquitetura de inclusão, do isto e aquilo, por uma arquitetura que tivesse por balizamento conceitual as mais cotidianas necessidades humanas, norteadas por valores plásticos provenientes de obras historicamente consagradas. Esta atitude inclusiva e formalista tinha seus precedentes na Arquitetura Moderna mais próxima. O próprio Venturi, em seu texto, assumia sua filiação a figuras como Alvar Aalto e Le Corbusier. E não é por acaso que a técnica baseada no lirismo deste último tenha encontrado seus ecos no Brasil. De fato a Arquitetura Moderna Brasileira caracterizou-se justo pelo abrandamento e pela livre manipulação amaneirada dos princípios da Arquitetura Moderna européia. O tema desta edição foi escolhido de modo a resgatar no cenário atual os valores daquelas reflexões.
Se a revista mineira Pampulha constituiu um marco na reverberação do pensamento de Venturi no Brasil, ela a uma vez também sinalizava uma ruptura e uma clara filiação à Arquitetura Moderna Brasileira. Ainda na década de 1980, aquele cenário diversificado foi delineado por teóricos como Sylvia Ficher e Hugo Segawa, cujas reflexões atuais sobre aquele período buscamos trazer neste número da revista. Contrapondo de modo contemporâneo o caráter inevitavelmente apologético que este tipo de resgate conota, trouxemos também a reflexão contemporânea de Rogério Andrade, ampliando o conceito de ecletismo para além do decor a que ele é usualmente associado.
Do mesmo modo, buscamos trazer à tona a produção recente de alguns protagonistas emergidos do discurso dito pósmoderno de vinte anos atrás, como José Eduardo Ferolla, Jô Vasconcellos, Éolo Maia e Sylvio de Podestá. Enquanto o programa e o local do Grand Ægyptian Museum praticamente induziam à adoção de valores historicistas banidos do vocabulário moderno ?como simetria e centralidade ?a manipulação de materiais e a relação com o entorno imediato somam a apropriação de um gosto formal intencionalmente desarmônico próprio da década de 1990. Esta desarmonia é a tônica do Restaurante Allegro, em Ouro Preto, cujo tom da argumentação prescinde dos grandes discursos estruturalistas para agenciar valores prosaicos envolvidos na obra.
O prosaísmo, o atendimento a demandas específicas da obra por meio de materiais e técnicas simples e quase vernáculas, parece ser um fio condutor entre as tradições modernas e as arquiteturas que representaram superação de sua hegemonia. É esta atitude que buscamos ressaltar com a publicação do Espaço Lúdico brasiliense e da casa Abu&Font, em Assunção.
Deparamo-nos hoje em nosso país com a recuperação do léxico moderno no que este tinha de mais redutor, excludente e simplista. Grande parte do chamado minimalismo dos anos noventa trouxe consigo a redução afetada de elementos, a solene desconsideração dos contextos sociais e locais, a pureza visual conseguida a altos custos construtivos. Um aparente abandono completo do pensamento inclusivo da década anterior.
 Acreditamos que é possível, com o panorama aqui apresentado, o planteamento consistente de alternativas à hegemonia fundamentalista que ronda o nosso meio. Se a diversidade de visões e aportes culturais é uma condição de nosso tempo, é através do diálogo que será possível a construção de uma cultura arquitetônica efetiva.

Danilo Matoso

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Danilo Matoso &#8211; mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2007/11/30/reflexoes-sobre-o-pos-modernismo/ //28ers.com/2007/11/30/reflexoes-sobre-o-pos-modernismo/#comments Fri, 30 Nov 2007 22:44:11 +0000 //28ers.com/?p=437 Continue lendo ]]> mdc 4Sylvia Ficher
Entrevista a propósito do artigo Anotações sobre o Pós-Modernismo, concedida a Danilo Matoso – Brasília 9/3/2007

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Leia também:

Anotações sobre o pós-modernismo
[Sylvia Ficher, 1984]

A década de 1980 foi marcada por um movimento progressivo de reabertura cultural decorrente do processo político de democratização. Ao mesmo tempo, pode-se dizer que, frente ao nacionalismo totalitário da ditadura, a cultura regionalista acabou por identificar-se com os movimentos de resistência ao regime. A arquitetura não funcionou de modo distinto. Superando a antiga polarização entre São Paulo e Rio de Janeiro, cada um dos núcleos urbanos emergentes do milagre econômico passou a alcunhar seus próprios valores e suas idiossincrasias, articulando-se em torno de pequenas hegemonias locais filhas de grupos profissionalmente dominantes. Um pragmatismo prancheteiro dos arquitetos mineiros vinha da explosão urbana de Belo Horizonte, polarizado na apologia ao design do grupo fundador da revista Pampulha. Em Brasília, a cultura arquitetônica acabou ilhada entre a sombra dos edifícios e arquitetos fundadores da cidade e a presença determinante e vigilante do Estado, que pouca vazão dava à diversidade plástica ou conceitual.
Foi nesse contexto que o denso trabalho acadêmico de Sylvia Ficher auxiliou na fundação de uma tradição regional brasiliense, ironicamente crítica em relação ao Movimento Moderno. Seus textos, acolhidos pela editoria de Hugo Segawa e Ruth Verde Zein na revista Projeto, tornaram-se referência conceitual obrigatória para os arquitetos formados pela Universidade de Brasília.
Formada na FAU-USP dos anos 60, cedo a arquiteta trabalhou no escritório de João Vilanova Artigas e de Fábio Penteado, tendo retornado à USP em seguida como pesquisadora. Em 1976, ruma a Nova Iorque, realizando seu mestrado na Columbia University – então, a base das exposições, conferências, publicações e construções da vanguarda da crítica e teoria da arquitetura mundial. Retornando ao Brasil, mudou-se para Brasília, onde trabalhou como fiscal de obras do Banco Nacional de Habitação – BNH, ingressando em 1983 como docente na Universidade de Brasília. Além sua própria produção como historiadora, crítica e teórica da arquitetura, ela esteve à frente da tradução e publicação no Brasil de diversos ensaios clássicos e contemporâneos, como A linguagem Clássica da Arquitetura, e Ensaio sobre o projeto.
A leitura do artigo Anotações sobre o Pós-Modernismo, quase vinte e cinco anos após sua publicação, demonstra não apenas a lucidez em traçar o panorama da arquitetura internacional de então, como também inclui o germe de uma crítica objetiva à hegemonia da Arquitetura Moderna na historiografia e cultura dominantes da arquitetura brasileira do século XX. A distância histórica aproxima hoje aqueles regionalismos díspares, e as palavras da teórica parecem complementar o sentido da diversidade projetual que se verificava no início dos anos 80 ?em Belo Horizonte ou Porto Alegre, por exemplo.
Intrigados pelos possíveis desdobramentos daquele impulso crítico, buscamos conhecer os pontos de vista atuais de Sylvia sobre as questões ali levantadas. A professora recebeu-nos gentilmente em sua residência, em 9 de março de 2007, para a realização da entrevista que aqui publicamos. Além da prosa bem-humorada e irônica, ela brinda-nos com a lucidez iconoclástica que sempre lhe foi característica, questionando mesmo algumas de nossas perguntas ?que trazíamos prontas e discutidas entre todo o conselho editorial da revista ?e ampliando a contribuição muito além do esperado. Convidamos o leitor acompanhar aqui, sem distração, o pensamento atual e pulsante de Sylvia Ficher.

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Em sua opinião, existe ou existiu um período pós-moderno em arquitetura como superação dos paradigmas modernos?

No meu entender, existiu. De fato, de inícios da década de setenta a meados da década de oitenta, houve claramente uma atitude muito vigorosa de rejeição do Modernismo, ainda que permanecessem certas manifestações – dentre aquelas que chamei das várias vertentes do Pós-Modernismo – de evidente caráter modernista, como é o caso do hightech. Há vinte e tantos anos atrás, eu tinha alguma esperança de que tal posicionamento tivesse continuidade, porém as coisas não tomaram o rumo que me parecia o mais promissor.

E mais ainda, o Pós-Modernismo existe também hoje, ele não se encerra naquele período. Existe hoje um pós-moderno, no sentido que existiu um pós-classicismo. Quando nós falamos em arquitetura clássica, somos nós que falamos em arquitetura clássica, que adjetivamos o termo arquitetura. Até meados do século XVIII, quando se dizia arquitetura – obviamente estou me referindo ao contexto ocidental, europeu – não era preciso adjetivar: arquitetura queria dizer arquitetura clássica, caso não fosse clássica, não era arquitetura. E não apenas quando se tratava de edifícios de exceção. Se uma edificação não é clássica, não é arquitetura: é uma construção. É por essa razão que ainda se fala uma bobagem dessas: “mera construção“… Estas besteiras ficam, você sabe, você escuta por aí. Particularmente entre professores de projeto…

Se analisamos o pensamento arquitetônico pós-renascentista, todo o discurso arquitetônico, este não coloca em dúvida o Classicismo. Então, quando se dizia “é uma obra de arquitetura“, a referência era naturalmente a uma edificação clássica. Veja o capítulo sobre Arquitetura da Estética do Hegel, por exemplo. Você só vai entendê-lo se considerar que o que ele diz tem a ver com o Classicismo. É claro. Isso aparece até no século XIX e, lógico, isso vem até o século XX, que essas coisas se repetem.

Tomemos o período pós-Primeira Guerra Mundial até fins da década de sessenta, quando se falava Arquitetura, não precisava nem adjetivar, não era necessário explicar nada, era arquitetura moderna. O [Robert] Venturi, pra mim, foi brilhante: lá por meados da década de 1960, de repente, ele diz que Arquitetura não é só a moderna.

Todas estas questões que estou colocando fazem sentido fora do Brasil. O caso brasileiro é radicalmente diferente. Este meu artigo em que vocês estão interessados agora seria uma primeira parte. Uma segunda parte discutiria a questão do Pós-Modernismo no Brasil, e esta eu nunca conclui. O caso brasileiro é extremo. Ou seja, mais ainda do que nos Estados Unidos ou na Europa, aqui, naquele momento – no nosso caso, da década de quarenta em diante – Arquitetura é Arquitetura Moderna. Se não é Arquitetura Moderna, não é Arquitetura, tout court, não é entendida pelos arquitetos como Arquitetura: é construção, é sei-lá-o-quê.

Então, existe um momento pós-moderno, um momento que, no meu entender, é extremamente rico, com uma produção extremamente interessante. Seria de inícios da década de setenta a meados da década de oitenta, e que tem uma produção arquitetônica muito criativa, de muita imaginação, mesmo quando historicista. Porque tal historicismo pós-moderno é muito livre. O [Charles] Moore é muito engraçado – eu, ao menos, gosto; eu me divirto muito com ele.

Ou seja, houve um fenômeno arquitetônico bastante evidente, que se pode delimitar muito bem, quando a Arquitetura Moderna não estava em vigor. Por outro lado, isto não acabou, porque hoje temos um leque de tendências, de personalidades, de individualismos… Pode-se estabelecer algumas pequenas categorias: hoje em dia você vai falar em Hightech, Historicismo, Minimalismo e Desconstrutivismo. Mais ou menos aí encaixa quase tudo do que está sendo feito no star system. Neste outro sentido, sem dúvida nós estamos num Pós-Modernismo.

Havia, na época, no Brasil, um academismo moderno de cunho dogmático?

Havia, não; no caso brasileiro permanece. Há arquitetos excelentes, gosto de um montão de gente, o pessoal mais jovem lá de São Paulo, por exemplo: gosto demais do Marcelo [Ferraz], do Bruno [Padovano], do [Héctor] Vigliecca, do Isay [Weinfeld]. Não estou muito ao corrente da produção mais contemporânea. Mas no nosso caso, o moderno tem uma permanência muito mais forte.

Os Estados Unidos nunca foram modernos de cabo a rabo. Nunca. Não há esta hegemonia de uma determinada arquitetura moderna. Primeiro, lá há várias arquiteturas modernas: tem o modernismo do Mies, tem o modernismo da Califórnia, tem o Modernismo de Nova York… E isto sem contar os “desviantes”, como um Bruce Goff, um [Edward Durell] Stone. Não tem um modernismo hegemônico. Veja um livro que todo o mundo despreza, mas que pra mim é genial, Da Bauhaus ao nosso caos [2], em que o Tom Wolfe mostra o conflito gerado pela chegada dos europeus, a disputa entre Wright, Mies e Gropius etc. Nos Estados Unidos, nunca houve um único moderno hegemônico. É mais complexo o panorama arquitetônico deles.

No caso brasileiro, o Modernismo, melhor dizendo, a Escola Carioca, se difunde pelo Brasil todo. Esta é a tese de nosso livrinho, da Marlene e meu – Arquitetura Moderna Brasileira [3]. Essa Escola Carioca vai ser o padrão do que é Arquitetura Moderna. Depois, mais adiante, entra o Brutalismo, que não é só paulista: existe um brutalismo carioca, sem dúvida. Discuto esse brutalismo carioca, e até um brutalismo brasiliense, num texto que está no Guiarquitetura Brasília [4], em que faço uma comparação entre o brutalismo paulista, o brutalismo carioca, o brutalismo brasiliense e até um brutalismo gaúcho que são bem diferenciados. Dá pra separar perfeitamente e distinguir um do outro.

O que nós temos é o seguinte: o desenvolvimento da Escola Carioca rumo ao Formalismo e rumo ao Brutalismo – e estes dois estão aí até hoje, o último chamado de Minimalismo, você dê o nome que quiser. Minimalismo é o nome novo do velho Brutalismo [risos]. Me perdoe, o tal Minimalismo…, mudaram o apelido da coisa, mas é a mesma coisa.

No Brasil há esta unidade muito mais generalizada. Veja a década de cinqüenta, o que se está construindo em Recife é idêntico ao que se está construindo no Rio, que é idêntico ao que se está em São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, Porto Alegre e assim por diante. Veja o bairro de Higienópolis, em São Paulo, o Comércio em Salvador: pilares de seção circular, panos de vidro, um ocasional brise-soleil… Há um Modernismo praticamente oficial no caso do Brasil e depois vai ter mais um, o Brutalismo. Todos os modernos de antes vão migrar para o Brutalismo. Oscar Niemeyer é um brutalista de primeiro momento: o Itamaraty é de 1962, a FAU-USP é de 1961. Ele adota o Brutalismo tão cedo quanto o Artigas. Niemeyer é brutalista também.

Agora, no meu entender, e é isto que dá o diferencial brasileiro: a formação da profissão de arquiteto no Brasil se dá aliada à difusão ou, se preferir, à assimilação do Modernismo. Você veja a nação na década de trinta: em 1933 a legislação que regulamenta as profissões de engenheiro, arquiteto e agrimensor. Ou seja, a oficialização dessas profissões. Arquiteto não existia enquanto profissão. Existia construtor, mestre-de-obras… Arquiteto, sistematicamente, queria dizer construtor. Este é o sentido da palavra até a década de quarenta. Ai vem a legislação criando o sistema CREA em 1933, a fundação do IAB em 1935, os concursos da ABI e do MEC em 1935 – em 1936 é o projeto com o Corbusier, mas o concurso é de 1935. Ou seja, a organização da profissão de arquiteto, da corporação dos arquitetos. E um dos elementos que vai dar conteúdo, que vai dar sustança, para a corporação é o Modernismo.

A organização da corporação dos arquitetos no Brasil teve, como um dos elementos que lhe deu fundamento, a adoção do Modernismo. E quem vai estar no IAB são os modernos, e se alguém quer ser arquiteto “de verdade”, quer estar na linha do IAB. E este não é assim com os americanos. Os americanos não estavam dependendo da Arquitetura Moderna para criar uma profissão. Eles tinham uma profissão muito bem organizada e já sistematizada, com um ensino que data de meados do século XIX, com uma tradição de formação de quadros na Europa. Em outras palavras, não têm uma dependência do Modernismo como uma linha estética para dar conteúdo para a profissão. Enquanto que no nosso caso, é a linha estética que vai ser um elemento de coesão, dando prestígio inclusive. A profissão se organiza no rastro do prestígio da Arquitetura Moderna no Brasil. Isso explica o porquê desta dificuldade de se abrir mão do moderno. Que uma geração mais velha do que a minha ainda tenha este apego, dá para entender – porque eu estava lá e foram meus professores. Mas a mim me espanta que a minha geração ainda tenha o mesmo apego. Quando estou na faculdade – não estou falando nem dos meus colegas -, quando falo com os meus alunos, encontro o mesmo apego: quando começo a colocar certas questões de crítica ao Modernismo, há pânico! Há esta permanência do Modernismo como o conteúdo por excelência da profissão de arquiteto.

Em seu texto, o hermetismo do meta-discurso arquitetônico pós-moderno é associado a uma aproximação entre arquitetura e universidade. Como você vê hoje a relação entre estes dois mundos?

De novo: estou colocando uma relação entre arquitetura e universidade no contexto norte-americano, numa determinada tradição de ensino da arquitetura e, mais ainda, numa tradição de estudos e pesquisas sobre história da arquitetura. O que, de novo, não é nosso caso: vamos ter situação que se aproxima disto muito mais tardiamente. O compromisso modernista no Brasil – voltando um pouco à segunda pergunta – é tão forte que ele está presente até na produção dos historiadores brasileiros. Os historiadores olham a arquitetura, fazem a história da arquitetura, tendo como referência a Arquitetura Moderna: tudo é avaliado bom ou ruim em termos de Arquitetura Moderna, em relação à Arquitetura Moderna. Quando defendi minha tese sobre o ensino de arquitetura na Escola Politécnica, ela foi criticada porque achavam que eu estava perdendo tempo com “uns arquitetos sem importância“: “Esses arquitetos não interessam, eles não são modernos.” Da velha guarda da Poli queriam que só me referisse ao Victor Dubugras, porque ele poderia ser considerado um proto-moderno – numa daquelas classificações esdrúxulas que fazem para justificar a existência de boa arquitetura fora do Modernismo e enquadrar aqueles arquitetos que não se enquadram… Já o Ramos de Azevedo, trate de esquecer. Com tal atitude joga-se fora, por exemplo, um sujeito como Alexandre Albuquerque, que talvez seja o arquiteto com a elaboração teórica mais sofisticada que nós já tivemos neste país [5]. Formado em 1905, era um arquiteto de prancheta, de obra, de todo o leque da prática profissional. É o sujeito que construiu a Catedral de São Paulo sem usar concreto, porque catedral tem que ser pedra sobre pedra, e no entanto saiu na frente no emprego de estruturas de concreto – isso muito antes da década de vinte, estou falando da década de dez, portanto muito antes da Semana de Moderna, muito antes de Warchavchik. Um arquiteto que tem tal currículo profissional, toda esta competência, e no entanto era um historiador e um teórico avançado. Acho difícil encontrar um profissional, muito ligado à prática, digamos assim, e que tenha uma produção intelectual comparável à dele – é um homem que faleceu em 1940.

Então, quando me refiro à universidade, estou me referindo particularmente ao caso americano, e poderia considerar o inglês, também. A Inglaterra tem uma tradição de história da arquitetura sem compromisso algum com a prática da profissão. O sujeito que está fazendo História da Arquitetura, está fazendo História da Arquitetura. Ele não está lá para valorizar nem a profissão, nem as instituições profissionais, a corporação. Enquanto que, no Brasil, como a profissão se organiza bem mais tarde, nós não temos tradição de história de arquitetura – e não é que não tenhamos tradição de história da arquitetura, não temos sequer tradição de história da arte, que até hoje é miserável!! A rigor, temos um Paulo Santos, o Donato Mello, no Rio, e aí, depois, aparece em São Paulo um [Carlos] Lemos, um Benedito [Lima de Toledo], mas é nos últimos vinte ou vinte e cinco anos que se construiu o campo acadêmico de História da Arquitetura.

E observe como é privilegiado o século XX: pouca gente se arrisca pelo período colonial, a não ser talvez na Bahia e em Minas Gerais. A arquitetura do período colonial brasileiro é muito mal estudada, tem muito pouca coisa!! A melhor fonte ainda é o Bazin [6], que é da década de cinqüenta, afora algum trabalho monográfico sobre uma igreja, sobre um convento, porém não há bons manuais sobre o assunto. Século XIX, então… É muito recente: agora saiu aquele guia Arquitetura Neoclássica no Rio [7], sai algo de vez em quando… Aracy Amaral se atreveu a levantar a questão do Neocolonial [8]. No Brasil, produção historiográfica está atrelada ao Modernismo. Por aí, percebe-se a sua força.

