Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com Thu, 29 Aug 2024 22:06:38 +0000 pt-BR hourly 1 //i0.wp.com/28ers.com/wp-content/uploads/2023/09/cropped-logo_.png?fit=32%2C32&ssl=1 Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com 32 32 5128755 Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2024/08/29/hospital-veterinario-escola-da-unileao/ //28ers.com/2024/08/29/hospital-veterinario-escola-da-unileao/#respond Thu, 29 Aug 2024 22:04:41 +0000 //28ers.com/?p=18083 Continue lendo ]]> Por Lins Arquitetos Associados
6 minutos

Hospital Veterinário Escola da Unileão (texto fornecido pelos autores)

O Hospital Veterinário Escola da Unileão é um equipamento pertencente ao curso de medicina veterinária do centro universitário Unileão. Ele tem como objetivo atender animais de pequeno e grande porte da região, além de capacitar os alunos através da prática das atividades, sempre sob supervisão dos professores.

Fotografias: Joana França

O equipamento funciona 24 horas por dia e conta com um grande programa contendo setores de urgência, clínicas, exames laboratoriais e de imagem, internação, centro cirúrgico e fisioterapia, tudo isso para pequenos e grandes animais, o que reflete diretamente nos fluxos e no dimensionamento do edifício. Para além da prática, ou seja, do atendimento direto aos animais, o equipamento também conta com um grande centro de ensino e pesquisa, com diversos laboratórios, salas de aula e espaços livres, onde são desenvolvidas e aprimoradas tecnologias e práticas voltadas para realidade local. É o primeiro hospital veterinário da região a ser construído.


O equipamento está localizado no sertão do Cariri, sul do estado do Ceará, Nordeste do Brasil, uma região que apresenta uma heterogeneidade cultural e social bastante diversificada. É uma das regiões de maior originalidade cultural do país, com destaque para as suas manifestações populares (festas, folclores) e seu artesanato, algo que o torna um dos principais alvos para estudos antropológicos e históricos do Nordeste.

Sua pluralidade cultural é resultado da miscigenação de diversos povos, que trouxeram consigo o artesanato, a música e a gastronomia, e conservaram manifestações da cultura popular como: produção de cordéis (literatura popular), artesanato, principalmente em madeira, couro e argila, Festas de Pau de Bandeira e várias expressões das festas juninas, além de penitências religiosas. Apesar disso, ainda é uma região bastante periférica, com baixos investimentos econômicos e uma persistente desigualdade social.

O clima local é o semiárido com altas temperaturas ao longo de todo o ano e chuvas concentradas no primeiro semestre que fazem com que a umidade relativa do ar nos últimos meses do ano seja bem baixa. O bioma local é a caatinga, que quer dizer mata branca em tupi guarani, e é o único bioma exclusivamente brasileiro. Sua vegetação é adaptada à escassez de água (presente no segundo semestre), perdendo suas folhas e evitando assim a perda de água. Ventos sopram geralmente de leste e sudeste ao longo do ano.

O local escolhido para abrigar as atividades do hospital está localizado dentro do campus Lagoa Seca, do centro universitário Unileão, uma zona de fácil acesso e ainda pouco adensada. Possui o campus totalmente aberto à população. Junto ao campus da UFCA – Universidade Federal do Cariri – , ao campus do IFCE – Instituto Federal do Ceará – , além de alguns colégios, todos bastante próximos, o Hospital integra o principal polo educacional da cidade.

Planta Pavimento Térreo, Pavimento Superior, Cobertura e Composição Formal do Hospital

Já o terreno propriamente dito possui um desnível de 7 metros ao longo de 150 metros de comprimento, gerando uma inclinação de aproximadamente 5% nesta dimensão. Tem um formato trapezoidal, onde a base maior (voltada a leste) possui 136,00m, a base menor (voltada a oeste) possui 102,00m, o lado voltado a norte com 150m e o lado voltado a sul com 130,00m. Sua área total, portanto, é de 15.206,17m².

Corte Perspectivado e Cortes A, B, C, D e E

O edifício parte da premissa de proporcionar muito conforto e bem-estar aos usuários, sejam eles animais ou pessoas. Para isso tivemos que adaptar o edifício ao clima existente, utilizar vegetação nativa ou adaptada ao lugar, além de valorizar a cultura, os materiais e a mão-de-obra da própria região, para que haja um fomento da economia local e o equipamento seja um combustível para a valorização do lugar.