Tal hegemonia modernista, que está na raiz da organização da profissão, se reproduz em todos os campos: no ensino institucional, nos textos de história, nos textos de crítica arquitetônica, nos parâmetros das pesquisas tecnológicas, até nos hardwares -, ela permeia a quase totalidade da produção acadêmica e o entendimento do que é arquitetura. Estou falando na perspectiva da década de oitenta para cá. Na minha ingenuidade, achei: “Agora, com o Pós-Modernismo, isto aqui vai florescer, as pessoas vão se sentir livres para ter outras opiniões, para articular uma crítica arquitetônica mais rica, mais consistente, mais útil mesmo.” Mas não: a presença da tradição moderna entre nós é tão forte que não aconteceu nada. Saiu pouquíssima coisa: um [Eduardo] Subirats, um [Sylvio de] Podestá, uma coisa muito pontual. E quando você lê os textos de crítica é aquela velha reprodução, reprodução, reprodução daquelas idéias, as mesmas valorizações de sempre…

Mais ainda, na década de quarenta, a Europa e os Estados Unidos estão em guerra. E o lugar onde está se produzindo Arquitetura Moderna é o Brasil. O resultado é uma espécie de ufanismo modernista, porque nós realmente tínhamos uma Arquitetura Moderna para mostrar no pós-guerra. No segundo pós-guerra, quando se quer fazer Arquitetura Moderna, vai se olhar para quem, para onde? Para o MEC! O Ministério da Educação é o grande modelo arquitetônico não apenas aqui, veja o Lever House (1948-1949), do Bunshaft: é o MEC; lembre-se que o Brazil Builds [9] é de 1942. Quem tinha uma produção relativamente consistente e contínua de Arquitetura Moderna naquele momento era o Brasil.

O peso desta glória arquitetônica toda acaba também influenciando e sendo mais um elemento de reforço da tradição modernista no país. O que funciona nos Estados Unidos estimulando a reflexão em direção a uma crítica ao Modernismo, a uma diversificação na produção arquitetônica, aqui tem o papel oposto: a universidade reforça uma tradição, e não uma ruptura com a tradição. A relação que dá pra fazer entre universidade e produção profissional para explicar o surgimento de uma Arquitetura Pós-Moderna nos Estados Unidos, no nosso caso serve para explicar a permanência da tradição, devido àquela situação muito particular das décadas de trinta e quarenta. Somos especialistas em Arquitetura Não-Pós-Moderna!!!

No nosso caso ainda tem um agravante que é 1964: a ditadura. Então, no Brasil – e isto é relativamente verdade também em alguns outros países – havia uma razoável relação entre orientação estética e ideologia, nem sempre muito profunda. A situação é bem mais complexa…, aquele senhor um pouco ingênuo, Anatole Kopp, ficava sofrendo por que o Modernismo não era mais de esquerda [10]. Um dos conteúdos do Modernismo é uma posição ideológica, um discurso social – social num sentido anti-democrático, muito autoritário, mas enfim… – que acabou dando uma conotação de que ela era coisa de comunista. Nós temos uma ditadura anti-comunista a partir de 1964, e os principais nomes da arquitetura brasileira são homens – pelo menos nas palavras – de esquerda. Os dois principais, membros de carteirinha do Partido Comunista. Naquele momento, a crítica ao Modernismo significava uma postura de direita, era fazer o jogo da ditadura. Ao se fazer alguma análise crítica da Arquitetura Moderna estava-se indiretamente criticando Oscar e Artigas, estava-se enfraquecendo os dois comunistas pilares da arquitetura brasileira, portanto estava-se sendo reacionário. Devemos levar em consideração também este contexto político reforçando o apego ao Modernismo entre nós e que retardaria a crítica, retardaria a tal ponto que ela não vai existir: quando ela começa a se articular, ela já está superada, os Estados Unidos e a Europa já estão noutra.

Insisto: nestes comentários sempre estou separando um contexto europeu de um contexto anglo-americano. A Inglaterra e os Estados Unidos funcionam numa outra lógica, que é muito diferente da lógica européia, e os seus mundos profissionais têm outro perfil. Ser arquiteto na Inglaterra não é exatamente ser arquiteto em Barcelona ou Paris. A construção de uma cultura arquitetônica [11] é extremamente sofisticada no caso inglês e americano. No caso europeu, vamos falar de latino-europeu como França, Itália, Espanha, já não é bem assim, ainda que a Itália surpreenda…

A Inglaterra é um outro mundo: ela foi um dos últimos países a entrar no Modernismo. Na verdade, eles nem precisavam do Modernismo. Se você aceitar a análise do Pevsner [12], o Modernismo surge no continente por influência da arquitetura residencial inglesa – continente é a Europa…, o outro lado do canal. Então os ingleses vão entrar no moderno nas décadas de quarenta, cinqüenta, quando nós já estamos exportando Arquitetura Moderna. Essas nuances são muito importantes. No caso da Espanha, não podemos considerar tudo junto: temos que separar a Catalunha de Castela, ou seja, de Madri. Na Catalunha o moderno entra tardiamente, devido a um nacionalismo forte, às tradições locais…

Essa cultura arquitetônica, entre nós, acaba ficando reduzida a conhecer bem a obra do Niemeyer, do Artigas, do Paulinho, do Lelé… Há quem goste do Joaquim Guedes – eu, inclusive -, e tem a turma de admiradores da Lina. De um arquiteto requintado, que tem uma obra maravilhosa, nunca se fala: o Eduardo de Almeida. Alguém vai falar do Eduardo de Almeida [13]? “Não tem importância…” Pior, um Pedro Paulo de Mello Saraiva, arquiteto talentosíssimo, e ninguém nunca ouviu falar dele, não há trabalhos acadêmicos sobre ele. Então até o entendimento do que deva ser incluído em nossa cultura arquitetônica é muito restrito.

Diversas correntes pós-modernas, incluindo o pensamento de Robert Venturi, estabeleciam uma ponte direta entre aquela arquitetura e outras de cunho maneirista. Você não acredita que no Brasil, e mesmo nos EUA, a apropriação do Movimento Moderno sempre foi feita como um meta-discurso amaneirado similar?

Atenção, esta é a minha leitura do Venturi, outros podem discordar… Em primeiro lugar, estamos usando o termo Maneirismo de forma anacrônica. Quando nós usamos o termo, é com o sentido dado a ele pelo Hauser [14]. O Hauser é quem colocou esta questão do Maneirismo e vai interpretar o Michelangelo, o Palladio, o Serlio segundo esta ótica. Ao cabo, a alta Renascença já como manifestação maneirista, lá no sentido dele, como uma arquitetura que se baseia no clássico e viaja, vamos dizer assim. Ela viaja em cima de uma linguagem clássica. Então nós estamos usando um termo anacrônico: eu estava falando do Maneirismo aplicado à arquitetura contemporânea. Mas aceitemos o anacronismo.

Você vai ter sempre um fenômeno maneirista, na medida em que um determinado vocabulário é aceito como correto. E se um arquiteto trabalha em cima dele, é lógico que começa a retorcer para cá e retorcer para lá. E retorcer é uma boa palavra, porque lembra aquela coluna salomônica de Bernini, em São Pedro. Pega-se uma coluna e retorce a coluna, dá uma torcida como se fosse um pano. Uma linguagem, uma vez difundida, uns estão querendo usá-la “certinho” e não entenderam muito bem como se faz, e dá um maneirismo de um jeito. Outros estão entendendo muito bem, mas vão forçando tanto aquela barra…, dá um maneirismo de outro tipo.

Artigas é claramente maneirista. Mais até que o Niemeyer, na minha interpretação. Artigas faz um blend de Brutalismo com Frank Lloyd Wright – e vou longe na minha opinião, porque não tenho a menor dúvida da presença permanente do Wright na obra do Artigas. Você vai ver o Maneirismo nas colunas do Artigas. São variações de temas wrightianos executados em concreto armado.

Em fins da década de setenta, se Marlene e eu [15] dissemos alguma coisa interessante, ou surpreendente, foi esta questão de uma certa regionalização que já era possível observar naquele momento – não sei se é bem verdade hoje, isto desembocaria em uma outra discussão, mas naquele momento dava pra sentir – uma arquitetura própria em Pernambuco, moderna porém com certas características, a de Brasília, no Sul… e assim por diante. Dava pra sentir uma regionalização em curso. Nós pelo menos achávamos e interpretamos assim.

No caso norte-americano, sempre a coisa é, em certo sentido, muito mais rica. Entender esta regionalização, voltando aos Estados Unidos, exige que olhemos muito mais para trás: temos que percorrer toda uma tradição de arquitetura americana no século XIX, e muito regionalizada. Não regionalizada simples, mas tem uma arquitetura da Costa Oeste, tem uma arquitetura da Costa Leste – quando falo Costa Leste estou pensando em New England, em Nova York, em New Jersey -, mas tem também uma arquitetura sulista na Costa Leste. E tem Filadélfia, tem o Midwest… Cada região com o seu ensino diferenciado, uma vez que não há uma regulamentação profissional unificada para todo o país, como acontece aqui. Lá, tais distinções são ainda reforçadas por questões de técnica construtiva. Nós somos muito mais homogêneos, em termos de técnica construtiva, do que os Estados Unidos, digamos, ao longo do século XIX. Para nós é alvenaria – superadas as taipas etc… Nos Estados Unidos, vamos encontrar muito mais variedade de materiais e de sistemas construtivos, e a madeira por todo lado. Mas não só a madeira: a construção deles é mais complexa.

Em seu artigo, é apontada a autonomia do desenho como objeto de arquitetura. Você acredita que o desenho é, inexoravelmente, um caminho obrigatório para a extração de mais-valia?

Isto quem disse é Sérgio Ferro [16] [risos]. Nunca afirmei o mesmo…, ainda que ache uma proposição muito fecunda e que me influenciou muito!

Sem dúvida, o desenho faz parte do processo da produção no campo da construção. Quer dizer, há uma atividade econômica da qual um projeto é parte integrante do processo produtivo. Que isso não me leva a nenhum desespero em termos de mais-valia, é outra coisa. Este era um desespero que podia bater na gente nas décadas de sessenta ou setenta. Acho que hoje, na primeira década do novo milênio, tentar reduzir o processo produtivo à extração da mais-valia é muito ingênuo. É não entender a economia contemporânea, o crescimento exponencial das atividades de serviço. É não entender, por exemplo, que, nas condições urbanas atuais, você ser operário da construção é uma excelente posição na vida. É muito pior ser flanelinha…

Então, esta birra com a mais-valia, pra mim – usando uma palavra do Sérgio – é um fetiche da esquerda na década de sessenta, que hoje teria que ser processada noutros termos. Naquele tempo, a mais-valia era uma espécie de pecado capital, melhor dizendo, capitalista. Evidentemente, a questão da exploração do trabalho está aí. Não vou discutir que o trabalho manual é explorado, as desigualdades sociais estão grotescamente aí, os privilégios de classe são acachapantes… Não estou negando nada disso, porque continuo sendo de esquerda. O que não quer dizer que hoje seja marxista e, menos ainda – o que o Sérgio também nunca foi, mas outros foram e ainda são -, stalinista.

Mas sem dúvida entendo que o desenho, o projeto arquitetônico, é parte de uma mercadoria chamada prédio, o que não me incomoda en lo más mínimo. Mesmo porque, para fazer um automóvel é preciso um desenho, para fazer uma garrafinha industrialmente é preciso um desenho. Ou seja: certas coisas – quase tudo -, para serem produzidas, têm que ser desenhadas, principalmente na produção industrial. A arquitetura tem outras características e problemas próprios. Ela não é industrial, no sentido fabuloso do termo, mas evidentemente ela é grande e vai ser difícil construir um objeto grande sem ter um mínimo de parâmetros. Catedrais eram desenhadas, só que a gente esquece porque não eram desenhadas em um pedacinho de papel, mas eram desenhadas no chão: o desenho era em escala 1:1. Não tenho a menor dúvida que o desenho fazia parte do processo naquela época.

É tão simples! O projeto arquitetônico faz parte de um processo de produção. E como o mundo é capitalista, está na produção capitalista. E também não tolero essa coisa: “Ah isso é coisa da especulação imobiliária…“. Se você tem uma fábrica de sapatos, ninguém espera de você que venda o seu sapato sem lucro. Porque é que vou esperar que alguém que construiu um prédio tenha que vender o seu prédio sem lucro? Isso é fantasia esquerdista simplória: marxismo do mais primitivo e primário – nem é marxismo. Este vínculo, para mim, entre projeto e produção de edifícios, o tempo presente é o tempo da produção e a produção é capitalista, é econômica, e a construção faz parte do sistema.

Quanto à questão da autonomia do desenho… Esse artigo, o Anotações…, ele foi escrito em cima da minha experiência, da minha vivência do Pós-Modernismo, porque morava nos Estados Unidos naquela época. Na década de setenta eu estava lá, estava estudando em Nova York. E via o que o Philip Johnson, e antes do Philip Johnson, o Michael Graves, o [Peter] Eisenman e todos os outros, o [Robert] Stern, estavam fazendo. E ia a exposições de desenhos de arquitetura.

No Modernismo a postura era: o desenho faz parte do processo de projeto, o cara faz os seus rabiscos, os seus esquisses, os seus croquis… Faz parte do seu processo de concepção, que depois vira o detalhamento de um projeto, a partir do qual um prédio vai ser construído. Havia uma espécie de puritanismo em relação ao desenho, e eram desenhos puristas também: puritanos e puristas. É só traço. Ninguém mostra a textura, não se usa cor… Há como que um desprezo pelo rendering.

Rendering hoje é uma palavra que todos vocês usam, mas que, há vinte anos, ninguém sabia o que queria dizer aqui no Brasil. Com o computador entrou o rendering, mas rendering é uma palavra inglesa que, no fundo, quer dizer a rendição: como é que você rende o desenho, como é que você expõe o projeto, a sua exposição. Rendering é uma palavra de etimologia latina, mas é um termo anglo-americano: no fundo é o desenho de apresentação. E a tradição do desenho de apresentação vem da academia francesa. Vem da Beaux-Arts, onde era exigida a habilidade na representação do prédio que ainda não existe, aquela elegância toda, os guaches, as sépias, os nanquins, as aguadas…

Tal tradição se sofistica do século XVII em diante, arrebenta no século XIX e, com o Modernismo meio que desaparece, ou melhor, é escamoteada, fica envergonhada, cheia de pudores. É lógico que hoje é valorizado um croquis do Corbu, um croquis do Mies etc., eles até têm preço no mercado de arte, mas sua qualidade artística – ao menos oficialmente – não era a preocupação central.

No bojo do Pós-Modernismo, voltou à moda um certo “renderismo“. Antes, no quadro do Modernismo, o máximo de renderismo que havia eram aquelas perspectivas de concurso. Era uma falta de talento só: uma perspectiva onde aparecem umas pessoas ali no primeiro plano, umas árvores, raramente cor, tudo no preto-e-branco – um pouco determinado também pela heliográfica, pelas técnicas de reprodução da época, não só pela estética. Entre parênteses, hoje, com a impressão a cores tão barata e acessível com uma simples impressora doméstica, tudo isto parece arcaico!

Mas voltando… Na década de setenta começa o retorno ao renderismo, ao belo desenho: pastel, lápis de cor, papéis sofisticados… O que dava para perceber em Nova York naquele momento é o retorno à valorização do desenho de arquitetura. Eu me lembro de várias exposições importantes, em lugares importantes – no MoMA, na Castelli, no Museum of Design, lugares assim -, de desenhos de arquitetura, algo que fazia muito tinha desaparecido. Você via exposições de arquitetura com fotos, com maquetes. Como a exposição do International Style [17], não tem desenho, no máximo plantas e cortes. Daí falar no desenho de arquitetura como atividade autônoma. Não estou falando aqui de arquitetura utópica, de bolar projetos na cabeça – a la Archigram -, não estou falando disso: estou falando de rendering. Arquitetura utópica é outra coisa, vem de uma tradição a la Boullé ou Piranesi, uma arquitetura da fantasia.

Mas você não acha que, talvez, essa cultura esteja no bojo de uma arquitetura que se basta só pelo rendering, sem compromisso nenhum com construtividade? Por exemplo: Daniel Libeskind…

Ah sim! Vai desembocar também em: “O desenho é bonito, vai dar boa arquitetura“, o que é falso, puro wishful thinking. O bom desenho não dá necessariamente em bom prédio. Taí a obra recente do Niemeyer para demonstrar: o desenho pode ser até bacaninha, uma vez executado é apavorante.

O que quero dizer é o seguinte: na década de setenta há um retorno ao valor do desenho arquitetônico. Posso lhe mostrar alguns desenhos da Beaux-arts, os desenhos do Grand Prix, o top do rendering francês e você vai entender do que estou falando. Quando o desenho é bom na aparência!! O Griffin ganhou o concurso do plano urbanístico pra Canberra [1911] no berro: ganhou o concurso do plano de uma cidade toda graças a um desenho bonito. Ele nunca tinha projetado uma cidade, não entendia nada de cidade, mas desenhava… O plano é ruim, está lá, vá olhar a cidade que resultou. O Plano Piloto está ótimo perto daquilo, é muito mais realista como cidade. Agora, eu vi o desenho, é imenso o desenho. É deslumbrante o desenho! É uma obra de arte, você quer botar na tua sala e ficar olhando! E não é por acaso, o Griffin foi um dos melhores renderistas do Wright. E renderista o Wright sabia escolher, nossa, cada desenho, um mais lindo do que o outro!

Esta autonomia do desenho de arquitetura sempre existiu. Não é novidade, particularmente no contexto da academia onde se exige habilidade no desenho. O Carlos Lemos descreve como, no Mackenzie, ele foi aluno do Christiano Stockler das Neves – que era um arquiteto acadêmico -, e que era desenho, desenho e desenho: desenho de manhã, desenho à tarde e desenho à noite. Este pessoal do Mackenzie tem uma habilidade no desenho. Isso explica a qualidade compositiva do Paulo Mendes da Rocha. Nunca esqueça a formação acadêmica que ele teve como mackenzista. O Pedro Paulo [de Mello Saraiva] desenhava coluna grega, ele que me contou. Eles tinham aulas de composição – e exercícios daquilo que se chamava “arquitetura analítica”, ou seja, o estudo dos elementos compositivos – que os seus contemporâneos na FAU/USP não tinham. Em função da pedagogia acadêmica do Stockler das Neves: desenho, desenho e desenho. É aquarela, nanquim, guache…  E tudo no canson, que é um papel chato pra se desenhar…

E a valorização do desenho arquitetônico reapareceu a partir de então. O sujeito não só está fazendo um desenho para ganhar um concurso, ou não só fazendo um desenho para convencer um cliente, mas está produzindo algo que lá na frente, inclusive, vai ter valor no mercado de arte, se for um belo desenho.

O Anotações… é de 1982, 1983, foi escrito em cima do que acontecia no milieu entre 1970 e 1980. E que, de lá pra cá, só se reforçou. E hoje temos um novo meio de representação, que é o computador. Tem quem faz um desenho mais bonito do que outros no mesmo computador, assim como tinha um sujeito que era bom na aguada, outro que era bom no guache, hoje tem o sujeito que é o bom no Paint, no Corel etc. – não conheço bem esses programas porque não é a minha praia. Você pode mudar o quanto quiser o instrumento: tem uns que dominam o novo instrumento melhor que outros. E não dá para pensar em projeto arquitetônico sem considerar os meios de representação. Como afirma o Corona [18], projeto tem mais a ver com a representação do que com a construção… Fechando a tua questão: pros arquitetos, rendering é bem mais importante do que construtividade na hora em que estão projetando, ainda que esta seja uma constatação dolorida de se fazer…

Sob este aspecto, o Modernismo é muito enganador, o desenho modernista dá a impressão que a solução arquitetônica é fruto de necessidades construtivas, da tal construtividade a que você se refere. Ele é feito a lápis ou a nanquim em um papel branco; os modernistas adoram uma perspectiva axonométrica, um desenho esquemático, um desenho de máquina – a axonométrica é um desenho de máquina por excelência. Tudo isto dá um sabor técnico ao desenho, e nos convence que a solução arquitetônica também foi alcançada por razões técnicas!

E assim, fica fácil fazer o link entre o campo artístico e arquitetura, ainda que não se esgotem aqui outras dimensões de análise possíveis no caso da arquitetura, inclusive a dimensão técnica, construtiva propriamente. As diferentes formas de representação arquitetônica assimilam técnicas advindas das artes gráficas, particularmente do pessoal das artes gráficas. Veja um Archigram, mesmo o Koolhaas que começa desenhando, ele tem desenhos famosos na década de sessenta, antes de ter se metido a projetar prédios. Os mundos não são estanques. Uma estética que se difunde no campo das artes gráficas, que aparece nas publicações, nos impressos etc., contamina o desenho de arquitetura. Contamina não no sentido negativo do termo. Igual estas brincadeiras que se faz no computador, com recursos de efeitos especiais do cinema – é lógico que estão influenciando toda a produção das artes gráficas, da pintura e do desenho. E vice-versa, porque esta contaminação é permanente e de mão dupla. E obviamente certas modalidades, ou certas liberdades de linguagem, que aparecem num campo, vão correr pra outros, vão influenciar outros. O Corbusier não fazia desenhos com letras de chapinha? Agora chama stencil, mas na época era um meio muito prático, muito expedito na hora de se fazer um cartaz, um aviso, escrever algo no capricho. Depois veio o normógrafo, e depois a Letraset. Hoje vamos pro computador e escolhemos as letras. Tem milhares de tipos à disposição – o que aliás explica muito do mau gosto em comunicação visual, porque há um universo imenso de tipos e as pessoas escolhem de qualquer jeito. E tudo isto tem a ver com o que está ocorrendo na estética arquitetônica, gostemos ou não…

Algumas correntes pós-modernas apoiaram-se na codificação e uso sistemático de valores formais históricos que se acreditavam serem atemporais. Você acredita que é possível ainda hoje a crença nesse tipo de valor? Qual a validade da teoria tipológica de Aldo Rossi hoje?

No caso do Rossi, a situação é irônica – o Pós-Modernismo valoriza a ironia e eu gosto da ironia. O Aldo Rossi estava bebendo na tradição italiana, ele ao fazer uma arquitetura de sabor clássico, ele está sendo nativista. Igualzinho o Lúcio Costa está sendo nativista ao botar uma cobertura com telha canal e um muxarabi estilizado. Ele não é nativista? O Rossi também: ele está inserido na tradição lá dele. Acho a arquitetura do Rossi uma forçação de barra. Ele faz aquele cemitério lá em Modena [19] e diz que se inspirou na arquitetura vernácula da região -, porém não tem nada a ver com a arquitetura de lá. Esta mais para o Classicismo simplificado de um [Marcello] Piacentini. Aliás, o Mario Botta é outro que diz se inspirar no vernáculo, mas nunca consegui encontrar o vernáculo no qual ele se inspirou. Seria o Corbusier que teria aberto esta picada na década de trinta, que na obra dele alcança o apogeu com Ronchamp, segundo o Frampton [20].

No caso de Ronchamp dá até para perceber certas ligações, mas na obra do Botta com o vernáculo da Suíça italiana, tenho grandes dificuldades. E no caso do Rossi, ele faz muito mais uma espécie de neo-racionalismo, ou neo-neo-racionalismo italiano, ou, para cunhar uma outra expressão mais estrambótica, um hiper-neo-racionalismo. Aquele cemitério é racionalista, mais do que neo-clássico. O fato é que não tenho muita simpatia pela arquitetura dele… Excepcionalmente eu gosto do Rossi, gosto daquele teatrinho que não sobreviveu lá em Veneza [21]. É light, é delicado, é alegre, tem algo de desenho animado… É simpático, a arquitetura pop é sempre simpática. Mas tem um prédio dele em Paris que é detestável, e aquele cemitério então, a gente fica até com medo de morrer.

A questão do historicismo, no Brasil, ficava muito difícil para os arquitetos entenderem, e a reação dos arquitetos foi: “Oh! que barbaridade! Ecletismo!” Lembro de quando publiquei o Anotações…, fui convidada para dar uma palestra sobre Pós-Modernismo na FAU/USP. E estavam lá todos os professores, os meus ex-professores. Um deles, muito querido, falou assim: “Isso é arquitetura? Isso parece aqueles túmulos do cemitério da Consolação.” É tão arraigado o gosto modernista, a estética modernista, nesta geração – estou falando da geração que tem quinze ou vinte anos mais do que eu -, que qualquer coisa que fugisse dele era detestável. Me lembro de uma reação semelhante de um amigo meu, quando lhe mostrei um livro sobre o Norman Rockwell: “Mas isto? Isto é uma porcaria!” Tudo porque era figurativo, naturalista… Se o maior ilustrador americano é uma porcaria, sei lá o que é que é bom, amo o Rockwell!

Aliás, das bobagens que são ditas sobre o Pós-Modernismo, a que mais me irrita é: “Ah! É um Ecletismo…“, isto dito em tom de desprezo. O Ecletismo é uma arquitetura riquíssima, um dos momentos mais fecundos em toda a história da arquitetura: é fascinante quando se começa a entender a sutileza das diversas tendências neo-góticas inglesas ou a variedade dos classicismos! É um mundo complexo e sutil: tem várias tendências, correntes, e além do mais o produto final é maravilhoso; os melhores exemplos de qualidade construtiva, de inventividade construtiva, vamos encontrar justamente na arquitetura eclética.

Voltando ao historicismo pós-moderno, em primeiro lugar, ele tem seus contextos próprios. Se você considerar, por exemplo, um [Carlo] Scarpa. Ele é chiquetésimo e sabe como fazer a sua interpretação historicista. Ele está num contexto italiano, e ser historicista na Itália é absolutamente óbvio: por onde você olhar, você está com a história no seu nariz. O nosso caso, de país de passado colonial, de rejeição das raízes portuguesas – não no século XX, mas no século XIX -, tudo em nossa interpretação de nosso passado faz com que uma vertente historicista fique muito difícil de digerir. Mas para um inglês, que nunca teve que brigar com seu passado, para um americano que tem um futuro imperial, para um italiano que nunca saiu dessa tradição, não é tão esdrúxulo quanto ela pode parecer para nós.

Todo o mundo achou normal que, para fazer arquitetura brasileira, tenhamos importado um modelo corbusiano, fazendo simultaneamente um discurso nacionalista, como se não houvesse contradição alguma. O nacionalismo conseguiu ser blended, se misturar de um modo completamente esdrúxulo com a importação de um estilo internacional, que de fato era europeu. Tal nonchalance ideológica não seria aceita na Catalunha: lá o discurso nacionalista vai dar um Gaudí, um Berenguer. Vai dar não só Gaudí, um ou outro arquiteto, vai dar toda uma escola preocupada em recuperar tradições construtivas catalãs. Tradições tão efetivas que foram exportadas até para Nova York. Dê uma olhada no primeiro subsolo da Grand Station, lá onde fica o Oyster Bar, ou na cúpula de St. John the Divine, e você verá abóbadas de ladrilho típicas da Catalunha.

Para nós não vai dar – a não ser nos melhores momentos do Lucio Costa, quando temos um certo gênero de nativismo. Por sinal, tem uma vertente nativista na arquitetura brasileira muito mal-estudada – e quando estudada é torta porque os estudos são ruins. Você percebe esta tensão na década de quarenta: “Eu sou nacionalista e como é que estou importando modelito?” Veja o próprio Oswald de Andrade; veja o texto brilhante do Mário de Andrade, de 1944 [22], onde ele arrebenta fazendo a crítica da Semana de 22: resumidamente, estávamos nós ignorando o Brasil e querendo ser europeus!

Eu, pessoalmente, acho muito esdrúxulo o historicismo que já não é historicismo. Michael Graves vai lá e faz um historicismo em cima da tradição arquitetônica americana. Aí aquilo vira um cacoete, e aí tout le monde – inclusive os pós-modernos brasileiros – repetem o cacoete do Michael Graves. Ele usou aqueles elementos históricos, absolutamente amarrados naquela situação. De repente passa a ser uma solução tipo templo grego – o que chamo o “efeito templo grego“. No Brasil, particularmente em Belo Horizonte, encontra-se Graves pra lá e pra cá. Mas aí já não é mais historicismo, é o pastiche de um arquiteto que fez uma obra historicista. Então tem nuances aí das mais variadas. Acho triste que aqui não tenhamos partido para uma certa tradição historicista em termos de arquitetura brasileira, que seria bastante fecunda. O Neocolonial brasileiro tem momentos maravilhosos, tem uma arquitetura incrível. Tanto aquele mais chão, mas basicamente construtivo a la Lúcio Costa, quanto um Ernesto Becker, um Ferrucio Pinotti. Enfim: estes caras dominavam a linguagem que estavam usando, lá na década de vinte iam a Ouro Preto para ver arquitetura – e olha que não era uma viagenzinha fácil, até a esquina. Conheciam arquitetura colonial muito bem, e faziam aquela arquitetura meio pastiche, bem mais legítima. Ou então, num extremo mais sofisticado, o  [Victor] Dubugras, cujo Neocolonial é uma reinterpretação, uma reinvenção do colonial. Ainda que não devamos esquecer que livros eram publicados com motivos coloniais, do Ranzini, do Amadeu de Barros Saraiva, do Watsh Rodrigues, pra quem quisesse fazer colonial sem ter que ir atrás do original…

E pra nós o Pós-Modernismo poderia ter trazido este gênero de liberação, que é uma das questões que coloco no meu texto e que é central, sem dúvida, na década de setenta. A opção pós-modernista foi um “Ufa! Que bom, chega dessa chatice de Modernismo!“, o que é mais ou menos a mesma coisa que o “Less is a bore“, do Venturi. Saiu-se daquelas cadeias, daquelas amarras do Modernismo, e se deu espaço para, por exemplo, uma brincadeira como a Praça Itália, do [Charles] Moore. E deu lugar para uma coisa horrorosa como o prédio da AT&T, do Philip Johnson – era horroroso no desenho e ao vivo e a cores é pior; é um desastre, Nova York não merece aquilo, Nova York tem arranha-céus belíssimos. Então um espaço para um historicismo criativo, no Brasil isto definitivamente não aconteceu. Tem um exemplo aqui e acolá, como o Elvin Dubugras em Brasília, o Éolo Maia, o Podestá, o Gustavo [Penna] em Belô, mas não seriam os únicos, tem outros.

Outra coisa, no caso também do historicismo. Quando falo em historicismo, não estou pensando só necessariamente em Classicismo. Por exemplo: toda a tradição Art-Déco. É uma arquitetura maravilhosa, é uma arquitetura – para usar o termo elegante – tectônica. Se, como eu, você é chegado numa construção, numa qualidade construtiva, numa qualidade de detalhamento, nada bate o Art-Déco. O Art-Déco é deslumbrante: vá para Paris, vá para Nova York, para Londres ou Los Angeles, mesmo o Rio de Janeiro, é granito, é mármore, é bronze, é todo tipo de esmaltes, de ladrilhos, só materiais preciosos – não Miami, lá tudo é feito no estuque. Um Chrysler arrasa: sabe lá o que é um prédio revestido de aço inox na década de vinte? Toda esta qualidade construtiva do Art-Déco foi esquecida. E, no entanto, poderia inspirar uma produção arquitetônica contemporânea muito rica. Quando aparece entre nós, é o pastiche do pastiche. O Michael Graves faz um arco assim, assim, você vai a São Paulo e encontra a mesma coisa. Aí é o amaneirado. Assim como há um moderno amaneirado, há também um pós-moderno amaneirado…

E as características que não necessariamente se aplicam a historicismo, as características atemporais presentes na arquitetura de Pei, ou mesmo de Oscar Niemeyer em Brasília? Questões de simetria, ritmo, axialidade, características psicofísicas… Estas coisas começaram a ser recodificadas, depois da Arquitetura Moderna, a partir desse pessoal dos anos setenta, oitenta, Charles Moore [23] etc. A pergunta é: você acha que tal arquitetura realmente é atemporal?

Não. Como historiadora, não posso achar nada atemporal. Acho muito difícil conceituar esta categoria, apesar de usá-la no artigo – mas uso ironicamente, aliás aquele artigo tá cheio de ironia, de gozação mesmo… Mas o “atemporal“, “o homem“, “o ser humano e sua alma imaterial e eterna“… Tal atemporalidade é difícil de entender. É uma metafísica que não faz a minha cabeça. O que ocorreu é que com o Pós-Modernismo determinados recursos de composição arquitetônica voltaram. Recursos de composição arquitetônica que não tinham sido abandonados, mas tinham sido disfarçados. O Sr. Le Corbusier fala em traçados reguladores [24], mas não se dá ao trabalho de informar seus leitores de que se trata de um recurso acadêmico par excellence, como diria um francês…

O emprego dos traçados reguladores é uma disciplina acadêmica por excelência – a expressão tracé regulateur faz parte do jargão acadêmico. Com o Pós-Modernismo, todos aqueles esquecidos exercícios de composição are out-of-the-closet. Os arquitetos modernos usavam aqueles truques todos de composição, os tais traçados reguladores, mas não assumiam. Com o Pós-Modernismo, it´s out-of-the-closet. Se você olhar, por exemplo, para a arquitetura do Paulo Mendes da Rocha com este viés, vai ver a permanência da formação acadêmica que ele recebeu. Na década de cinqüenta o Mackenzie é acadêmico. Mais acadêmico que o Mackenzie então só Paris, onde o academismo só é definitivamente revogado em maio de 1968. Um dos motores do movimento estudantil francês foi a Escola de Arquitetura que estava pelas tampas de ensino acadêmico. Os estudantes queriam Arquitetura Moderna – igualzinho ao que aconteceu no Rio na década de vinte, imagine só! -, porém o ensino era acadêmico. Eles faziam Arquitetura Moderna porém dentro das regras de composição acadêmica. E no Mackenzie, tal situação perdura até 1956, 1957; lá esse ensino continuava em vigor.

Mas de repente está todo o mundo out-of-the-closet, assumidamente compondo na regra acadêmica. Sobre isto eu escrevi bastante, mas faz mais de vinte anos… Tem o Ensino, documentação e pesquisa [25]. Tem O ensino da construção no domínio da arquitetura [26], onde inverto a questão. Todo o mundo pensa que a engenharia manda e os arquitetos correm atrás. Não: existe uma situação oposta em que as regras da arquitetura ditam a direção das decisões construtivas. Está aí o uso do concreto, estas bobagens todas que se faz de concreto. É a arquitetura mandando, porque o bom senso não faria aquilo de concreto. Tanta coisa em que uma alvenaria cairia tão melhor…

Bom, mas não entendo de crença ou descrença, de temporalidades e atemporalidades, porque isso é muito subjetivo. O que sei, claramente, é que os truques de composição são imbatíveis. Vale a pena ler o livro do [Alfonso] Corona – Ensaio sobre o projeto [27]. A discussão do Corona serve bem para responder à questão tipológica. Segundo ele, teríamos dois caminhos para o projeto arquitetônico: ou a composição – acadêmica – ou a tipologia – também acadêmica. Não adianta: ensino de projeto é sempre a mesma coisa. Muda o vocabulário, muda se é no nanquim ou se é no computador etc., mas ou se projeta com base na composição de elementos ou com motivos do uso – que seria o caminho tipológico. Não tem muito mais do que isso: muda o estilo, muda a linguagem, muda a função, muda o uso, mas os procedimentos para projetar não têm muita variação, não dá pra ir muito além disso. E, hoje, com o computador, talvez o projeto não seja mais feito nem tipologicamente, nem compositivamente.

Para além das discussões baseadas no significado e no entendimento da arquitetura como linguagem, você vê algum indício de complexidade e contradição na arquitetura contemporânea? Quais são os exemplos?

Entender a arquitetura como linguagem é um instrumento didático extremamente útil, que uso muito em sala de aula, o que não quer dizer que devamos reduzir a arquitetura a ela. Uma leiturinha tipo Linguagem clássica da arquitetura, do Summerson [28], é excelente. Pelo menos quando li pela primeira vez, foi emocionante, ele fez a minha cabeça. Foi ótimo, foi útil, foi maravilhoso, agora nem o Summerson se reduz àquele livro, nem a arquitetura se reduz à linguagem. Aliás, o Summerson é o primeiro a saber disso, porque se tem um ensaísta de arquitetura brilhante é ele – todo o mundo lê o Linguagem clássica e não lê o resto.

Então é um dos instrumentos de análise, de compreensão. Não resolve tudo, assim como não se resolve tudo com matemática, não se resolve tudo recorrendo à linguagem. Agora, é bom para um crítico de arquitetura, para um arquiteto, ter domínio sobre este vocabulário, trabalhar com esta ferramenta. Se a gente espera que um poeta tenha domínio das palavras, nós temos que ter um certo domínio de nossos elementos de arquitetura e de composição.

Quanto a este negócio de complexidade e contradição, é uma expressão do Venturi, não é uma preocupação minha. Vejo complexidade e contradição em qualquer coisa. O mundo está cheio de complexidades e contradições, as pessoas são complexas e contraditórias… Um microorganismo é complexo pra caramba!! Esta pergunta eu não sei responder, não. Os exemplos seriam infinitos, estão em toda parte!

É possível falar de uma revalidação crítica atual dos princípios modernos ou o que vemos hoje é apenas mais uma vertente estetizante esotérica pós-moderna? É possível ainda hoje se falar em proposta de uma nova ordem social através de arquitetura?

Não e não.

Consideremos o período áureo do movimento moderno – o europeu é a década de vinte, ou melhor a longa década de vinte, de 1918 a 1933. Maravilha, aquela arquitetura é tão interessante. Vou ao cinema e vejo um filme da década de vinte, é fantástico, de tanta qualidade quanto a arquitetura daquele período. So what? Acho que os arquitetos têm o hábito de isolar a arquitetura do resto. Eles pensam que, quando estão produzindo arquitetura, a estética arquitetônica é autônoma do que está acontecendo no cinema, nas artes plásticas, nas artes gráficas, no teatro, na cenografia, até na música, onde você quiser. Fica parecendo que a arquitetura tem uma lógica própria e o resto do mundo desaparece.

A moda, por exemplo, a moda é criativa. A coleção de inverno que sai de Paris… É belíssima. Hoje, tudo na moda é precioso, bordados, brilhos, dourados, tecidos metalizados… Porque é que a arquitetura não pode acompanhar isto? Se há certas tendências que estão pegando no gosto, a arquitetura é igual. A atemporalidade da arquitetura é de outra ordem. A atemporalidade da arquitetura – e aí ela se difere do resto e o termo atemporal é interessante – é que um prédio fica, o objeto arquitetônico tem uma permanência muito grande. Comprei um objeto de uso e não gostei, compro outro. Vi um mais bonito, compro o mais bonito e deixo de escanteio o outro. Quando falamos de arquitetura, não estamos falando de um objeto tão facilmente descartável, porque o custo do descarte é muito alto. Ninguém sai descartando arquitetura por moda. Você descarta uma roupa por moda, você descarta um sapato, uma bolsa, até um eletrodoméstico, mas não um prédio.

Estou pensando na questão do vínculo da arquitetura com o momento da sua concepção. Esse vínculo com o momento da sua concepção, no caso da arquitetura é diferente do que acontece em outros campos. Por que no caso de uma roupa, é muito amarrado. Vejo um vestido da década de vinte e vejo um retrô década de vinte, sei qual é o da década de vinte, sei qual é o da década de noventa. Vejo um móvel dos anos cinqüenta e vejo um fake estilo Memphis, sei qual é o dos anos cinqüenta e qual é o fake. No caso da arquitetura, ela tem uma permanência muito grande, você não sai demolindo as coisas… Então, toda a lógica, em termos estéticos, estilísticos, que presidiu a concepção daquele prédio pode estar totalmente superada, e o prédio continua em excelente estado de conservação e sendo muito bem utilizado.

Costumo colocar um paradoxo para os meus alunos: qual a cidade mais moderna – moderna no sentido amplo, contemporânea, equipada de forma atualizada – Paris ou Brasília? Paris tem formação romana, Brasília comemora o seu aniversariozinho de nascimento de quarenta e tantos anos.  Mas qual é mais moderna? Paris. Sistema viário, transporte de massa, redes de fibra ótica… Você entra num prédio antigo: o Louvre. Ele é antigo por fora, mas está equipadíssimo com o que há de mais moderno em termos de prevenção de incêndio, de controle ambiental, de luz, de temperatura, de umidade, ele é avançadíssimo, é sofisticadíssimo tecnologicamente. Não é preciso demolir o Louvre e substituí-lo por um prédio contemporâneo para se ter o que há de mais avançado.