Apresentação Elemento Vazado

A busca por uma fluidez espacial, com espaços dinâmicos, planos curvos e inclinados, busca uma maior associação com a natureza e o ambiente natural dos animais, facilitando o seu bem-estar e a sua adaptação, evitando desconfortos.

Quando se trata de equipamentos de saúde, o conceito de humanizar espaços é bem difundido, com pesquisa indicando a importância do espaço para a recuperação dos pacientes. Pois bem, este mesmo conceito foi utilizado também neste equipamento, só que agora também para os animais. “Humanizar animais?talvez seja um pouco inadequado, mas proporcionar o mesmo conforto que damos para nós, a eles, já é uma necessidade. Neste espaço, temos o mesmo tratamento, somos todos animais.

A ideia principal foi a concepção de uma grande coberta solta da edificação, proporcionando muita sombra para as atividades que acontecem logo abaixo. Essa coberta, em telhas metálicas e translúcidas, é sustentada por treliças metálicas curvas, como se fossem ondas, com interrupções estrategicamente posicionadas para permitir a renovação do ar e consequentemente a saída do ar quente.

As telhas translúcidas garantem o aproveitamento da luz natural. A grande sombra protege não só os edifícios abaixo como também todos os espaços livres entre eles, incluindo jardins, circulações, áreas de convivência, piquetes, ambulatório e recepção.

As atividades do hospital foram distribuídas em seis blocos (retangulares ou trapezoidais) afastados entre si, gerando espaços entre eles e permitindo a livre ventilação cruzada. Esses espaços são repletos de jardins que trazem umidade, gerando um microclima agradável e contribuindo para a regulação da temperatura, principalmente na época seca. O fechamento desses edifícios é feito em esquadrias de alumínio branco e vidro, moduladas, em faixas verticais e desencontradas, ora nascendo do topo, ora do piso, tornando as fachadas mais dinâmicas e captando a iluminação necessária para cada ambiente interno.

Uma grande proteção solar, de sete metros de altura, feita com tijolos cerâmicos maciços desencontrados, filtra a luz do sol intensa na região e protege o interior do edifício. Seu formato ondulado traz mais estabilidade para o elemento e dialoga com as curvas da coberta. Além da proteção solar na fachada poente, serve também de separação entre o setor público e privado do equipamento.


projeto executivo


ANTEPROJETO
15 pranchas (pdf).
25,27mb


EXECUTIVO
23 pranchas (pdf).
26,95mb


LUMINOTÉCNICO
03 pranchas (pdf).
6,71mb


INTERIORES
145 pranchas (pdf).
76,52mb


PAISAGISMO
02 pranchas (pdf).
10,80mb


ficha técnica

Local: Juazeiro do Norte, CE, Brasil
Ano de início da obra: 2019
Ano de conclusão do projeto: 2023
Área do projeto: 5.236,85 m²
Arquitetura, interiores e paisagismo: Lins Arquitetos Associados – Cintia Lins e George Lins
Colaboradores: Gabriela Brasileiro, Joyce de Deus, Alessandra Braga, Armênia Araújo, Alice Teles, Mayara Rocha, Lia Lopes, Samuel Melo, Camila Tavares, Caroline Braga, Cristiellen Rodrigues, Thais Menescal e Paula Thiers


Construção:
Ampla Engenharia
Instalações: Ampla Engenharia
Estrutura: Tiago Ivo
Cobertura: Vão Livre


Fotos: Joana França
Contato: contato@linsarquitetos.com.br

Premiação:
Obra do ano Archdaily Brasil – 2024


galeria


colaboração editorial

Ana Júlia Freire

deseja citar esse post?

LINS, Cintia. LINS, George. “Hospital Veterinário Escola da Unileão”. MDC: Mínimo Denominador Comum, Belo Horizonte, s.n.,ago-2024. Disponível em //www.28ers.com/2024/08/29/hospital-veterinario-escola-da-unileao/. Acesso em: [incluir data do acesso].


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//28ers.com/2024/08/29/hospital-veterinario-escola-da-unileao/feed/ 0 18083
Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2024/03/27/academia-escola-unileao/ //28ers.com/2024/03/27/academia-escola-unileao/#respond Wed, 27 Mar 2024 18:15:15 +0000 //28ers.com/?p=16115 Continue lendo ]]> por Lins Arquitetos Associados
9 minutos

Academia Escola Unileão (texto fornecido pelos autores)

A academia-escola da Unileão está situada na cidade de Juazeiro do Norte/CE, região do Cariri, no meio do sertão nordestino. Ela serve de apoio ao curso de Educação Física do Centro Universitário, atendendo aos alunos e funcionários da instituição.

Fotografia: Joana França

O edifício foi acomodado em um platô pré-existente que direcionou sua implantação no sentido Leste-Oeste, ou seja, com grandes fachadas expostas a uma maior incidência solar todos os dias do ano. Essa situação não é a ideal para o clima semiárido brasileiro, por isso foram aplicadas estratégias de conforto ambiental para diminuir a temperatura no interior da edificação.

Fotografia: Joana França

O conjunto é formado por cinco círculos de raio 7.80m, sendo 6.00m de área útil e 1.80m de jardins. Cada círculo funciona como uma célula de setorização das atividades na qual temos duas destinadas às práticas de musculação, uma para a recepção e cantina, uma para a prática de atividades aeróbicas e a última para áreas de serviço e administração, como banheiros, depósitos, coordenação e sala de avaliação. Cada célula se conecta diretamente com a outra formando um conjunto alongado de aproximadamente 64 metros de comprimento. Três varandas ajudam na conexão dessas células e servem ora para marcar o acesso principal da academia, ora para o apoio ao treinamento funcional.

Composição formal e plantas: térreo e cobertura

Como forma de minimizar a incidência de luz solar diretamente no interior da edificação todas as fachadas foram pensadas em três camadas. A primeira delas, mais externa, tem como função filtrar a luz solar e é composta por uma paginação de tijolos cerâmicos maciços espaçados uns dos outros. Essa paginação traz tridimensionalidade à fachada além de criar um efeito de luz e sombra bem interessante. A segunda camada é composta por um jardim interno, com espécies vegetais adaptadas ao clima da região e que contribuem para gerar um microclima agradável. Por fim, a terceira camada, um pano de esquadrias pivotantes de vidro incolor que permite refrigerar a academia caso seja necessário.

Fotografias: Joana França

A coberta é composta por telhas termo-acústicas protegendo o interior do edifício do calor excessivo. O concreto aparente e o tijolo cerâmico maciço na sua cor natural são os materiais que se destacam. O piso utilizado é o industrial e todas as instalações são aparentes trazendo um caráter fabril ao interior do ambiente.

Fotografias: Joana França

Em síntese, o edifício se propõe a racionalizar a distribuição espacial, promovendo uma leitura fácil da setorização, ao mesmo passo que explora os estímulos tátil e visual através dos materiais, dos efeitos de luz e sombra e da vegetação, contribuindo com o conforto e permanência dos usuários.

Além disso, o edifício foi todo construído com mão-de-obra e materiais locais, contribuindo para uma menor pegada de carbono e valorização da economia do lugar. Isso foi de fundamental importância para reduzir custos e, ao mesmo tempo, valorizar nossas técnicas construtivas e os nossos materiais, integrando o usuário ao edifício, e o edifício à paisagem.

Fotografias: Joana França + Cortes


Sobre o projeto: Entrevista exclusiva para MDC.

por George Lins (G.L.)

MDC – Como você contextualiza essa obra no conjunto de toda a sua produção?

G.L. – É sem sombra de dúvidas a obra mais conhecida do nosso escritório, a que teve o maior alcance e o maior número de publicações. Foi vencedora do prêmio IABSP/2019 e Tomie Ohtake Akzonobel/2020, além de ser indicada ao prêmio Oscar Niemeyer/2020. Por tudo isso, ela tem uma importância enorme para a gente. O fato é que ela faz parte e dialoga com uma série de outras obras que fizemos dentro do Campus da Unileão, em Juazeiro do Norte/CE. Ela, juntamente com o edifício do NPJ e do Juizado Especial, compartilha muitas similaridades, apesar de terem programas de necessidades bem diferentes.

MDC – Como foi o mecanismo de contratação do projeto?

G.L. – O mecanismo foi a contratação direta. A Unileão é um centro universitário privado situado na região do Cariri cearense e fomos contratados por eles para elaborar esse projeto específico, além de outros para os diversos campi que eles possuem espalhados pela região.