Está aí uma coisa que acho que os arquitetos não aproveitam como poderiam: tem o retrofit, tem o refacing… Não é preciso demolir um prédio: pode-se dar um upgrade em um prédio antiquérrimo, e ele continua sendo ótimo para ser museu. E, talvez, se você construir um prédio novinho em folha para ser museu, ele não seja nem tão bom espacialmente para museu, como não vai ser tão bom dar um upgrade nele no futuro. É muito difícil dar upgrade numa arquitetura moderna. Numa arquitetura antiga, convencional, é muito fácil. Pegue novamente Paris, ou qualquer cidade européia: não tinha encanamento e não tinha luz elétrica. Estão lá prédios velhíssimos de antes da água encanada, de antes da luz elétrica, que têm luz elétrica, água encanada, banheiro, elevador… Então não é uma boa demolir um prédio. Neste ponto, eu sou xiita como é a turma da ecologia quando se bole com as suas árvores e gralhas azuis…

As grandes demolições urbanas – o chamado urban renewal – tinham uma outra motivação. Acaba que você tem um prédio que vai permanecer, enquanto que o vestido não, porque não vou usar um vestido fora de moda ou porque o tecido puiu, lavou demais, desbotou, então será deixado de lado. O vínculo é diferente: esta é uma especificidade, no meu entender, da arquitetura, que faz com que tais questões do atemporal possam ser pensadas por aí.

Os princípios modernos estão aí. Você introduz coisas no mundo e elas ficam. Vai ter sempre alguém fazendo Modernismo. Alguém pode fazer Historicismo, Art-Déco ou não-sei-o-quê. Porque alguém não pode continuar fazendo Modernismo? Tem que entender que, no caso brasileiro, é mais simples, mais barato e mais eficiente fazer moderno. Os projetistas, os construtores e a mão-de-obra estão absolutamente treinados para fazer moderno, estão familiarizados com ele, então é muito eficiente. Estruturinha de concreto, laje de concreto e vedações de alvenaria: este é o sistema construtivo vernacular hoje no Brasil. A arquitetura vernácula brasileira é concreto e alvenaria. Pega uma foto de favela do Rio de Janeiro que você vai ver estrutura de concreto e alvenaria. Como ninguém na favela gasta dinheiro rebocando o exterior, você vê direitinho como foi feita a construção. É o sistema vernáculo. Qualquer mestre-de-obras sabe fazer uma laje, um pilar. Qualquer peão sabe levantar uma parede de alvenaria. Então, no caso brasileiro, tudo indica que esse moderno vai continuar por muito tempo. Não tem porquê ele ir embora. Nós temos que pensar arquitetura como uma coisa um pouquinho além desses projetinhos dos arquitetinhos.  Eu penso arquitetura como todo este universo construído, estes objetos grandes, imensos, que dá pra entrar dentro. A arquitetura é um objeto grande em que dá pra entrar dentro – uma definição simples e eficiente; não é a única, mas é útil de vez em quando.

Então não precisa nem de revalidação, no caso brasileiro. No meu entender a permanência está garantida, por um lado pelo prestígio permanente dos arquitetos de orientação moderna e, por outro, porque é o que se faz em toda esquina. A não ser que você seja muito rico e faça toda a sua casa de madeira, ou comece a meter umas estruturas metálicas. Mas o cotidiano funciona fora disso.

Isso qualificou o primeiro não. O segundo não, agora: nunca foi possível criar uma nova ordem pela arquitetura. Os arquitetos falavam, mas não quer dizer que era possível. É um discurso self-congratulating. É uma coisa que faz bem para o ego do indivíduo que fala: “Oh, a minha arquitetura é uma contribuição para a melhoria social…” Faz um bem pra consciência culpada… Mas realmente acho que nunca foi possível fazer isto. Aí é fundamental ler o Arquitetura nova, do Sérgio Ferro [29]. Então, para mim é uma bobagem:  por que um nova ordem social através da arquitetura, e não uma nova ordem social através da ginástica, ou uma nova ordem social através da agricultura, ou uma nova ordem social através da odontologia?

Eu faço esta pergunta porque existe uma corrente muito forte atualmente que procura trazer à tona, no Brasil, o pensamento situacionista. E uma das coisas que eles apregoam é que faz sentido voltar à idéia de objeto menos impositivo do ponto de vista do desenho, e aí eles se apropriam do pensamento de Sérgio Ferro também.

Gosto muito desta idéia: se você está fazendo uma arquitetura cívica em que o cara está gastando dinheiro para mostrar que é poderoso, ele não está querendo uma nova ordem social. Se eu quiser trabalhar com a Maria do Barro fazendo tijolo de solo-cimento e acho que estou contribuindo para o avanço social, tudo bem: isso existe. Mas fazer um discurso da arquitetura como motor de uma mudança social é jogo duro.

Se você quer contribuir para uma sociedade mais justa e cria uma instituição que dê abrigo a crianças abandonadas, isto é algo laudatório e que de fato contribui para a melhoria da vida de um montão de gente e tem todo o meu apoio. Agora, achar que fazer arquitetura cria uma nova ordem social é megalômano. O comunismo acabou e ficou todo o mundo órfão? Está órfão? Vai ser ambientalista então. Acho que isso é de uma megalomania…, é stalinista.

Por outro lado, se compreendi bem a questão, o teu situacionismo tem a ver com o local? Neste caso, é a tal questão do ajuste ao entorno? Bem, nisto os pós-modernos são imbatíveis. Ainda que a preocupação com o entorno, a qual não é uma má idéia, nem todo arquiteto tem que seguir. Um pouco naquela linha: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo.” Alguns arquitetos podem, o exemplo óbvio é o Niemeyer, que pode construir o que quiser até em área tombada. Já outros, obedecem, ou seja, se não respeitarem o entorno vão ser duramente criticados…

Ou ainda, o teu situacionismo se refere a uma arquitetura mais friendly em relação a quem constrói ou a quem vai usar? Novamente, é uma idéia que me agrada. Afinal, na hora de projetar um pouco de atenção aos recursos técnicos locais – ao chamado substrato técnico, para usarmos uma expressão mais precisa – é no mínimo de bom senso, além de ser respeitoso. Já os usuários, então, coitados deles. Apesar do lip service que os arquitetos costumam prestar aos anseios dos clientes ou usuários, na vida real isto não costuma se revelar no produto final. Tanto prédio mal dimensionado, tão pouca atenção à acessibilidade. Em Brasília, a situação é calamitosa!! Escadinha por todo lado, dê uma voltinha de cadeira de rodas e você verá como o tal “usuário” sofre!

Em que medida uma arquitetura de inspiração moderna está sendo capaz de incorporar as experiências e superar os desacertos do período crítico pós-moderno?

Não acho que há desacerto no período crítico pós-moderno. Acho que o período crítico pós-moderno foi um show. Nossa, foi uma festa de arquitetura!

Vamos pegar o pequeno período que eu compacto aí: dez, quinze anos de Pós-Modernismo. É como o Art-Nouveau: o Art-Nouveau durou dez, quinze anos, não mais. Tem coisa mais bonita que a arquitetura Art-nouveau? Durou isto: de 1890 a 1905, estourando. Deu show de bola. E o Pós-Modernismo stricto sensu, de que eu estava tratando aqui, deu um show também! Era uma alegria ver aquela arquitetura depois de termos passado cinqüenta anos na mamadeira modernista, engolindo concreto… Concreto aparente, ainda por cima, que arranha, esfola. Blindex e concreto aparente. De repente vem aquela alegria: cor, massa, ornamento, uma festa para os olhos!

Quer ver um exemplo? Todos nós, arquitetos, vamos concordar que o Brasília Shopping é horroroso. As pessoas de Brasília adoram; pergunte na rua e elas respondem: “É um prédio que você reconhece, que é diferente…” Então é uma qualidade para elas. Não é para o meu olhar de arquiteto, acho ele muito feio, mas posso entender a curtição delas. E para mim o Pós-Moderno foi uma curtição. Veja aquela arquitetura pop do Site, aquele historicismo do [Thomas Gordon] Smith, o próprio Michael Graves…  Depois daquela chatice minimalista…

Sabe o que é sentar numa cadeira Wassily, ter que se agüentar numa Barcelona? Eu não dou conta… E o pior é que os arquitetos insistem nelas. A última coisa que quero é sentar numa cadeira Wassily. De repente vem aquela festa, e agora podemos sentar em uma cadeira Luís XV, Chippendale…, sem cometer nenhum crime estético. Uma delícia! No que você prefere se sentar? Numa fauteuil de estilo, ou numa cadeira Wassily, do Breuer? Onde você quer assistir seu DVD: numa fauteuil confortável ou naquela coisa de couro frio em que você fica com dor nas costas? O less is more é um desconforto! Como tenho um lado vitoriano e gosto de um excesso, aquilo me entedia.

Tem mais um motivo porque eu gosto muito dos pós-modernos. Têm uns arquitetos, digamos assim, de linha modernista, extremamente requintados. Por exemplo o Isay [Weinfeld], que faz um Modernismo chic. E que depois é completado com tapetes persas, móveis maravilhosos, pinturas maravilhosas, é lógico que fica um ambiente belíssimo. São coisas extremamente requintadas. Agora, esse Modernismo rampeiro, cansado, fatigado, de concretinho e blindex, não agüenta nada. Ele já me irritava na década de sessenta, eu estava no escritório onde se projetava isto fácil. E olhava para aquelas casas do Artigas e pensava, “Aqui eu não moro!” Imagine hoje… Pelo contrário: o Pós-Modernismo foi uma liberação!

Como você vê, na arquitetura contemporânea, a autonomia da imagem e dos processos formais em relação ao conteúdo programático. É possível pensar na forma pura sem ser excludente?

Chega a cansar. Autonomia hasta cierto punto, please. Esta coisa da imagem, tipo Bilbao, em que a imagem do prédio é que interessa, e que todo o mundo sabe que está em Bilbao…

Arquitetura para mim é um prédio legal, bem construído, que funciona direitinho, em que os banheiros têm o tamanho certo, as escadas tem seus degraus com a altura certa, que tenha uma qualidade construtiva que não me obrigue a ficar o resto da vida em cima da manutenção, que não fique descascando, ou pulando os azulejos… E, evidentemente, o critério primeiro é que não caia. Meus padrões de qualidade arquitetônica são simples, primários e primitivos.

A autonomia da imagem é um pouco aquele discurso do Oscar Niemeyer: “Minha arquitetura quer causar surpresa“. Isso aí desgasta rápido. No seu caso, você trabalha no Congresso e entra diariamente no Congresso. Você fica surpreso toda a vez que olha o Congresso? Não, né? Sem dúvida que, quando a gente gosta de alguma coisa é sempre um prazer revê-la, mas ela não está te causando surpresa.

Aquilo que estava falando sobre moda e arquitetura, aquele problema do atemporal em arquitetura, pega justamente na raiz desta questão da surpresa, em que discordo do Niemeyer. Porque a arquitetura tem uma tendência à permanência, a ficar, ao contrário de outras coisas. Posso mudar de carro, mas não mudo a garagem, nem pinto a garagem porque troquei de carro. Você pensar a arquitetura como surpresa é muito pobre, muito pouco, porque ela vai te surpreender uma vez, duas vezes. Toda vez em que passo em frente ao Itamaraty, eu penso: “Que belo prédio, que belas proporções.” Mas não estou surpresa. Assim como toda vez em que passo em frente à Notre-Dame, fico encantada, ou quando vejo outras obras de arquitetura que me agradam. E eu as conheço depois de décadas, e o mundo conhece algumas delas depois de séculos ou milênios. Entre parentes, as pirâmides não me emocionaram, nada mais dejà vu, já os templos de Luxor são impressionantes, a tectônica…, um luxo, para fazer uma aliteração.

Quer dizer: usar o surpreendente como valor arquitetônico, para mim é tiro no pé. Por quanto tempo ainda Bilbao vai surpreender? Então essa autonomia, eu não sei a que ela vem. Sempre há uma certa autonomia da imagem em relação ao uso. Mas o que você quer dizer com forma pura sem ser excludente?

O Venturi fala de algumas casas de um Philip Johnson que, talvez por serem muito simplistas, não estimulam as pessoas ao serem excludentes. Elas excluem a possibilidade do imponderável, do imprevisto, de coisas que fazem parte da vida humana. Ele justifica a preferência dele pela complexidade porque a complexidade é do isto e aquilo, é da inclusão…

…no sentido dele, ela é mais democrática. Tem um outro aspecto. O Venturi não estava fazendo uma crítica política, mas nós podemos fazer por nossa conta, né? O Modernismo, na verdade, requer uma apreciação modernista. Uma apreciação less is more é extremamente sofisticada: less is more, quanto menos ornamento melhor…. Se sou emergente, quero muito ornamento para mostrar que tenho grana! Só para quem tem muita grana, e não precisa mostrar que tem toda essa grana, que uma estética less is more é aceitável.

Mas você acha que a fachada toda de vidro de Lake Shore Drive, por exemplo, não é uma forma de ostentação também? E é moderno… É tudo de aço inox…

Isso eu aprendi com o Artigas, foi uma lição que o Artigas me deu uma vez e eu interiorizei. O metro quadrado do vidro é muito caro. Na década de quarenta então, um pano-de-vidro indicava riqueza. Você conhece as duas casas do Artigas iguais: a Bittencourt e a dele, as duas casinhas com cobertura em V. Perguntei: “Poxa, Artigas, porque a sua casa você fez toda de vidro e a outra você fez em alvenaria?” E ele: “Porque o proprietário não quis, era muito caro.” Uma resposta simples, evidente, corretíssima. Ele estava fazendo a casa dele, era arquiteto, e provavelmente se endividou todo para botar bastante vidro, pagou um preço alto por sua opção estética. Então é lógico, você tem razão, naquele momento era uma demonstração de poderio até: aço e vidro.

Por outro lado, há um componente low profile que é esnobe. É um pouco como o lorde inglês que não usa sapato novo. Compra um sapato e dá para o mordomo usar; e depois que o mordomo envelheceu um pouco o sapato, aí ele usa, por que usar sapato novo é coisa de novo-rico. Então o less is more tem um tal componente esnobe, ele é excludente no gosto. Se você pegar um prato com desenhinhos e o mesmo prato sem desenhinho nenhum, o arquiteto provavelmente escolhe o sem desenhinho, mas 99% das donas-de-casa vai escolher aquele com desenhinho. Este ornamento é agradável, é pleasing, ele agrada aos olhos, é simpático para qualquer um. A estética modernista tem um componente elitista muito grande.

E isso é inexorável? Não é possível tentar a forma pura sem ser excludente?

Não… Nada é inexorável… A la Venturi: não é isto ou aquilo, é isto e aquilo e mais quinhentas outras coisas que você quiser gostar. Neste ponto concordo com o Venturi: não é sim ou não, branco ou preto. É branco, preto, amarelo, colorido, com o tanto de cor nova que hoje existe com a tecnologia. Você não precisa ficar no inexorável.

notas

1.  Sylvia FICHER, Anotações sobre o Pós-Modernismo, Projeto, n. 74, pp. 35-42, abr. 1985. Publicamos novamente o texto na versão eletrônica deste número de nossa revista, que pode ser lido em //www.28ers.com.
2.  Tom  WOLFE, From Bauhaus to our house (New York: Farrar Straus Giroux, 1981).
3.  Sylvia FICHER e Marlene Milan ACAYABA, Arquitetura moderna brasileira  (São Paulo: Projeto, 1982).
4.  Sylvia FICHER e Geraldo Nogueira BATISTA, Guiarquitetura Brasília (São Paulo: Empresa das Artes, 2000).
5.  Cf. Sylvia FICHER, Os arquitetos da Poli (São Paulo: EDUSP, 2005). Trabalhos recentes sobre o arquiteto: Maria Beatriz Portugal ALBUQUERQUE, Luz, ar e sol na São Paulo moderna: Alexandre Albuquerque e a insolação em São Paulo (São Paulo: Dissertação de Mestrado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 2006), e João Carlos GRAZIOSI, A trajetória profissional do engenheiro arquiteto Alexandre Albuquerque, 1905-1910 (São Paulo: Dissertação de Mestrado, Faculdade de Arquitetura, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2001).
6.  Germain BAZIN. A arquitetura religiosa barroca no Brasil (Rio de Janeiro: Record, 1983. 2 v). Edição original: 1958.
7.  Jorge CZAJKOWSKI (org.), Guia da arquitetura colonial, neoclássica e romântica no Rio de Janeiro. (Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2000).
8.  AMARAL, Aracy Abreu (org.). Arquitetura neocolonial: America Latina, Caribe, Estados Unidos (São Paulo: Memorial, 1994).
9.  A exposição Brazil Builds, com a curadoria de Philip Goodwin, foi realizada no Museu de Arte Moderna de Nova York em 1943. Seu catálogo foi um importante meio de difusão da arquitetura brasileira no exterior. Cf.  Philip L. GOODWIN, Brazil Builds: architecture new and old 1652-1942 (New York: Museum of Modern Art, 1943).
10.  Anatole KOPP, Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa (São Paulo: Nobel e Edusp, 1990). Edição original: 1988.
11.  Sylvia FICHER, Ensino, documentação e pesquisa, Projeto, n. 114, pp. 135-40, set. 1988.
12.  Cf. Nikolaus PEVSNER, Pioneiros do desenho moderno (Lisboa: Ulisseia, 1962). Edição original: 1936.
13.  Cf. Abílio GUERRA (org.), Eduardo de Almeida: arquiteto brasileiro contemporâneo (São Paulo: Romano Guerra, 2006).
14.  Arnold HAUSER, Mannerism: the crisis of the Renaissance and the origin of modern art  (London: Routledge & Paul, 1965, 2 v.).
15.  FICHER e ACAYABA, op. cit.
16.  Os textos de Sérgio Ferro foram recentemente republicados na coletânea Arquitetura e trabalho livre  (São Paulo: CosacNaify, 2006).
17.  Cf. Henry Russell HITCHCOCK e Philip JOHNSON, The International Style  (New York: Museum of Modern Art, 1932).
18.  Alfonso Corona MARTINEZ, Ensaio sobre o projeto  (Brasília: EDUnB, 2000). Edição original: 1990.
19.  O Cemitério de San Cataldo, em Modena, Itália, de 1972.
20.  Cf. Le Corbusier and the monumentalization of the vernacular 1930-60. In Kenneth FRAMPTON, Modern Architecture: a critical history (New York and Toronto: Oxford University Press, 1981), pp. 224-230.
21.  O Teatro del Mondo, em Veneza, de 1979, projeto temporário para a Bienal de Veneza.
22.  Cf. O movimento modernista. [1943] In Mario de ANDRADE, Aspectos da literatura brasileira  (São Paulo: Livraria Martins, s/d), pp. 231-55.
23.  Cf. Kent BLOOMER e Charles MOORE, Body, memory and architecture  (New Haven: Yale, 1978).
24.  Cf. LE CORBUSIER, Vers une architecture (Paris: Crès, 1923).
25.  Sylvia FICHER, Ensino, documentação e pesquisa, Projeto, n. 114, pp. 135-40, set. 1988.
26.  Sylvia FICHER, O ensino da construção no domínio da arquitetura, Projeto, n. 112, pp. 129-30, jul. 1988.
27. MARTINEZ, op. cit.
28.  John SUMMERSON, A linguagem clássica da arquitetura  (São Paulo: Martins Fontes, 1982). Edição original: 1963.
29.  Cf. FERRO, op.cit., pp. 47-58.

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MONUMENTALIDADE X COTIDIANO:
A FUNÇÃO PÚBLICA DA ARQUITETURA


Ano I . N.3 . mar.2006 . ISSN – 1809-4643

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Editorial

Trazemos aqui o planteamento da relação entre diversas escalas e níveis de envolvimento do profissional arquiteto com a produção do ambiente. Do cotidiano ao monumental, do privado ao público, da regra à exceção, indagamo-nos acerca da existência de princípios fundamentais que ordenem a construção do espaço.
Toda construção implica em comunicação: constitui um cenário de vida para a sociedade presente e uma história para com as sociedades futuras. Ao construir, o homem produz o registro de uma vivência, cuja importância tanto mais transcende sua individualidade quanto mais universais forem seus princípios constituintes. Do mesmo modo que um grupo de pessoas que não se comunicam não constitui uma sociedade, um grupo de construções ensimesmadas não constitui uma cidade. Pergunta-se então o que vem sendo dito, e que legados de cidadania osarquitetos estão construindo.
Se a prática da construção brasileira diz respeito, em sua maioria, à construção informal e ao inchaço das grandes cidades, pergunta-se em que medida o pensamento e a cultura arquitetônicos têm tomado parte nesse processo.
Se a geração de arquitetos modernos da primeira metade do século passado colocou à arquitetura o trabalho de cumprir uma “função social? pergunta-se em que medida dedicam-se os arquitetos à construção do espaço cotidiano.
Se o monumento é a síntese pública de uma cultura, pergunta-se pelos princípios que deve este monumento representar.
 Das questões colocadas, depreende-se que a arquitetura, obrigatoriamente e em qualquer caso, cumpre uma função pública. Tem o ofício do arquiteto, portanto, uma responsabilidade social inescapável, e da qual é necessária plena consciência. Mapeando aqui alguns aspectos deste tema, esperamos contribuir para sua visibilidade e seu resgate.