MDC – Como foi a fase de concepção do projeto? Houve grandes inflexões conceituais? Você destacaria algum momento significativo do processo?

G.L. – O projeto nasceu com um programa maior e em um outro terreno. Após a apresentação do estudo ao cliente, este decidiu “enxugar” um pouco o programa de necessidades e mudar o terreno, deixando-a mais próxima de outros dois edifícios já existentes no Campus (NPJ e Juizado Especial). Após este fato, abandonamos totalmente o primeiro estudo e nos concentramos em setorizar ao máximo o programa de necessidades, gerando “células?de atividades. Essas células nasceram inicialmente em uma forma hexagonal onde as suas faces se conectavam umas às outras, como uma colmeia. Cada célula de atividade era um hexágono ao invés de um círculo. O edifício foi desenvolvido todo dessa maneira, porém, ao final do processo, vimos que a mudança do hexágono para o círculo não iria trazer prejuízos para o funcionamento das atividades propostas, além de trazer uma composição formal muito mais interessante, mais orgânica. Por fim, optamos por refazer as células, agora no formato circular, e reapresentar a nova proposta ao cliente, que aprovou de imediato e pudemos seguir em frente.

MDC – Nas etapas de desenvolvimento executivo e elaboração de projetos de engenharia houve participação ativa dos autores? Houve variações de projeto decorrentes da interlocução com esses outros atores que modificaram as soluções originais? Se sim, pode comentar as mais importantes?

G.L. – Sempre dialogamos com os profissionais que elaboram os projetos complementares, desde a etapa do estudo preliminar. Propusemos soluções, discutimos com eles, sempre com o intuito de simplificar ao máximo as soluções construtivas em geral. Arquitetura, estrutura e instalações andam juntas. A partir disso, podemos antecipar problemas e incompatibilidades que surgem naturalmente, o que nos dá mais tempo para pensarmos juntos e propor a melhor solução. Nesse projeto, especificamente, não houve nenhuma modificação na solução original apresentada por nós a esses autores, apenas alguns ajustes de dimensionamento. O conceito, entretanto, permaneceu. O caminho foi bem linear.

MDC – Os autores dos projetos tiveram participação no processo de construção/implementação da obra? Se sim, quais os momentos decisivos dessa participação?

G.L. – Sim. Estivemos presentes e participamos do processo de construção da obra desde o início, apesar de não sermos os responsáveis diretos pela obra (essa responsabilidade ficou a cargo da Ampla Engenharia). Entretanto, assumimos o papel de fiscalização e pudemos acompanhar todo o processo, desde o início até a entrega final. Isso é de suma importância, uma vez que mudanças e adaptações são necessárias no decorrer da obra e o fato de estar acompanhando o processo nos permite participar ativamente das decisões, contribuindo para que a obra seja executada sem grandes modificações. Destaco a paginação da pele em tijolos cerâmicos como um ponto fundamental de decisão na obra. Ela foi testada e adaptada após conversas com os engenheiros e pedreiros locais para que a sua execução fosse a mais assertiva possível.

MDC – Você destacaria algum fato relevante da vida do edifício/espaço livre após a sua construção?

G.L. – Logo após a inauguração do edifício, as varandas voltadas ao leste, que antes haviam sido fechadas com vidro, tiveram que ser abertas para acomodar um programa maior, voltado ao treinamento funcional, e que demandava uma maior integração interior x exterior. Após sermos chamados, rapidamente propusemos a exclusão da cortina de vidro e integração com o jardim externo, permitindo assim o desenvolvimento das atividades propostas. Outro fato interessante foi a constatação do edifício poder regular a sua temperatura interna apenas através das aberturas das esquadrias e promoção da ventilação cruzada. Isso faz com que o edifício não necessite de ar-condicionado durante boa parte do dia, mesmo estando em um clima semiárido.

MDC – Se esse mesmo problema de projeto chegasse hoje a suas mãos, faria algo diferente?

G.L. – Provavelmente sim. A nossa produção depende diretamente das nossas vivências e experiências ao longo dos anos, além é claro do que estamos consumindo de referências no momento em que projetamos. Apesar desse fato, nosso escritório possui diretrizes bem consolidadas, o que faz com que a gente siga uma linha projetual bem definida ao longo desses anos, desde a nossa fundação. O respeito ao local onde a obra está inserida, adaptando-a ao clima, ao bioma, à cultura local e absorvendo mão-de-obra e materiais locais é algo que faz parte da nossa essência e aplicamos em todos os nossos projetos. O partido, entretanto, é natural que sofra adaptações ao longo do tempo.