Danilo Matoso Macedo

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Encontros e palestras

Casa do Baile . Belo Horizonte
18 de março de 2006 . 16h



Abertura: Danilo Matoso
Palestra: Flávio Carsalade – MG
18 de março de 2006 . 16h



Palestra: Carlos Antônio Leite Brandão
18 de março de 2006 . 16h30



Palestra: Joaquim Guedes – SP
18 de março de 2006 . 17h



Debate
18 de março de 2006 . 18h00


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 A atividade do arquiteto, como a maior parte das atividades humanas, necessita de seus motivos, de suas metas e balizamentos; e estabelecer e validar alguns deles é o que me proponho a fazer aqui, discutindo funções públicas da arquitetura. Peço ao leitor o indulto pela pretensão talvez desmesurada da tentativa de abarcar tema tão amplo em espaço tão reduzido, ficando a ressalva da inevitável necessidade de omissão de assuntos correlatos ?da qual sou consciente.

O espaço edificado constitui, por sua própria natureza, objeto cultural. Seria difícil ao indivíduo construir sem o aporte histórico-cultural de técnicas construtivas. Tratando-se do espaço construído segundo as tecnologias hoje difundidas ?tijolo, madeira aplainada, aço, cimento, areia etc ? o aporte de insumos que somente uma sociedade organizada é capaz de produzir é imprescindível. Portanto, a construção do espaço edificado é, forçosamente, um produto social. Mais que isso: o espaço edificado não apenas é conformado como também conforma a sociedade em que vivemos, pois a História não se escreve fora do espaço e não há sociedade a-espacial. O espaço, ele mesmo, é social [1].

Esta interdependência forçosa entre espaço construído e sociedade suscita a indagação acerca da natureza de propriedade do primeiro dentro da segunda: quais os limites entre espaço construído público e privado, tratados como bens?

A Economia define a existência de bens públicos como uma falha de mercado onde o Estado deve naturalmente atuar:

Os bens públicos são aqueles cujo consumo/uso é indivisível ou ‘não-rival? Em outras palavras, o seu consumo por parte de um i­ndivíduo ou de um grupo social não prejudica o consumo do mesmo bem pelos demais integrantes da sociedade. Ou seja, todos se beneficiam da produção de bens públicos mesmo que, eventualmente, alguns mais do que outros. São exemplos de bens públicos: bens tangíveis como as ruas ou a iluminação pública; e bens intangíveis como justiça, segurança pública e defesa nacional.
 Outra característica importante é o princípio da ‘não exclusão? no consumo destes bens. De fato, em geral, é difícil ou mesmo impossível, impedir que um determinado indivíduo usufrua de um bem público [2].

Estritamente, esta definição de bem público não define o espaço construído como coisa pública. Ao contrário, os imóveis são os bens privados quase que por antonomásia. Há, entretanto, aspectos do espaço construído que, acredito, são bens públicos ?no sentido econômico. São eles tanto a paisagem da vida social como o registro histórico-cultural da sociedade.

Como paisagem da vida social, temos como construções mais óbvias as ruas, praças, calçadas, parques e outros elementos urbanos: são espaços construídos de domínio público claramente definido. Afinal, pagamos aos nossos municípios impostos investidos em sua construção e manutenção. São os chamados bens de uso comum do povo [3].

Ainda como paisagem da vida social urbana, temos o conjunto de edificações de propriedade pública e privada que compõem as nossas cidades juntamente àqueles bens de uso comum do povo. Tenham sido elas construídas sob a égide de regulamentações urbanísticas ou a sua revelia, as edificações constituem a imagem da cidade, definem seus referenciais, adensam ou esgarçam o tecido urbano e seus fluxos de pessoas e veículos, dentre tantas outras interações de ordem coletiva.

A sobreposição e convivência temporal destes cenários construídos compõem parte da memória das culturas das sociedades, refletind­o, criando e ratificando seus valores como coisas autônomas que estes espaços construídos são. Para as gerações futuras, esse patrimônio é registro de sua própria história pregressa, a ser interpretada de acordo com os valores a elas contemporâneos.

Se estes aspectos essenciais do e­spaço construído emprestam-lhe um caráter e­minentemente público, cabe perguntar do papel desempenhado pela profissão do arquiteto na produção desse espaço. Afinal, se 70% da produção de moradia no País está fora do mercado formal [4], o arquiteto-projetista de edifícios talvez seja responsável por uma parcela quantitativamente pouco significativa do espaço construído da sociedade de nosso país. Convido o leitor a debruçar-se sobre o mapa de qualquer das grandes metrópoles brasileiras, delimitando as áreas e pontos de interesse da cultura arquitetônica local: os edifícios e casas que são publicados em revistas, que estão em nossas exposições, que recebem prêmios de nossos institutos. Mesmo em termos planimétricos, a porcentagem constatada será seguramente bastante inferior aos 30% restantes da estatística acima.

Isso não é novidade. Em 1946, Oscar Niemeyer já dizia que:

(…) se examinamos nossa atividade profissional objetivamente, constatamos que ela se limita exclusivamente à solução do problema arquitetural de edifícios isolados, públicos, ou de casas de burgueses. Em suma: as construções que, logicamente, deverão ser eliminadas de um ‘plano diretor?exato e definitivo que englobe sem distinção a todos os problemas arquiteturais de nossas cidades e de nosso país. [5]

Na verdade, atender somente às elites das sociedades e ao Estado é talvez uma das c­­a-racterísticas primordiais da profissão: a antiga função social do arquiteto era produzir edifícios de poder e gosto para pessoas de poder e gosto [6].

Garry Stevens define este valor de gosto em jogo na dinâmica da profissão como capital s­imbólico. Apoiado no referencial teórico de Pierre Bourdieu, o arquiteto australiano afirma que não estão em foco aqui os objetos produzidos ?as edificações, projetos etc. ?mas a perpetuação de um sistema onde a classe dominante mantém fechado o espaço social e transmite poder e privilégio através das gerações erigindo barreiras simbólicas em torno de si mesma [7]. Para este autor, a sobreposição de paradigmas dentro do campo da arquitetura, historicamente, trata-se apenas do jogo endógeno de substituição de um valor de capital simbólico de uma geração ascendente frente à geração anterior. Sua finalidade essencial m­antém-se a mesma: perpetuar o sistema de divisão de classes através de uma estrutura simbólica de gosto. Os sucessivos movimentos arquitetônicos teriam sempre na essência de seu discurso a negação de valores de uma g­eração em prol dos valores da geração seguinte, legitimando a autonomia do campo ao mesmo tempo em que se cria um novo conjunto de valores simbólicos. Assim, por exemplo,

a história do Movimento Moderno é precisamente a história das tentativas afinal vitoriosas da vanguarda de desvalorizar completamente o capital ‘beaux-arts?em favor do seu próprio capital [8].

Sabemos que, de fato, o desejo (frustrado) de atender diretamente a toda a sociedade, tendo todas as classes por clientes, foi inculcado na cultura arquitetônica pelas vanguardas modernas do início do século XX, a partir da ação do Deutsche Werkbund [9], bem como das vanguardas artístico-revolucionárias russas e sua ampla influência em figuras de proa da arquitetura européia, como Walter Gropius, Mies van der Rohe [10] e Le Corbusier [11].

Mais que substituir os valores simbólicos a­nteriores, os arquitetos modernos tinham diante de si o dever de manter a autonomia do campo arquitetônico. Ou seja: a tarefa de preservar íntegra a prerrogativa exclusiva do arquiteto em produzir edifícios de poder e gosto para pessoas de poder e gosto [12]. Para Stevens,

os modernistas conseguiram evitar qualquer ameaça à sua autonomia intelectual pelo simples expediente de ignorar aqueles para quem afirmavam estar projetando.

São célebres as anedotas acerca das inconveniências tecnológicas da impermeabilização da Villa Savoye (Le Corbusier, 1929) [13], e em como elas foram solenemente ignoradas por seu autor durante um bom tempo. É notório t­ambém como a afluência de um grande n­úmero de turistas-arquitetos tornou impossível o uso privativo das casas Farnsworth (Mies van der Rohe, 1946) e Falling Water (Frank Lloyd Wright, 1936). Ao fim e ao cabo, os a­rquitetos modernos ?tanto quanto os de o­utras gerações ?projetavam para outros a­rquitetos, não para seus clientes e muito menos para o povo. As obras arquitetônicas nesse sentido são instrumentalizadas de modo a viabilizar a ascensão social do arquiteto dentro de seu campo de batalha: o campo arquitetônico.

Não pretendo com esta constatação promover qualquer tipo de ataque à brilhante geração de arquitetos modernos ?dentro do Brasil, talvez os mais relevantes até hoje. Afinal, diferentes gerações usaram de expedientes similares ou até bastante menos nobres para ascender a determinado status cultural. Veja-se, por exemplo, os artifícios de ironia e cinismo ocultando a simples ausência de programa conceitual em diversos setores da crítica arquitetônica desde os anos de 1970 até hoje.

Ao contrário, a autonomia conseguida pelo campo arquitetônico durante o Movimento Moderno hoje é legítima. Afinal,

nenhuma área do campo cultural restrito (tais como a escultura, a poesia, a pintura, a música) está tão amarrada a outros campos sociais e é, portanto, menos autônoma. A tremenda tensão que isso cria no interior da arquitetura manifesta-se em uma variada sintomatologia: a teoria arquitetônica nunca se recuperou da perda das [supostas] certezas do modernismo; os arquitetos preocupam-se com a sua perda de influência na indústria da construção; o sistema educacional parece inadequado; as associações profissionais estão destroçadas e sem rumo. [14]

Feitas estas ressalvas com respeito ao caráter elitista da arquitetura ocidental ?e não apenas brasileira, como afirmou Niemeyer ? perguntamo-nos se o caminho rumo ao estabelecimento de um ethos arquitetônico inclusivo está no sistemático atendimento, pelos arquitetos, das demandas de camadas menos favorecidas de seu povo. Niemeyer nos responde:

Sempre recusei este equívoco, essa idéia medíocre dos que insistem numa arquitetura ‘mais simples, mais ligada ao povo? (…) Para mim, essa idéia da simplicidade arquitetural é pura demagogia, discriminação inaceitável e, às vezes, uma timidez que só a falta de talento pode explicar [15].

Oscar e outros membros do Partido Comunista, como o próprio Vilanova Artigas [16], entrincheiraram-se no marxismo clássico por detrás de uma fé pré-keynesiana na inexorabilidade da revolução proletária com o colapso do capitalismo ?o que explica o teor da passagem anti-assistencialista de Niemeyer acima. Para eles, a revolução não se faz com a arquitetura, mas na luta e na militância política [17]. Ou seja: arquitetura pouco teria a ver com política.

E a resposta da maioria dos arquitetos para este impasse tem sido o dar de ombros. Desde a queda do construtivismo russo no regime de Stalin, e mesmo desde Brasília, ficou bastante claro que a arquitetura per se não mudará a sociedade. E foi o próprio Corbusier quem, paradoxalmente, nos afirmou que a revolução pode ser evitada. As tentativas assistencialistas de construção de modelos de habitação popular em substituição aos tugúrios e favelas têm sempre esbarrado no problema do aspecto plástico massificado, do distanciamento dos centros urbanos, da baixa qualidade dos materiais construtivos, do subdimensionamento dos cômodos, além dos problemas de ordem social gerados pela imposição da solução às comunidades [18].

Mas como dar de ombros para esta exclusão, diante do caráter público inerente à arquitetura exposto no início deste texto? E não é a própria arquitetura de Oscar um poderoso instrumento político habilmente aproveitado por governantes para reforçar a estrutura simbólica do poder ?desde Pampulha até suas últimas obras?

Buscar um ethos inclusivo para a atividade do arquiteto pode ter outro sentido que a ação a­ssistencialista ou a construção de monumentos públicos. O espaço construído, conforme vimos, comunga em sua essência com a sociedade que nele habita. Mas que ethos inclusivo seria este?

As saídas elaboradas pelos arquitetos a partir da década de 1960 estiveram, em sua maioria, ligadas à eliminação da lógica clássica de projeto e construção. Pode-se citar como exemplos as obras de Christopher Alexander [19], primeiro com a tentativa de geração da forma via raciocínio matemático, e depois com a criação de um método baseado em padrões espaciais racionalmente catalogados e selecionados intuitivamente pelo arquiteto a partir de uma integração pessoal com os clientes e com o lugar. O edifício, nesse processo é construído sem projeto. Há ainda a obra de Lucien Kroll, feita de modo participativo com os usuários, permitindo-lhes atuar como designers na etapa de projeto e alterar as obras à vontade após a sua execução. O resultado plástico é de uma aparente desordem “vernacular?[20].

No Brasil, ao menos no campo arquitetônico, talvez a voz mais ouvida tenha sido a de Sérgio Ferro, em seu célebre O canteiro e o desenho. Para Ferro, ao separar a capacidade de pensar a construção da capacidade de fazer a construção, o desenho (entendido como projeto) é instrumento de alienação a serviço do Capital.

Assim, para a obra, o desenho não é representação de um objeto de uso. Representa, ou melhor, impõe sincretismo ao trabalho parcelado que deixa esfarelado para preservar sua missão unificadora [21].

O que estas respostas têm em comum é a negação da ordem vigente para a proposição de outra. Embora Alexander e Kroll tenham pautado suas práticas por estes “sistemas alternativos?ao longo de quarenta anos, eles nunca superaram esta condição marginal, não chegaram a formar uma “escola?baseada em suas práticas. Já Ferro abandonou a arquitetura e passou a dedicar-se à pintura, tendo exercido influência indireta nos movimentos de mutirão dos anos 80, baseados em suas formulações, e liderados por ex-alunos seus [22]. E embora a prática seja efetiva para massas organizadas como o Movimento Nacional de Luta pela Moradia, a premissa de dedicação das horas vagas dos operários à construção diletante de sua própria casa segue sendo um paradoxo [23].

Negando o projeto, o desígnio [24], o instrumento social cuja elaboração está ao alcance de poucos, estes arquitetos abriram a guarda da autonomia de campo da arquitetura. Por abdicar desta característica de distinção social, deixando-a aberta à participação dos usuários, suas propostas naturalmente seriam vistas no máximo como um objeto de curiosidade pela maior parte dos integrantes do campo arquitetônico. Os alunos de elite das escolas de arquitetura – o lugar onde as ondas de renovação tomam corpo ?não abririam mão do capital simbólico que já possuíam.

O relativo fracasso das tentativas de supe-ração do paradigma clássico moderno de autonomia do objeto arquitetônico, como cons-truto íntegro, suscita nossa próxima questão: é possível abrir mão desta função de comando do arquiteto, dessa força designadora, na definição e construção do espaço social?

Voltemos com mais atenção aos aspectos públicos do espaço construído. É neles e no exame de suas relações dialéticas com o homem que estão as chaves do argumento.

O espaço urbano, por onde passam as ruas, parques, praças, como bens de uso comum do povo, definem em sua essência a noção que desenvolvemos de espaço da coletividade. É nessa construção de nosso cotidiano particular que encontramo-nos com nossos vizinhos, que fazemos nossas refeições e compramos nossos bens de consumo.

É na relação de comunicação com os bens de uso comum do povo que as edificações particulares se tornam coisa pública. Ao mesmo tempo, para além dos desejos individuais de seus construtores, os edifícios são destinados a existir por um longo tempo, constituindo forçosamente parte da paisagem de vida de gerações futuras.

Estas duas relações de alteridade para com a vontade particular daqueles que constroem ensejam a responsabilidade do indivíduo para com a coisa pública. Elas, a uma vez, individua­lizam o domínio público e publicizam o domínio privado. A arquitetura, vista sob este ponto de vista, está na construção desta fina membrana entre o espaço fechado e o aberto, entre o momento atual e o seguinte. Como nos lembra Niemeyer, com uma clareza de pensa­mento lapidar:

para nós, o ‘espaço arquitetural?é a própria arquitetura e para realizá-la nele interferimos interna e externamente, integrando-a na paisagem e nos seus interiores, como duas coisas que nascem juntas e harmoniosamente se completam [25].

É a arquitetura portanto tentativa de cons­trução do espaço social, de estabelecimento de diálogo entre as múltiplas vontades individuais e entre tempos diferentes. A compreensão do outro é o que torna o existir possível, o ensimesmado torna sua própria existência uma tarefa árdua [26].

Esta tarefa de compreensão do outro coloca-nos a premissa do estabelecimento de uma linguagem comum. E é na construção da potencialidade do objeto concreto como materialização desse campo de diálogo que reside a labuta daquele que constrói.

O espaço concreto deve ter então uma integri­dade material, uma determinada saúde plástica que o torne identificável e compreensível como instrumento de diálogo. Esta possibilidade de diálogo, per se, abre o campo semântico da obra tornando-a processo político. Não se trata aqui apenas de uma platônica autonomia formal [27].  Trata-se de coerência entre forma e possibilidades materiais do momento e da situação. Sem esta coerência, esta integridade própria da coisa em si [28], a construção fará sentido para menos pessoas.

Assume-se, com isso, que há valores c­oncretos próprios de cada situação, que p­odem ser transferidos para a construção de nosso ambiente. Este, como objeto que tem existência própria, dialoga com a própria sociedade que o criou em cada momento futuro. O grau de efetividade da arquitetura, nesse sentido, estaria diretamente ligado à abrangência de sua universalidade, de sua capacidade de comunicar, de fazer sentido para um número maior de pessoas. É essa capacidade que distingue, por exemplo, uma construção universal como o anexo da National Gallery (I.M. Pei, Washington, 1968).
São inúmeros os esforços teóricos de identificar uma estrutura lingüística comum à arquitetura ocidental: Norberg-Schulz, Charles Moore, Herman Hertzberger e outros assentaram uma sólida fundação nesse sentido. Acredito que a arquitetura de Oscar Niemeyer (na fase de 1957 a 1989), Álvaro Siza, Louis Kahn e I.M. Pei, por exemplo, são exemplos lapidares de síntese a partir desse tipo de princípio atemporal. O caráter clássico desse tipo de arquitetura não vem ao acaso. Como já foi dito, o Movimento Moderno não mudou o habitus elitizante da arquitetura, que a torna nossa atividade propícia à construção de monumentos:

Raro é o edifício não projetado por um arquiteto que represente os valores supremos de uma civilização. Isto tem sido verdade para templos, palácios, bibliotecas e prefeituras na Grécia, em Roma e na Europa do período da Renascença; e, mais recentemente, para museus, universidades, edifícios governamentais e sedes de corporações. O projeto dos grandes edifícios monumentais de projeção é o único domínio da arquitetura, seu mercado natural. Nenhuma outra profissão foi capaz de concorrer efetivamente neste mercado, seja no passado ou seja nos dias de hoje [29].

Entretanto, se há esta cultura ocidental a que todo bom artefato acaba prestando contas, há também, neste artefato, a incorporação de códigos sociais locais aos quais o arquiteto-cidadão local é capaz de atender. Ocorre aí a ruptura entre o campo arquitetônico e o campo social-comunitário em que ele se insere.

Para que o arquiteto construa, no espaço público, a ligação entre o mundo privado e o público; entre o tempo presente e outros tempos; entre cultura local e cultura global, é necessário que ele seja efetivamente parte daquela polis. Mas como isso é possível, num país onde apenas 24,9% da população possui formação mínima de nível médio? [30]

À primeira vista, a proliferação dos cursos de arquitetura no país, aliada a políticas públicas que garantam o acesso de membros de uma maior gama de classes sociais pode representar uma solução. Afinal, ao aumentar-se a diversidade social do elitizado curso de arquitetura, aumenta-se a capilaridade do campo arquitetônico dentro do tecido social, enriquecendo as possibilidades culturais do primeiro e melhorando a qualidade da arquitetura socialmente relevante do segundo.

A verdade, porém, é que mesmo em países onde o nível educacional é alto ocorre o pro­blema da elitização dos bens de capital simbólico, conforme nos atesta Stevens [31]. Surpreendentemente, a quantidade de a­rquitetos formados no mercado não interfere na quantidade de arquitetos de elite que a sociedade consegue suportar. Em estudo de séries históricas, Stevens demonstra que a razão entre a população e o número de arquitetos de elite ?ou gênios – manteve-se aproximadamente constante nos últimos quinhentos anos [32]. Esses arquitetos projetam os monumentos de sua geração.

Ocorre que o campo arquitetônico simplesmente exclui de seus valores simbólicos outras atividades que não projetar monumentos ou, o que é mais recorrente, projetar edifícios de uso cotidiano com a lógica e os valores de monumentos. Mais que isso, o arquiteto que não se dedica ao projeto de edifícios é considerado profissional de segunda categoria. Excluem-se assim aqueles que se especializaram em conforto ambiental, gestão de projetos, gestão pública, planejamento urbano, execução de obras, patrimônio histórico etc. Com o tempo, pelo menos em campos mais estabelecidos como o planejamento urbano e o patrimônio histórico, a recíproca tornou-se também verdadeira com relação aos próprios arquitetos projetistas.

Portanto, criar um ethos inclusivo para a atividade do arquiteto passa por criar um ethos inclusivo dentro do próprio campo arquite­tônico, diversificando-o [33]. É preciso que as escolas de arquitetura, a história e os meios de comunicação especializados passem a tratar da diversidade de possibilidades profissionais do arquiteto não como alternativas de trajetórias de mercado, mas também como estratégias simbolicamente válidas e não-excludentes entre si.

Não proponho, com isso, a desagregação da arquitetura ou sua segmentação em especialidades. Ao contrário: ampliando a gama de quali­ficações simbolicamente relevantes no campo profissional do arquiteto, abre-se o diálogo em condições de igualdade entre c­ampos de saber. Tomemos o exemplo dos meios de comunicação: no quadro de estreitamento de visão atual, raro é o artigo sobre arquitetura nos anais de encontros de urbanismo, e mais rara ainda é a discussão de planejamento urbano em periódicos de arquitetura. A construção do espaço social, com toda a carga de integridade material que ele deve possuir, é o denominador comum a todas as disciplinas ligadas à arquitetura.

Acredito que, em lugar de reduzir a autonomia do campo, esta diversidade disciplinar “humanística?amplia as suas fronteiras. E se, nas escolas de arquitetura, o ateliê de projeto é o local de transmissão do habitus elitista da construção de edifícios [34], que se criem ateliês ligados também às outras atividades. É preciso que se abra ao estudante a possibilidade de reali­zação pessoal e profissional através da arquitetura fora do já saturado campo da produção de objetos de gosto para pessoas de gosto.

Diversificando a matriz do campo a­rquitetônico, ele se tornará naturalmente mais permeável ao diálogo social participativo e não assistencialista. O arquiteto que se sente cidadão ?e não excluído ?no próprio campo arquitetônico terá possibilidades maiores de difundir uma cultura de cidadania no campo social que ele freqüenta. Terá, portanto, maiores possibilidades de criar objetos mais íntegros por dialogarem mais com a sociedade em que se inserem. Serão espaços construídos que promoverão o diálogo entre o bem comum e o bem privado de modo mais efetivo.

É na aceitação da diversidade e no diálogo que exercitamos esta espécie de humanismo lato sensu [35]. Não saberemos criar bons espaços públicos se não soubermos, antes de mais nada, constituir grupos coesos, abertos ao diálogo, dentro de nosso próprio campo. Para isso, é necessário ampliar os canais de comunicação internos, estabelecendo debates próprios da cultura arquitetônica. Rompendo-se o hermetismo dos valores de cada especialidade rumo a valores compartilhados por toda a comunidade arquitetônica, esta tende a aproximar sua linguagem à da sociedade: a arquitetura passa a ser socialmente relevante.

No caso brasileiro, especificamente, é preciso que aprendamos a analisar e extrair valores de nossa realidade mais próxima para criar este sentido de cultura. É necessário romper a estratégia pela qual se tenta afirmação no meio arquitetônico pela novidade conceitual e/ou formal, usando-a para atacar a prática e o pensamento locais. Darcy Ribeiro, em 1978, já nos alertava para este vício comum:

Lamentavelmente, em todos os campos, a maioria dos jovens especialistas se forma ignorando solenemente os esforços de autoconhecimento realizados no Brasil. Exilados espiritualmente em seu próprio país, filiam-se prontamente às escolas de moda no estrangeiro, passando a papaguear sua linguagem, a assumir suas poses, a penar suas angústias e a encarnar suas preocupações. Quando amadurecem como pesquisadores, convertem-se em verdadeiros “cavalos de santo?do sábio francês ou inglês do dia. [36].

Ao longo dos últimos quarenta anos, a crítica incondicional da geração atual vem destruindo as tentativas de formação cultural feitas pelas gerações anteriores, num círculo vicioso estéril.

Tome-se como exemplo a recente retomada dos valores da Arquitetura Moderna Brasileira. Se, por um lado, esta pesquisa parte do saudável preceito de entender os valores de nossa sociedade, por outro lado é preciso que não se percam as conquistas e descobertas das gerações das décadas de 1980 e 1990: o estudo dos valores clássicos e atemporais da arquitetura, a criação da noção de significado arquitetônico, a preocupação ambiental premente, dentre tantos avanços.

É preciso criar uma polis arquitetônica, definindo uma arquitetura lato sensu sem perder de vista os valores próprios de cada disciplina, para que saibamos contribuir para a formação de nossas cidades como espaços construídos materialmente íntegros e efetivamente públicos. Afinal, a profissão do arquiteto, ela mesma, ao ser não excludente, transforma-se num bem público.

A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade (…). (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 05 out.1988. Art. 183, § 2º.)

referências bibliográficas

ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de artigas aos mutirões. São Paulo: Editora 34, 2002. 255p.
CURTIS, William J. R. Le Corbusier: ideas and forms. London/New York: Phaidon, 2003. 240p.
FERRO, Sérgio. O canteiro e o desenho. São Paulo: Projeto/IAB-SP, s/d [1979]. 112p.
GIAMBIAGI. Teoria das finanças públicas. In ______ . Finanças públicas. 2ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. p.23-67
MALLARD, Maria Lúcia.(org.) Cinco textos sobre arquitetura. Belo Horizonte: UFMG, 2005. 237p.
MARTINS, Bruno. Tipografia popular: potências do ilegível na experiência do cotidiano. 2005. 100p. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) ?Universidade Federal de Minas Gerais ?FAFICH, Belo Horizonte.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 28ed. São Paulo: Malheiros, 2003. 792p.
MINISTÉRIO DAS CIDADES. A desigualdade urbana. In: Cadernos MCidades: política nacional de desenvolvimento urbano. n.1, p.43-52, nov. 2004.
NIEMEYER, Oscar. Arquitetura como arte espacial. In CORONA, Eduardo. Oscar niemeyer: uma lição de arquitetura ?apontamentos de uma aula que perdura há 60 anos. São Paulo: FUPAM, 2001. 131p.
______ . As curvas do tempo: memórias. Rio de Janeiro: Revan, 1998. 294p.
______ . Ce qui manque à notre architecture. In: LE CORBUSIER, OEuvre Complete (1938-1946). Zurich: Les Editions d´Architecture, 1946. p.90
RIBEIRO, Darcy. UnB: invenção e descaminho. Rio de Janeiro: Avenir, 1978. 139p.
SANTOS, Milton. Sociedade e espaço: a formação social como teoria e método. In ______. Espaço e sociedade. Petrópolis: Vozes, 1979.p.9-27.
SOBREIRA, Fabiano José Arcádio. A lógica da diversidade: complexidade e dinâmica de assentamentos espontâneos. 2003. 262p. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Urbano) ?Universidade Federal de Pernambuco, Recife.
 STEVENS, Garry. O círculo privilegiado: fundamentos sociais da distinção arquitetônica. Trad. Lenise Barbosa. Brasília: UnB, 2003. 272p.

notas

1.  SANTOS, 1979. p.10.
2.  GIAMBIAGI, 2000. p.24
3.  MEIRELLES, 2003. p.491.
4.  MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004. p.47
5.  si nous examinons notre activité professionnelle d´une façon plus objective, nous constatons, qu´elle se limite exclusivement à la solution du problème architectural d´édifices isolés, publiques, ou de maisons de bourgeois, bref: des constructions qui, logiquement, devraient être eliminées d´un ‘plan directeur?exact et définitif englobant sans distinction tous les probl`emes architecturaux de nos villes et de notre pays. In: NIEMEYER, 1946. p.90.
6.  STEVENS, 2003. p.244.
7.  STEVENS, 2003. p.84.
8.  STEVENS, 2003. p.91.
9.  Cf. FRAMPTON, Kenneth. The Deutsche Werkbund. In Modern Architecture: a critical history. 3ed.  London/New York: Thames and Hudson, 1992. p.109-115.
10. Esses dois participantes do Werkbund.
11. O capítulo Livrar-se de todo o espírito acadêmico de Précisions ilustra bem esta nova mentalidade. in LE CORBUSIER, Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. Trad. Carlos Eugênio de Moura. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. p.35-45
12. William Curtis ainda nos diz: “While Le Corbusier was preaching the virtues of mass-production dwellings and the vision of a transformed modern city, he was supporting himself with a practice based largely upon the construction of private houses, artist’s studios and villas for the well-to-do. In the France of the 20’s, agencies for large scale urban reform were lacking. Even the small-scale Pessac experiment perhaps showed that Le Corbusier’s aesthetics were more suited to ‘cultured people?(as Rasmussen put it) than to workers: that the architect’s universal values were more classbound than he might have hoped. In the 1920s ‘Esprit Nouveau?was to become the cultural property of upper middle-class bohemia more than any other social group.?In: CURTIS, 2003. p.71.
13. “Alguns dias depois que a família Savoie [sic] havia se mudado para sua famosa casa, a cobertura da sala de estar começou a apresentar vazamentos. Eles ficaram muito aborrecidos e imediatamente chamaram Le Corbusier.
Quando este chegou, foi imediatamente levado para inspecionar os danos e sugerir uma solução. Ele ficou, por alguns segundos, observando fixamente a água. Finalmente, virou-se para os Savoie [sic] e pediu uma folha de papel em branco. Entregou-a a Le Corbusier. Corbu a colocou em uma mesa próxima, dobrou-a cuidadosamente e fez um barco de papel.
Caminhou até o centro da sala, inclinou-se e pôs o barco dentro d´água, disse au revoir e foi embora.”ANTONIADES, A.C. citado por STEVENS, 2003. p.102.
14. STEVENS, 2003. p.113
15. NIEMEYER, 1998. p.270
16. Para um desenvolvimento deste tema:
Na obra de Niemeyer,  cf. PEREIRA, Miguel Alves. Arquitetura, texto e contexto: o discurso de Oscar Niemeyer. Brasília: UnB, 1997. p. 148-153 e 163-171.
Na obra de Artigas, cf. ARANTES, 2002. p.39-48 e p.91-106
17. Cf. NIEMEYER, 1998. P.259.
18. “Em termos práticos, podemos destacar quatro tipos de postura que têm sido aplicados aos assentamentos espontâneos: remoção, relocação, compartilhamento e melhoria in loco.
(…)
A relocação (…), deslocando a população de baixa renda para conjuntos habitacionais construídos em massa nas periferias das grandes cidades, (…) é vista como ineficaz e anti-econômica (…), pois além de exigir uma grande concentração de recursos, a serem aplicados em curto espaço de tempo, exige também transformações abruptas no modo de vida e nos padrões de moradia. Conseqüentemente, boa parte dos moradores relocados acaba cedendo às pressões da especulação imobiliária, desfazendo-se do imóvel e ocupando novamente os assentamentos informais das áreas centrais, alimentando um ciclo vicioso.?In SOBREIRA, 2003. p.22.
19. Alguns de seus trabalhos mais recentes estão disponíveis na internet em <//www.patternlanguage.com/&gt; . Acesso em 08fev.2006.
20. Seus trabalhos estão disponíveis na internet em <//homeusers.brutele.be/kroll/&gt; . Acesso em 08fev.2006.
21. FERRO, s/d., p.16.
22. Cf. ARANTES, 2002. p.163.
23. Cf. ARANTES, 2002. p.213.
24. Cf. ARTIGAS, João Batista Vilanova. O desenho. In ______ . Caminhos da Arquitetura. São Paulo: Cosac & Naify, 1999. p.71.
25. NIEMEYER, 2001. p.36.
26. MARTINS, 2005. p.31.
27. Cf. KAPP, Silke. Por que teoria crítica da arquitetura? Uma explicação e uma aporia. In MALLARD, 2005. p.158.
28. Refiro-me aqui ao conceito de coisa em si desenvolvido por Heidegger em  HEIDEGGER, Martin. The Thing. in Poetry, Language, Thought. New York: Perennial Library. 1971, p. 165-183.
29. GUTMAN, Robert. Citado por STEVENS, 2003. p.103.
30. Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004.
31. Cf. STEVENS, 2003. p.106.
32. Cf. STEVENS, 2003. p.170.
33. Neste ponto, Stevens aponta que a diversificação do campo continua mantendo o não-projetista em condição secundária no campo alternativo escolhido ?como patrimônio histórico, por exemplo. Entretanto, no Brasil, onde estas outras atividades dificilmente constituem um campo autônomo, o mesmo não aconteceria. Cf. STEVENS, 2003. p.251.
34. Cf. STEVENS, 2003. p.223-224.
35. Refiro-me aqui ao iluminado texto de Carlos Antônio Brandão:, para quem: “Talvez o nosso maior desafio, hoje, seja o de inventar um novo homem. Esse também foi o desafio fundamental dos humanistas no início do Renascimento. Antes de mais nada, eles tiveram de elaborar um “projeto?dos modelos de ser humano e de cidade, contrapostos aos homens e às cidades existentes, com seus valores, hábitos e modos de pensar e viver. Esse projeto recebeu o nome de Humanismo e a humanidade que ele descreve não existiu plenamente naquela época, nem antes nem depois.(…) Reflexão e ação fecundavam-se reciprocamente: verba e res permanecem tensionando-se, mas unidas, e o pensamento se traduz num artefato, num artefazer, numa ação destinada a melhorar o mundo ao redor.”BRANDÃO, Carlos Antônio Leite. Humanismo latu sensu. In MALLARD. 2005. p.22-61.
36. RIBEIRO, 1978. p.90.

danilo matoso macedo
Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004). Foi professor de projeto arquitetônico na Escola de Arquitetura da UFMG (2003) e no Curso de Arquitetura e Urbanismo do UniCEUB – Brasília (2003-2005). É Arquiteto da Câmara dos Deputados desde 2004. Participa de concursos nacionais e internacionais, tendo recebido premiações em diversos deles. Possui escritório próprio desde 1996.

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Danilo Matoso Macedo

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(…)procuro orientar meus projetos, caracterizando-os sempre que possível pela própria estrutura. Nunca baseada nas imposições radicais do funcionalismo, mas sim, na procura de soluções novas e variadas, se possível lógicas dentro do sistema estático. E isso, sem temer as contradições de forma com a técnica e a função, certo de que permanecem, unicamente, as soluções belas, inesperadas e harmoniosas. Com esse objetivo, aceito todos os artifícios, todos os compromissos, convicto de que a arquitetura não constitui uma simples questão de engenharia, mas uma manifestação do espírito, da imaginação e da poesia. [2]

É costume da historiografia, e do próprio Oscar Niemeyer, dividir a sua produção entre as obras que vão de Pampulha a Brasília como um primeiro período, e a produção posterior à da capital como um segundo. Cabe aqui, entretanto, estabelecer naquele alguma divisão que lhe desvele as nuances. Afinal, a produção do arquiteto inicia-se em 1935 ?ano de sua graduação pela Escola Nacional de Belas-Artes ? e certamente suas obras dos anos 1950 guardam algumas diferenças em relação às dos anos 1940. Ou seja: nem suas obras iniciam-se em Pampulha, em 1941, nem esteve inerte o pensamento do arquiteto ao longo de quinze anos de trabalho.

Seus primeiros trabalhos, de 1935 e 1936 ?anteriores ao contato pessoal com Le Corbusier ?caracterizam-se precisamente por uma leitura habilidosa, mas ainda restrita, dos princípios do mestre suíço, concretizadas na Obra do Berço (1935), e apenas projetadas na Residência Henrique Xavier (1936) e na Residência Oswald de Andrade (1936). Vê-se ali não apenas a expressão clara do esqueleto independente de concreto armado deslocado dos fechamentos ?agora envidraçados ?como o uso de terraço jardim, janelas em fita e mesmo das mediterrâneas abóbadas das Maisons Jaoul (1919) e do impluvium da Residência Errazuriz, no Chile (1930).

Noutra via, Oscar vinha desenvolvendo em seus projetos de 1936 a 1943 um pensamento de cunho nativista que o leva a articular telhados cerâmicos, muxarabis e generosos avarandados [3], devidamente codificados pelas interpretações modernas que Lúcio Costa vinha dando a estes elementos não apenas em projetos como a Vila Operária de Monlevade (1934), como também em seus textos ?Razões da nova arquitetura (1934) e Documentação Necessária (1938) [4].

A estas leituras some-se o contato direto com Le Corbusier e a condução das obras do Ministério da Educação e Saúde Pública ?MESP ?pelo próprio Oscar [5], concluídas apenas em 1945 e simultâneas à construção da Pampulha. Deve-se ainda ao europeu a sugestão do uso de azulejaria de feição portuguesa e da modenatura em granito definindo os volumes [6] .
 Há razões, assim, para que consideremos as obras da Pampulha não como o início efetivo da obra de Niemeyer ?conforme ele próprio afirma recorrentemente [7] ? mas como a confluência de ao menos duas linhas de atuação que o arquiteto vinha desenvolvendo ao longo de oito anos. É ainda sua primeira contribuição individual relevante articulando o léxico desenvolvido pelo grupo a cargo da construção do MESP.

A produção arquitetônica de Oscar Niemeyer em Belo Horizonte sempre esteve, direta ou indiretamente, ligada à figura política de Juscelino Kubitschek. E se podemos agrupar este conjunto de obras em períodos determinados, eles correspondem precisamente aos mandatos do político como prefeito da capital (1940-1945) ?indicado por Benedito Valadares – e como governador eleito do estado de Minas Gerais (1951-1955).

O primeiro grupo de obras, centralizadas sobretudo no Conjunto da Pampulha, contribuiu para a definição de uma linguagem arquitetônica que viria a ser conhecida internacionalmente como ?em>Estilo Brasileiro?[8] . O segundo grupo de obras viria a constituir a manifestação mais madura e depurada deste vocabulário, dando mostras de um encaminhamento do pensa­mento do arquiteto rumo ao que viria a ser uma mudança radical em sua prática ocorrida a partir da segunda metade dos anos 1950, com o projeto para o Museu de Caracas (1955) e com as obras de Brasília (1955-1960).

pampulha

O contato de Oscar Niemeyer com a elite política e intelectual mineira tem suas origens não apenas em sua relação com o Ministro da Educação, Gustavo Capanema, mas também em sua obra para o Grande Hotel de Ouro Preto, encomendado em 1938 por Rodrigo de Mello Franco Andrade, que criara e que presidia o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico ?atual IPHAN. As viagens constantes a Ouro Preto levavam-no a Belo Horizonte. E o caminho até Juscelino e o início de Pampulha nos descreve Oscar:

Um dia Capanema me levou a Benedito Valadares, governador de Minas Gerais, que pretendia construir um cassino no ‘Acaba Mundo? E foi nessa ocasião que conheci Juscelino Kubitschek, candidato a prefeito de Belo Horizonte. Fiz o projeto, que mostrei a Benedito, mas o assunto só foi retomado meses depois, quando JK, prefeito da cidade, novamente me convocou. No dia combinado voltei a Belo Horizonte com Rodrigo. Tornei a conversar com JK, que me explicou. ‘Quero criar um bairro de lazer na Pampulha, um bairro lindo como outro não existe no país. Com cassino, clube, igreja e restaurante, e precisava do projeto do cassino para amanhã? E o atendi, elaborando durante a noite no quarto do Hotel Central o que me pedira. [9]

É para o genro de Valadares, João Lima Pádua, que Oscar desenvolve uma residência não na Pampulha, mas na área central de Belo Horizonte. Em que pese a sua aprovação na prefeitura datar de 1943, conceitualmente, a obra constitui um elo entre as pesquisas nativistas da primeira etapa da obra de Oscar e as suas obras à beira da represa.