MDC – Como você contextualiza essa obra no panorama da arquitetura contemporânea do seu país?

G.L. – Penso que essa obra contribui muito para o debate acerca da arquitetura contemporânea brasileira, uma vez que foi produzida em uma realidade periférica. O Brasil é um país continental, com uma rica diversidade cultural e condições climáticas bem distintas. O que produzimos fora da capital, no interior do Ceará, na região Nordeste, é bem diferente do que é produzido no eixo Rio-São Paulo ou na região Sul, por exemplo. Enfrentamos um clima mais hostil, com uma certa escassez de recursos e um orçamento limitado, o que não nos impede de produzir uma arquitetura contemporânea, mais adaptada à nossa realidade, a nossa gente. Penso que essa arquitetura produzida no Nordeste brasileiro, não só esse exemplo da Academia Escola Unileão, mas várias outras que estão sendo produzidas, seja no interior ou no litoral, tem muito a contribuir (e acrescentar) para a arquitetura contemporânea brasileira como um todo.


projeto executivo


PLANTAS, CORTES E FACHADA

7 pranchas (pdf).
5,59mb


INTERIORES

10 pranchas (pdf).
3,16mb


DETALHES

4 pranchas (pdf).
15mb


ficha técnica do projeto


Local: Juazeiro do Norte, CE, Brasil
Ano de projeto: 2017
Ano de execução e conclusão da obra: 2018
Área: 965 m²
Autor: Cintia Lins e George Lins
Colaboração: Gabriela Brasileiro, Camila Tavares, Hanna dos Santos, Samuel Melo, Alice Teles e Paula Thiers

Arquitetura: Lins Arquitetos Associados
Construção: Ampla Engenharia

Fotos: Joana França
Contato: contato@linsarquitetos.com.br

galeria


colaboração editorial

Isabela Gomide

deseja citar esse post?

LINS, Cintia. LINS, George. “Academia Escola Unileão”. MDC: Mínimo Denominador Comum, Belo Horizonte, s.n., mar-2024. Disponível em //www.28ers.com/2024/04/27/academia-escola-unileao/. Acesso em: [incluir data do acesso].


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//28ers.com/2024/03/27/academia-escola-unileao/feed/ 0 16115
Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2023/09/13/parque-rachel-de-queiroz/ //28ers.com/2023/09/13/parque-rachel-de-queiroz/#respond Wed, 13 Sep 2023 22:23:58 +0000 //28ers.com/?p=13002 Continue lendo ]]> Por Architectus S/S
12 minutos

Parque Rachel de Queiroz (texto fornecido pelos autores)

Nas primeiras horas da manhã já começa o movimento. Em sua maioria, frequentadores com roupas de ginástica escolhem começar o dia praticando alguma atividade física da sua preferência. Caminhada, corrida, academia ao ar livre, bicicleta, futebol e vôlei são apenas algumas das opções disponíveis. Tudo isso às margens de 9 lagoas interconectadas, as wetlands. Esse é apenas um breve resumo do que se pode encontrar na 1° etapa do Parque Rachel de Queiroz.


Fotografia: Joana França

Com 10 km de extensão e cerca de 203 hectares, quando finalizado, o Parque será o 2° maior de Fortaleza ?CE. Dada a sua grande extensão, o espaço foi dividido em 19 trechos, dos quais 6 já foram executados. O conceito utilizado para a concepção do projeto foi o de Parque Linear, utilizando o sistema viário existente como conexão entre as áreas verdes que cortam diretamente 8 bairros na zona Oeste da capital cearense.