A casa é implantada em “C?num lote de esquina, ocupando todo o lote e voltando sua abertura para a rua, com a privacidade garantida pelo paisagismo de Burle-Marx e por uma parede de cobogós.

O pátio interno, a azulejaria de feição tradicional ?com a mesma estampa usada no Cassino, no Iate e na Casa do Baile ?emoldurada por mármore travertino e principalmente o impluvium configurado por telhado cerâmico em capa-canal conferem à obra o fundamento nativista, contrastado pela laje de concreto sob as telhas, pela marquise em “V?que marca a entrada principal e pelos panos de vidro que abrem a casa para o jardim interno.

A outra residência deste período, projetada no mesmo ano às margens da Lagoa da Pampu­lha e destinada a servir ao próprio Juscelino, lida com os mesmos elementos de modo diferente.

O lote generoso permitiu a criação de um jardim à entrada, com lago e caminho sinuoso, de modo a propiciar ao proprietário uma apreciação panorâmica da lagoa a partir da porção superior do terreno em aclive, com a necessária privacidade. O telhado em “V?mostra-se perpendicular ao eixo central da casa, cobrindo a entrada da garagem, a varanda de entrada e a área social, ligada por mezanino a meio-nível à área íntima ?implantada acima, acompanhando a topografia dos fundos do lote.

Aqui o “C?está voltado para os fundos, encerrado pelos quartos, a um lado, e pela área de jogos e acomodações dos empregados, a outro. A cozinha e área de serviço interpõem-se entre as três salas e o pátio, de uso exclusivamente íntimo. A caixilharia em madeira esmaltada dos quartos, o revestimento da empena frontal em paus-roliços e a própria implantação da casa revelam algum parentesco com as obras de feição nativista da primeira fase do arquiteto, como sua residência na Lagoa Rodrigo de Freitas (1941) ou a residência de Francisco Peixoto em Cataguazes (1941), mas o mezanino revestido em madeira, a cobertura em laje plana, o amplo pano de vidro frontal e o próprio dinamismo do conjunto representam um passo definitivo rumo à síntese que se estabelecia nas demais obras da Pampulha.

Talvez a obra que melhor expresse esta nova síntese seja o Cassino. Implantada numa península, a obra divide-se em três blocos interligados e funcionalmente bem definidos: um bloco principal, de jogos, o restaurante e pista de dança em forma de pêra avançando sobre a lagoa, e o bloco de serviços discretamente atendendo aos dois. A imagem do conjunto é a de volumes elevados sobre pilotis e, de fato, uma malha regular de colunas permeia todos os espaços. Entretanto, o bloco principal ?destinado aos jogos ?é implantado no solo, e neste nível aberto em pano de vidro. Toda alvenaria do térreo é revestida em azulejos de feição tradicional portuguesa, complementando a leveza e trans­parência que ressaltam a regularidade dos volumes acima. A composição principal da fachada de entrada repete o motivo do estudo do MESP de C­orbusier para o aterro do Flamengo, refletindo a alteração de pé-direito interna em composição assimétrica, onde a excentricidade da marquise de entrada é balanceada por uma ampla parede de espelhos interna. Visto da lagoa, o volume curvo do restaurante desdobra-se numa curva senóide abrindo a possibilidade de se descer diretamente aos jardins externos, projetados por Burle-Marx.  Duas esculturas pontuam os acessos frontal e de fundos, complementando a composição arquitetônica. A obra é plena de elaborados detalhes de acabamento, com uma paleta de revestimentos que vai da peroba-do-campo (revestindo os bastidores do palco do restaurante) ao aço inoxidável (nas colunas e corrimãos internos), passando pelo alabastro (nas rampas e parapeitos dos mezaninos). As esquadrias do salão principal são moduladas em estreito ritmo vertical (50cm), de modo a realizar com suavidade as curvaturas que conformam os fechamentos ?numa provável referência à corbusiana Villa Savoye (1929).

A sintaxe que havia sido desenvolvida no MESP converte-se em leitmotiv não apenas para esta obra, mas também para o Iate Clube. É o volume puro, aberto em pano de vidro e definido com moldura e empena em pedra, elevado do solo por uma colunata sobreposta a panos de vidro e a paredes curvas revestidas em azulejos decorados, o uso abundante de cores, a integração ao paisagismo de Burle-Marx e o uso de protetores solares como brises e cobogós.

O volume do Iate, com a cobertura em “V?avança sobre a água, configurando sob si uma garagem de barcos. Aqui as colunas são ovais e a dureza da modulação das esquadrias a leste é amenizada por um pano de brises móveis que protegem a varanda oeste. Esta prolonga-se num terraço sobre a lagoa, complementando o amplo salão do segundo pavimento, dividido em duas partes não apenas pelo rincão central como por uma ?demolida ?parede acústica curva. O contraste com a ampla abertura norte do salão é dado ao sul, pela empena cega revestida em granito que marca a entrada ao edifício.
Se nos dois exemplos anteriores Oscar demonstra sua habilidade no trato desta linguagem, sua manipulação chega aos limites nos trabalhos seguintes.
Na Casa do Baile, restam apenas as formas curvas térreas ?dois círculos interpenetrados ? em vidro e paredes revestidas por azulejos, associadas a colunas revestidas em granito. A laje de cobertura, em lugar de dar o contraponto reto à fluidez abaixo, acompanha-as de modo inédito, alongando-se pela margem até o extremo da pequena ilha em que se implanta, arrematada por um pequeno palco ao ar livre. A fluidez da laje é dada pela altura constante de seu topo em 30cm, ocultando uma grelha no vão interno e lajes maciças com vigas invertidas transversais na marquise externa.
 A variação por meio na cobertura é a tônica da composição da igreja de São Francisco de Assis. Projetada em 1943 (dois anos após as primeiras obras), e recuada de suas visadas, a pequena obra é, talvez, a mais célebre do conjunto.

Sua excepcionalidade deve-se precisamente à comunhão coerente, clara, de manieras, de artifícios estilísticos, estruturais e funcionais os mais diversos. No que nos concerne, se na Casa do Baile o volume elevado dobra-se ao sabor das curvas abaixo, aqui ele curva-se em parábolas até o chão, prescindindo quase que totalmente de pilares deslocados. O mesmo detalhe dos brises do Iate é usado sobre a entrada, de modo a proteger-lhe o Coro ?implantado de modo tradicional. A torre sineira também traz alguma semelhança com composições vernaculares luso-brasileiras, e liga-se por uma leve marquise inclinada à entrada, revestida do mesmo granito das demais obras e harmonizada com o acabamento de topo de todas as parábolas.

A composição parabólica gera recorrentes debates acerca de sua suposta contradição estrutural, como se deste jogo complexo se cobrasse a coerência e simplicidade fabril dos galpões de Casablanca de Perret (1915) ou do Salão do Cimento, de Maillart (1939). O estudo do projeto estrutural de Joaquim Cardozo [10] revela-nos que a cobertura da nave não foi concebida como arco de compressão pura, até porque várias cargas concentradas ?do coro e da marquise, por exemplo ?impedem-lhe este funcionamento. De fato, as pequenas abóbadas da sacristia são travadas por vigas-tirante e des­ca­rregam em pilares verticais ocultos pelo tímpano ao fundo e pela parede revestida em vidro jateado à frente. O vidro revestindo a parede é outro artifício aparentemente contraditório que, na verdade, harmoniza a leitura frontal do conjunto, por analogia com o pano de entrada.

Internamente, as formas livres comparecem na parede baixa do batistério, dando lugar aos bronzes de Ceschiatti ao mesmo tempo em que auxiliam na preservação da nave sem bloquear a integração visual com a lagoa ?efeito reverso da longitudinalidade forçada pela planta trapezoidal. O suave deslocamento entre este trapézio e a abóbada ortogonal do altar ilumina o painel de Portinari ao fundo, dispensando, por seu efeito cênico, esforço artístico maior que o afresco.  A azulejaria de feição portuguesa aqui converte-se ?como no MESP ?em elemento decorativo especialmente elaborado por Portinari para o reverso do batistério e para pequenas plataformas que preservam a circulação onde a altura é impeditiva. O tímpano externo complementa o jogo unitário, onde o outrora rígido granito se curva para emoldurar o painel do artista.

Neste exuberante contexto, comumente considerado como o Conjunto da Pampulha, a pequena sede do Golfe Clube ?hoje dentro do jardim zoológico ? apartada das margens da represa, passa despercebida. Ali Oscar executou pela primeira e única vez a composição entre impluvium e abóbada, originalmente pensada para a residência Oswald de Andrade. A patente qualidade inferior do edifício deve-se a uma execução deficiente, à ausência do tratamento de materiais presente nas demais obras, à fragmentação interna da planta ?que acaba por converter o contraste entre diagonais e curva num débil reflexo superficial da idéia original ?e à inexecução ou descaracterização total de um paisagismo coerente. Além da composição geral, resta de íntegro o detalhamento dos brises, em fibrocimento emoldurado por cantoneiras de aço pintadas, como nas demais obras. Cabe, seguramente, criteriosa restauração do edifício segundo os princípios originais do autor de modo a torná-lo significativo dentro de sua potencialidade. Não é simples manutenção, mas demolição de excessos e rearticulação do desenho urbano e do paisagismo adjacentes.

Por um lado, as obras descritas rearticulam através do desenho elementos das culturas nacional e universal, desempenhando crucial papel na unificação do debate entre raciona­lismo e organicismo que vinha tomando conta da crítica européia e nacional. A hábil manipulação de elementos formais e princípios compositivos funcionalistas em conjuntos sintéticos simplesmente superava a suposta dicotomia que vinha se estabelecendo no panorama da arquitetura moderna [11]. Por outro lado, as obras acabam firmando não apenas em Belo Horizonte, mas em todo o Brasil, a associação da arquitetura moderna ao mecenato estatal e seu uso como instrumento de propaganda política e manipulação das massas. Era o aceno à população com a imagem de desenvolvimento e renovação encarnadas em ícones significativos ?como o conjunto da Pampulha ?e mascarando políticas de manutenção de um sistema patriarcal. Afinal, dadas as destinações dos edifícios, Pampulha era um afago às elites mineiras [12].

Dentro do campo estrito da Arquitetura, Pampulha representa um marco pela liberdade com que se manipulavam elementos formais ?pilotis, panos de vidro, planta livre etc ?habitualmente ligados a correntes de pensamento ideológico e de renovação social bastante definida. Muito embora as obras em si tenham qualidade plástica indiscutível, a leitura destes preceitos como código formal, como design estrito, acaba por fornecer subsídios para o estabelecimento de uma tradição academista ?ou copista ?da arquitetura moderna no Brasil. [13]

O meio pelo qual estas obras ganharam n­otoriedade internacional ?sobretudo a e­xposição Brazil Builds, no MoMA de Nova Iorque ?tampouco contribuiu para o entendimento da arquitetura moderna como potencial instrumento de renovação social per se, em lugar de ser apenas ícone desta mudança. Fato é que esta linguagem formal ?articulando formas livres, paisagismo exuberante, azulejos, cores vivas, brises, cobogós, fachadas inclinadas, abóbadas em concreto, juntamente a outros elementos próprios da arquitetura moderna e­uropéia ?acabou notabilizando-se internacionalmente não como fruto da renovação econômica pela qual o Brasil passava, mas como um estilo ?em que pese o apelo de Corbusier [14]. Um estilo brasileiro [15].

a maturidade do estilo brasileiro de oscar

Durante o restante da década de 1940, Oscar depura o vocabulário estabelecido a partir das experiências do MESP e da Pampulha. C­­onfor­me ele próprio relataria em seu texto Considerações sobre a arquitetura brasileira, de 1957:

procurou-se, então, acompanhar a técnica do concreto armado nas suas possibilidades atuais de grandes vãos, e conseqüente redução de apoios. Assim, nas grandes estruturas o problema geralmente se fixa na transição das colunas, isto é, nos andares normais os apoios se aproximam de forma a poderem ficar embutidos nas paredes (…), distanciando-se no pavimento térreo. [16]

Passa, além disso, a adotar soluções mais elaboradas nos materiais de fechamento, recorrendo a cobogós especialmente desenhados para cada projeto, sistemas de esquadrias mais complexos ?alguns agora em alumínio ? bem como uma diversidade maior de materiais cerâmicos de revestimento ?pastilhas de porcelana de diversas dimensões e cores e a franca utilização de azulejos de desenho específico para as obras.

Em 1946, Oscar é convidado por Wallace Harrison a integrar a equipe de elaboração do projeto para a sede das Nações Unidas, onde retomaria o contato pessoal com Le Corbusier. Desta experiência em diante, são patentes não apenas o gosto pelo estabelecimento mais claro de traçados reguladores clássicos, derivados do Modulor, como também a adoção de grandes vãos livres entre piso e teto paralelos e de uma maior pureza formal dos volumes elevados sobre pilotis ?presente nas experiências de Mies van der Rohe nos Estados Unidos.
Retornando Juscelino ao mando do poder executivo ?agora no governo do estado de Minas Gerais -, é encomendada a Oscar Niemeyer em 1950 a elaboração do Conjunto Governador Kubitschek, no centro de Belo Horizonte. Inicialmente, tratava-se de um grande bloco horizontal com 637 apartamentos em 22 pavimentos, diversificados em oito tipos de unidades distintas, que variavam desde o simples quarto de hotel ?nos quatro primeiros pavimentos ?até amplos apartamentos de quatro quartos, passando por uma tipologia de semi-duplex que cruza a lâmina sobre os corredores de circulação central ?ao gosto das pesquisas de Corbuiser nas Unités d’Habitation francesas. Posteriormente, simplificou-se o pilotis desta primeira torre e acrescentou-se um novo bloco vertical com 36 pavimentos e mais 437 apartamentos.

O empreendimento trazia à capital mineira a metáfora do transatlântico ?parte do ideário moderno sobretudo nos escritos de Le Corbu­sier, desde os anos 20. Era o edifício com células individuais mínimas, complementado por uma ampla rede de serviços e equipamentos comuns ?como lavanderia, restaurante, limpeza, comércio e lazer. Se hoje em dia esta proposta é cada vez mais difundida nos apart-hotéis, ela encontrou resistência na sociedade da época. Some-se a isto o lento processo de construção ?21 anos ?e o resultado foi um edifício com estrutura imobiliária tradicional, inserido num contexto urbano degradado e inseguro. O Conjunto ganhou notoriedade pela baixa qualidade de vida de seus habitantes e pelo descuido com sua limpeza e aparência. Somente a partir dos anos 90 estabeleceram-se reais diretrizes de recuperação dos prédios, que vêm pouco a pouco recobrando o brilho de seu élan original.

Plasticamente, o conjunto é composto pelos prismas impecavelmente uniformes elevados sobre pilotis, com empenas cegas e panos de vidro modulados em quadrados segundo sua subdivisão interna de 3.16m.  O pilotis do bloco “A??o horizontal ?apresenta a única solução do arquiteto de “pilares em W? agregando as cargas de três módulos cada um, e dispensando vigas de transição. As lajes e fechamentos deste pavimen­to serpenteiam em formas livres, den­tro da corbusiana lógica do estilo brasileiro, demons­trando sua independência em relação à estrutura. Ressalve-se, entretanto, que a escala excessivamente avantajada do conjunto impede não apenas a apreensão de sua leveza na com­po­sição plástica de conjunto como também endurece a leitura de suas formas livres térreas [17].
 Se o Conjunto JK tinha por lógica de implantação o recuo dos afastamentos, criando um jogo de volumes independente do tecido urbano adjacente, a estratégia de assentamento do Edifício sede do Banco Mineiro da Produção (1953), na Praça Sete de Setembro, acompanhava o alinhamento dos blocos vizinhos, ocupando integralmente o lote de esquina a 45 graus. Aqui o jogo plástico central reside no arredondamento da quina oblíqua, de modo a dotar a fachada de uma continuidade que ressalta a interrupção dos brises horizontais do pano nordeste em simples pele de vidro precisamente no vértice. Este sutil jogo compositivo é complementado pela partição áurea do ritmo dos brises em sua progressão vertical ?a qual, curiosamente, não correspondente à ocupação dos seis primeiros pavimentos pela administração do banco.

No térreo, abaixo de uma marquise, a circulação da agência bancária é regida por uma rampa elíptica que faz as vezes das usuais formas livres, enquanto nos pavimentos de escritórios da torre acima a rigidez da modulação das salas é atenuada por um irregular fechamento destas em tijolos de vidro iluminando o hall interno. Em seu conjunto, o edifício aparenta ter clara ascendência no Edifício Montreal, em São Paulo, do próprio Oscar (1950), e sua concavidade parece complementar, na mesma praça, o edifício Clemente Faria, de Álvaro Vital Brazil (1951).

No mesmo ano (1953), o arquiteto projeta a residência Alberto Dalva Simão, na Pampulha. A sua estratégia de implantação repete aquela usada no mesmo ano em sua casa de Canoas (RJ), com a parte social articulada em generosos panos de vidro retilíneos ligando a área de serviço ao ambiente de estar, disposto em forma livre. O volume dos quartos, ortogonal e no nível inferior, compensa o desnível do terreno, aparecendo enterrado ao visitante que se aproxima pela varanda acima, aberta para a vista. Cobrindo o conjunto, uma laje recortada em poligonal de bordas arredondadas estabe­lece a continuidade espacial e leveza próprias da análoga carioca e de seu fluido antecedente primordial: a Casa do Baile. A pesquisa com as formas livres em planta tem seu desdobramento definitivo nos dois projetos que Oscar realiza, nos anos seguintes, para a Praça da Liberdade ?sede histórica do governo do estado e de suas secretarias: o Edifício Niemeyer e a Biblioteca Pública Estadual.

O primeiro, residencial, de perímetro curvo e irregular, está implantado na esquina da praça com a avenida Brasil ?uma das principais da área central da cidade ? recobrindo-se integralmente por brises horizontais de largura variável. A torre de 11 pavimentos abriga em seu interior dois apartamentos por andar, compartimentados de modo radial, quase ortogonal, deixando a compatibilização com as curvas por conta das circulações e áreas molhadas. Mais formas livres fecham as áreas de cobertura e a pequena entrada no pilotis, este totalmente integrado à praça adjacente e marcado pela presença de massivos pilares espaçados em ritmos regulares ?o que cobra um vigamento de transição de quase dois metros de altura, de modo a conciliar este ritmo com a irregularidade dos pilares embutidos nas paredes do pavimento tipo. O ritmo dos brises ?dividindo a altura do pavimento em três ?uniformiza a sinuosidade da fachada, ora fechada em panos de vidro, ora fechada em alvenaria revestida por azulejos criados por Athos Bulcão. A implantação da torre em forma livre inscrita em lote triangular certamente deve ascendência à torre projetada por Mies van der Rohe para Berlim em 1922. Ressalve-se, entretanto, que enquanto este pesquisava a transparência e jogo de reflexos do vidro, o arquiteto brasileiro pesquisava a variação do jogo de sombras na fachada. [18] Pesquisa que já iniciara anteriormente no Edifício Copan ?em São Paulo (1950) ?e mesmo na sede do Banco Mineiro da Produção, em Belo Horizonte.

Enquanto este prédio ignora o então cinqüentenário entorno eclético de seis pavimentos, afirmando-se como volume puro na paisagem, sem caracterização de frente ou fundos, a Biblioteca Pública Estadual, implantada junto à Avenida Bias Fortes e à tradicional rua da Bahia, é disposta num bloco em “S?recuado da praça, abrindo um generoso afastamento frontal – e respeitando-lhe o gabarito. A relação frente-fundos estabelecida leva à localização assimétrica posterior do volume oval revestido em brises horizontais, com auditório e áreas de apoio ao acervo presente no bloco curvo. Uma generosa marquise em formas livres ?jamais construída ?abrigaria um desembarque coberto junto à praça, harmonizando mais uma vez o térreo a outra marquise análoga do terraço-jardim da cobertura ?tampouco construída, bem como o terceiro pavimento do bloco em “S? Embora a extensão dos fechamentos propostos impeça-nos de qualificar o térreo como pilotis, a sua transparência e a exposição dos pilares ?como no Cassino ?são análogos a este tipo de recurso pela transparência.

Em que pese não seja cronologicamente o último edifício deste recorte da obra do autor, a expressão mais próxima da mudança de postura que se avizinhava com a construção de Brasília talvez seja o Colégio Estadual Central (1954). Projetado e construído já após a viagem do arquiteto à Europa (1953), em meio aos ataques que a crítica nacional despejava sobre a obra do arquiteto na revista Habitat [19], o conjunto de edifícios do Colégio faz tabula rasa do quartel anteriormente existente no local, demolindo todo o quarteirão de modo a implantar os edifícios com o afastamento necessário das ruas, permitindo-lhe a completa apreensão dos volumes puros ?o que de fato ocorreria caso o muro original do quartel houvesse sido demolido.

O principal bloco, destinado às aulas, ergue-se sobre o pilotis do recreio coberto sobreposto ortogonalmente ao térreo bloco da adminis­tração e devidamente distanciado do auditório curvo e da cantina, autônomos. A forma variável dos pilares do bloco de aulas sugere a presença de um pórtico rígido com vigas invertidas na cobertura, atirantando a laje de piso de modo a reduzir-lhe o vão. Aqui a pureza formal dos volumes é suavizada por sua escala humanamente reduzida e pela diversidade de cores e materiais de fechamento ?cobogós, tijolos, esquadrias – caras ao arquiteto desde suas pequisas nativistas. Os vãos ainda modestos dos anos 40 ?que oscilavam entre 3m e 5m ?nesta obra atingem os 8,5m sem comprometimento da leveza das vigas ou da espessura da laje. O sistema de esquadrias, feito artesanalmente em aço nas obras anteriores, finalmente atinge a maturidade industrial que a caixilharia em alumínio proporciona. A negação corbusiana da malha urbana, presente nas torres anteriores ou mesmo na Biblioteca, aqui revela-se plenamente desenvolvida em escala no generoso paisagismo de Burl-Marx. É a síntese marcante de um período de transição que talvez só encontre paralelo nas primeiras obras de Brasília ?o Palácio da Alvorada e o Brasília Palace Hotel.

As curvas presentes nestas quatro últimas obras permitem-nos inferir a introdução de uma nova modenatura, ou de um novo sentido de regras compositivas. Interessam não apenas a regularidade clássica presente nos paralelepípedos elevados sobre um ritmo regular de pilotis, mas também um novo sentido de beleza no lançamento das curvas em si, levando a uma qualificação dos elementos lançados através da composição com curvas irregulares. Com fonte provável nas formas cubistas de Picasso, passando pela produção pós-guerra de Le Corbusier, as formas livres de Oscar ganham aqui uma unidade na composição por meio de uma poligonal primária ?também feita em curvas de grandes raios -, arrematada por curvas de raios menores nos vértices [20].

Esta manipulação de formas provenientes da Pintura e Escultura em elementos arquitetô­nicos representava precisamente a maturidade da capacidade de manipulação formal a­bstrata demonstrada na Pampulha, análoga ao pensa­mento de Mies van der Rohe, em sua obra americana (1940-1960). O mestre alemão aludia a uma ordem industrial abstrata dominante, própria da cultura americana, que acabou por estabelecer uma nova tradição de arranha-céus naquele país. Edifícios como o Crown Hall (1950) eram a depuração definitiva do léxico moderno de vertente alemã, onde a unidade e a ordem eram expressadas através na estrutura e seus sub-módulos. Oscar apresenta aqui uma resposta à uniformidade que esta expressão gerava, articulando mais elementos e de modo mais livre, conforme ele mesmo nos explica, em 1957:

Quando se trata de “unidade arquitetônica? é comum o apelo a uma arquitetura discreta e sóbria, solução simplista que a muitos ocorre, no esquecimento da impossibilidade de impedir a alguns arquitetos esse estado de inquietação e procura, responsável pelo progresso e prestígio de nossa arquitetura. [21]

E mais:

Exigem, por exemplo, que as soluções se contenham em plantas simples e compactas, visando a volumes puros e geométricos ?solução que às vezes adoto, mas que não aceito como dogma ?e para isso acomodam, dentro dessas formas pré-estabelecidas, programas complexos que exigiriam, justamente para atender as razões funcionais, que tanto defendem, partidos diferentes e recortados. E assim, para manter o purismo desejado, o purismo aparente, criam o verdadeiro forma­lismo, o formalismo mais grave e inconteste, porque não se resume na especulação plástica de elementos estruturais da arquitetura, nas no seu próprio desvirtuamento, no que ela apresenta de básico e funcional por excelência [22].

Este alerta de Oscar [23] é útil sobretudo à recente e recorrente reabilitação do patrimônio Moderno no Brasil como fonte puramente formal para a prática projetual atual. Evita-se assim a iconolatria e o clientelismo ocultos sob o véu da autoridade herdada na cópia da forma pura, e não conquistada na qualidade edilícia. Destacamos aqui o valor e importância da atuação de Niemeyer como arquiteto que dialogava nacional e internacionalmente com outras correntes de pensamento arquitetônico, e que soube, para realizá-lo, aproveitar-se de sua relação de proximidade com o político Juscelino ?sem demérito nisso [24].  Esta dependência do patriarcalismo não deve, em absoluto, ser trazida para o âmbito da Arquitetura.

A herança maior que Oscar nos deixa não está na cópia indiscriminada de sua prática e estratégia profissional individual, mas sim, como sugere Comas25, na independência e no diálogo aberto de nosso pensamento e arquitetura com seus correspondentes mundiais.

notas

1.     Este material foi recolhido e sistematizado quando da elaboração do trabalho A matéria da invenção: criação e construção das obras de Oscar Niemeyer em Minas Gerais. (MACEDO, 2002). Trata-se de um desdobramento do texto elaborado para o seminário Pampulha: Por uma arquitetura brasileira, realizado em Belo Horizonte pela Fundação Roberto Marinho, ao qual fomos convidados pelo historiador Hugo Segawa através do Docomomo. Em prol da necessária concisão apresentamos aqui material referente apenas às obras projetadas por Oscar Niemeyer com reconhecida autoria e qualidade, deixando de lado diversas outras apenas projetadas, mas não executadas ou de autoria duvidosa, bem como as que se situam em período posterior às obras de Brasília (1955).
2.     NIEMEYER, 1960. p.5.
3.     Como exemplos deste viés nativista podemos destacar:
. Grande Hotel, Ouro Preto, Minas Gerais. 1938. In GOODWIN, 130-131;
. Residência M. Passos, Miguel Pereira, Rio de Janeiro. 1939. in PAPADAKI, 1950. p.20-21;
. Residência Cavalcanti, Rio de Janeiro. 1940. In GOODWIN, 1943. p.163-164;
. Residência Francisco Peixoto, Cataguazes, Minas Gerais. 1941. in PAPADAKI, 1950. p.118;
. Residência Oscar Niemeyer, Rio de Janeiro. 1942. In GOODWIN, 1943. p.166;
. Residência Johnson, Fortaleza, Ceará. 1942. in GOODWIN, 1943. p.169;
4.     Cf. COSTA, 1995.
5.     Cf. Afastamento temporário de Lúcio Costa in LISSOVSKY et al., 1996. p.151 a 156. Em entrevista a nós concedida por Marco Paulo Rabello em 28 de março de 2002, o engenheiro afirma que o acompanhamento das obras a partir de 1938 foi feito sobretudo por Oscar Niemeyer.
6.     Cf. COSTA, Lucio. Presença de Le Corbusier ?entrevista concedida a Jorge Czajkowski, Maria Cristina Burlamaqui e Ronaldo Brito em 1987. in COSTA, 1995. p. 146-147.
7.     Cf. NIEMEYER, 1998. p.260, p.ex.
8.     Conforme nos diz Zilah Deckker, sobre a exposição Brazil Builds realizada no MoMA, em Nova Iorque, organizada por Phillip Goodwin em 1943: “In spite of Goodwin’s caution not to label it, the ‘Brazilian Style?came to be known through the illustrations in ‘Brazil Builds? its seemingly regional image was seen as the expression of necessity. ‘Brise- soleils, pilotis, azulejos,?and the tropical landscape became the icons of the style. According to most contemporary interpretations, the ‘Brazilian Style?expressed a stage forward in the maturity of the Modern Movement.?In: DECKKER, 2001. p.160-161.
9.     NIEMEYER, 1998. p.93.
10.     Cf. CARDOSO, Joaquim, MOREIRA, Ruy. Igreja de São Francisco de Assis ?Pampulha ?MG ?projeto estrutural. IPHAN/DID/Arquivo Noronha Santos ?Mapoteca 1, Gaveta 8, ANS 00851 a ANS 00857 e ANS 00909 a ANS 00918. Jun./Set. 1943. 15 pranchas (originais a lápis). Fac-símile constante no Anexo E de MACEDO, 2002.
11.     A respeito deste debate, informa-nos Joaquim Cardozo: Cada artista, à hora presente, possui o seu slogan, rotula as obras que compõe com a etiqueta correspondente a uma pseudo-pesquisa ?numa associação, quase sempre inexata e improcedente, com pesquisas científicas. Ao lado de legítimas sensibilidades de artista floresce então uma legião de aventureiros pouco escrupulosos, levados pela ambição de aparecer, muitos deles exercem uma arte efeminada, uma espécie de haute couture para fins imediatos e passageiros. No campo da arquitetura essas mesmas manifestações tomam a forma de discursos estéreis e ingênuos em torno de racionalismo, organicismo, funcionalismo, etc., num desconhecimento evidente e lamentável do significado destas palavras e de seu exato sentido histórico e filosófico. Para assinalar o absurdo e a improcedência de tais especulações basta citar aqui as palavras do arquiteto Lúcio Costa respondendo a um inquérito da revista Guanabara: ?Toda arquitetura digna do nome é a um tempo orgânica e racional?, – evidentemente. Mas, no meio destas contradições e incertezas, mesmo no centro desta confusão de conceitos e diretrizes é que surge a semente de idéias mais válidas e convincentes. In CARDOZO, 1963. p.3.
12.     Para um desenvolvimento deste tema, particularmente relacionado a Belo Horizonte, cf. MONTE-MÓR, Roberto Luis de Melo (Coord.). Belo Horizonte: a cidade planejada e a metrópole em construção. In: ____. Belo Horizonte: espaços e tempos em construção. Belo Horizonte: PBH/CEDEPLAR/PBB, 1994. p.11-28.
13.     Argumento de Luiz Alberto do Prado Passaglia em PASSAGLIA, 1995. p.196-202.
14.     Referimo-nos à epígrafe: “A arquitetura não tem nada a ver com os “estilos? constante nos Três lembretes aos senhores arquitetos. em LE CORBUSIER. Por uma arquitetura. 3ed. Trad. Ubirajara Rebouças. São Paulo: Perspectiva, 1981. A primeira edição do original data de 1923.
15.     Trata-se de diagnóstico atestado pelo próprio Oscar, in NIEMEYER, 1946.
16.     NIEMEYER, 1957.
17.     Cf. BRUAND, 2002. p.166.
18.     Semelhança também apontada por Bruand em BRUAND, 2002. p.161.
19.     Conforme explicamos em MACEDO, 2002. p.90-130, somos levados a crer que a presença de Walter Gropius, Ernesto Rogers e Max Bill no país, bem como o debate público levantado pelo grupo foram orquestradas pelo corpo editorial da revista paulista ?também a cargo da seleção do júri da Bienal de Arquitetura.
20.     Joaquim Cardozo explica: (…)atingimos nos tempos que correm a um critério de molduração ou de modenatura, que julgo desde agora necessário assinalar; uma modenatura não mais utilizando congruências de linhas retas e paralelas, ou arranjos e justaposições de prismas retos, como se fazia por volta das três primeiras décadas deste século, mas uma molduração mais intrínseca às linhas, superfícies e volumes que constituem o espaço arquitetônico e se define no emprego dos campos de tangência, de curvatura, ou de contatos de ordem mais elevada entre aqueles seres geométricos. In CARDOSO, 1963. p.3.
21. NIEMEYER, 1957. p.5.
22. NIEMEYER, 1960 p.4.
23. Convém ressaltar aqui o que nos informa Hugo Segawa: na segunda metade dos anos de 1950 [e primeira metade dos anos de 1960], engajado nos projetos dos palácios de Brasília, o arquiteto publicou uma série de artigos na revista Módulo, que podemos considerar entre as mais importantes manifestações por escrito de um arquiteto moderno brasileiro. In SEGAWA, 1999. p.143. Embora deva-se levar em conta a fundamental colaboração de Alberto Xavier [XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração. São Paulo: Pini, 1987. 389p.] é de se sentir a ausência de uma compilação sistemática dos textos constantes no debate dos anos 1950-1960.
24.    Cf. BRITO, Ronaldo. Fluida modernidade. In NOBRE et al., 2004. p.254.: Brasília (…) é uma obra indispensável para o entendimento do Brasil estético moderno. Aquilo é a síntese mais estapafúrdia, mais inesperada, entre o patriarcalismo arcaico de uma nação onde o povo nunca apitou (para falar português claro) e uma vanguarda estética que encontrou seu lugar por meios institucionais e conseguiu produzir uma modernidade desinibida, quase desenfreada.
 25.  Cf. COMAS, Carlos Eduardo Dias. A arquitetura de Lucio Costa, uma questão de interpretação. In NOBRE et al., 2004. O autor refere-se especificamente a Lucio Costa.

referências bibliográficas

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MACEDO, Danilo Matoso. A matéria da invenção: criação e construção das obras de Oscar Niemeyer em Minas Gerais. 1938-1954. Belo Horizonte: Escola de Arquitetura da UFMG, 2002. 2vol. (Dissertação de Mestrado)
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referências iconográficas

RESIDENCIA JOAO LIMA PADUA
Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
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RESIDENCIA JUSCELINO KUBISHEK
Desenhos técncicos de Danilo Matoso a partir de:
DOLABELLA, Jayme Gouvea. Projeto de aprovação junto à Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, 11 set. 1948. 4 pranchas (original).
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Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
GRZYBOWSKI, Zenobia e PERILO, Maria Carmem. Museu de Arte ?Pampulha ?B.H. ?restauração e adequação ?Diagnóstico. Belo Horizonte: Arquivo Particular da Século 30 Arquitetura e Restauro, jun.1994. 8 pranchas (original).
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IATE CLUBE DA PAMPULHA
Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
L’ARCHITECTURE D’AUJOURD’HUI. Brésil [número especial sobre o Brasil]. Paris. v.18 n.3-14, set. 1947. p.30.
 GOODWIN, Philip L. Brazil Builds: architecture new and old 1652-1942. New York: Museum of Modern Art, 1943. p.190

IGREJA DE SAO FRANCISCO DE ASSIS
Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
CARDOSO, Joaquim, MOREIRA, Ruy. Igreja de São Francisco de Assis ?Pampulha ?MG ?projeto estrutural. IPHAN/DID/Arquivo Noronha Santos ?Mapoteca 1, Gaveta 8, ANS 00851 a ANS 00857 e ANS 00909 a ANS 00918. Jun./Set. 1943. 15 pranchas (originais a lápis).
LIMA, Félix Geraldo. Igreja de São Francisco de Assis: Pampulha: levantamento. Belo Horizonte: Prefeitura de Belo Horizonte, 1985 (5 pranchas) In: PUCCIONI, Silvia. Igreja de São Francisco de Assis – Anamnese Estrutural. Belo Horizonte: IPHAN/MG ?DEPROT ?Coordenação de Conservação, jun.1999. 14p.

CASA DO BAILE
Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
BARBOSA, Ana Aparecida. Casa do Baile ?Pampulha ?levantamento arquitetônico. Belo Horizonte: Arquivo Particular da A e M Arquitetura, Urbanismo, Interiores e Consultoria, 1999. 6 pranchas (formato eletrônico DWG)
GOODWIN, Philip L. Brazil Builds: architecture new and old 1652-1942. New York: Museum of Modern Art, 1943. p.188
 MENEZES, Ivo Porto, PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Levantamento cadastral. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte ?Secretaria de Cultura ?Departamento de Patrimônio, jan.1979. 4 pranchas. (cópias heliográficas).

GOLFE
Desenhos técnicos de Hélvio Franco e Danilo Matoso
a p­ar­tir de:
 L’ARCHITECTURE D’AUJOURD’HUI. Brésil [número especial sobre o Brasil]. Paris. v.18 n.3-14, set. 1947. p.39.

CONJUNTO GOVERNADOR KUBITSCHEK
Desenhos técnicos de Hélvio Franco e Danilo Matoso
a partir de:
CONJUNTO Governador Kubitschek. Arquitetura e Engenharia. Belo Horizonte, nº28, p.10-43, 1953.
NIEMEYER, Oscar. Conjunto Governador Kubitschek. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, referência: 009 033 000 e 009 036 000, 28 ago. 1953. 33 chapas (06 microfilmes).
______. CGK – Conjunto Governador Kubitschek. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos,  28 ago.1953. 11 pranchas (original).

EDIFICIO SEDE DO BANCO MINEIRO DA PRODUÇÃO
Desenhos técnicos de Hélvio Franco a partir de:
NIEMEYER, Oscar. Modificações Internas no prédio existente no lote 7, quateirão 7 da 1ª seção urbana. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, 11 ago.1957. 14 pranchas (original).
 PAPADAKI, Stamo. Oscar Niemeyer: works in progress. New York: Reinhold, 1956. p.62.

RESIDENCIA ALBERTO DALVA SIMAO
Desenhos técnicos de Priscilla Nogueira e Danilo Matoso a partir de:
NIEMEYER, Oscar. RADS ?Residência lotes 16-18 e 20 – quarteirão 37 ?bairro São Luiz ?Pampulha ?Zona Sul [sic]?Belo Horizonte ?M. Gerais . Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, referência: 307 037 016,018, e 020 ?14 01626 ?036573. 30 ago.1954. 06 chapas (microfilme).

EDIFICIO NIEMEYER
Desenhos técnicos de Danilo Matoso e Hélvio Franco
a partir de:
NIEMEYER, Oscar. AJA ?Edifício de apartamentos ?quarteirão n.1 da 4ª Secção Urbana ?Belo Horizonte . Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, referência: 004 001 000 ?01 04060 – 04870. 15 out.1954. 17 chapas (microfilme).
_______. AJA ?Edifício de Apartamentos ?quarteirão n.1 da 4ª Secção Urbana ?Belo Horizonte . Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Arquivo da Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, 15 out.1954. 13 pranchas. (original)
 SOUZA, Sérgio Marques.Edifício Niemeyer: fôrmas do 11o. teto. Belo Horizonte: Arquivo da Construtora Waldemar Polizzi, 22 fev. 1955. 1 prancha (cópia heliográfica)

BIBLIOTECA PUBLICA ESTADUAL
Biblioteca Estadual Luiz de Bessa
Desenhos técnicos de Danilo Matoso a partir de:
BGL: Escritório de Arquitetura, Departamento de Obras Públicas do Estado de Minas Gerais. Biblioteca Estadual Professor Luiz de Bessa: diagnóstico. Belo Horizonte: Arquivo Particular da B & L Arquitetura. ago.1996. 5 pranchas (arquivos digitais em formato DWG)
 NIEMEYER, Oscar. BEMG ?Biblioteca Estadual de Minas Gerais ?Belo Horizonte. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Secretaria Municipal de Cultura ?Departamento de Patrimônio. 27 mar.1954. 9 pranchas (arquivos digitais em formato TIF)

COLEGIO ESTADUAL CENTRAL
Escola Estadual Milton Campos
Desenhos técnicos de Hélvio Franco e Danilo Matoso a    partir de:
LINS, Ulisses Vanucci. Colégio Estadual Central ?Escola Estadual Milton Campos ?levantamento arquitetônico. Belo Horizonte: IEPHA/MG ?Arquivo, abr.1994. 2 pranchas. (cópia heliográfica).
 PAPADAKI, Stamo. Oscar Niemeyer: works in progress. New York: Reinhold, 1956. p.156.

danilo matoso macedo (1974)
Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 1997), Mestre em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 2002), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP, 2004). Foi professor de projeto arquitetônico na Escola de Arquitetura da UFMG (2003) e no Curso de Arquitetura e Urbanismo do UniCEUB – Brasília (2003-2005). É Arquiteto da Câmara dos Deputados desde 2004. Participa de concursos nacionais e internacionais, tendo recebido premiações em diversos deles. Possui escritório próprio desde 1996

contato: correio@danilo.28ers.com | www.danilo.28ers.com

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Sede da FHE - DFDanilo Matoso | Elcio Gomes | Fabiano Sobreira |Newton Godoy
Filipe Montserrat | Daniel Lacerda

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