Fotografia: Joana França

O sexto trecho, recém-inaugurado, resgata uma área degradada que há muitos anos era motivo de preocupação para a população do bairro Presidente Kennedy. O local, maior área disponível para intervenção do Parque, era um grande terreno baldio, tomado pelo depósito de lixo irregular e esgoto clandestino. Essa situação contribuía para agravar a poluição do Riacho Cachoeirinha, recurso hídrico que corta o terreno e que estrutura a maior área do parque. Além disso, devido ao intenso processo de adensamento dessa região da cidade e a consequente diminuição das áreas permeáveis no entorno, acarretou alagamentos frequentes no terreno pela sobrecarga no sistema de escoamento das águas pluviais.

comparação de antes x depois

Por se tratar de uma área de preservação municipal alagada, o projeto do Parque Rachel de Queiroz adotou a drenagem como eixo estruturador. Para melhorar a qualidade da água do Riacho Cachoeirinha, bem como criar um sistema de amortecimento de cheias foi empregada a técnica das wetlands.


Croqui Wetlands


Detalhes Aduelas



Após estudos hidrológicos, foram propostas 9 lagoas interconectadas que realizam um processo de filtragem natural das águas do Riacho e de galerias pluviais, através de decantação e fitorremediação. Esse processo é realizado por microorganismos que ficam fixados tanto na superfície do solo, quanto nas raízes das plantas aquáticas das lagoas.


Masterplan com fluxo hídrico


Fotografias: Joana França

Ou seja, além de marcarem o ambiente do Parque através do seu potencial paisagístico, as wetlands são uma estratégia fundamental para a recuperação ambiental da área. Aliada a isso, a implantação de áreas verdes, que envolveu obras de terraplanagem e o plantio de cerca de 600 árvores, foi determinante para melhoria das condições de desenvolvimento da fauna e flora locais. Após a inauguração desse trecho do Parque, os frequentadores já se acostumaram a ver diferentes espécies do ecossistema nativo em meio a paisagem urbana.


Fotografias: Joana França

Os caminhos entre as lagoas conduzem os frequentadores para áreas de permanência estruturadas com diversos equipamentos de cultura, esporte e lazer. Anfiteatro, cachorródromo, quadras poliesportivas, playgrounds, espiribol, espaço leitura, academia ao ar livre são apenas algumas das atividades disponíveis. Uma pista bidirecional que circunda todo o perímetro do Parque garante um espaço seguro e apropriado para caminhadas, corridas e passeios de bicicleta. Desde o início do projeto, a diversidade de usos proporcionada pelo programa de necessidades do Parque Rachel de Queiroz foi pensada para incluir e incentivar a apropriação do espaço pela população, entendendo o uso da área como componente fundamental para a sustentabilidade ambiental, evitando que volte a se transformar em local de depósito clandestino de lixo, entulho ou esgoto.


Fotografias: Joana França

Por se tratar de uma área extensa, a conexão entre os espaços do Parque era essencial para que o mesmo fosse bem utilizado como um todo. Pensando nisso, foram propostas duas passarelas metálicas para que o Riacho Cachoeirinha não se tornasse uma barreira física. Executadas com perfis tubulares em aço e piso em concreto, as passarelas garantem fácil acesso, principalmente, aos frequentadores que chegam pela R. Licurgo Montenegro.

O projeto do mobiliário urbano do Parque levou em consideração dois princípios: sustentabilidade e resistência. Os brinquedos do playground, espaço PET e caramanchões foram executados com peças de eucalipto tratado. Já os bancos possuem assentos em madeira biossintética e estrutura de concreto.


Fotografias: Joana França

Além de todo o ambiente construído do Parque Rachel de Queiroz, a identidade visual também fez parte do projeto desenvolvido pela Architectus S/S. Desde a logo que evidencia as wetlands como protagonistas até a sinalização com placas e totens que não só direcionam, como educam e informam. Tudo isso para qualificar esse espaço público em diferentes níveis.

É importante contextualizar a área em que o projeto foi implantado: zona Oeste de Fortaleza, marcada por bairros populares que tiveram um alto crescimento populacional nos últimos anos. A região, mesmo detentora de grandes áreas livres, era carente de espaços públicos qualificados até a inauguração do Parque Rachel de Queiroz. Todos esses fatores explicam a rápida apropriação pela comunidade do entorno, inclusive impulsionando o comércio tanto formal, quanto informal na região.


Fotografia: Joana França

Poucos meses após a inauguração do Parque Rachel de Queiroz, já é difícil lembrar do terreno que trazia tantos problemas para a população. A transformação em um espaço público movimentado, vivo, pulsante, foi rápida. Urbanidade aplicada no melhor sentido da palavra.


Sobre o projeto: Entrevista exclusiva para MDC.

por Elton Timbó (E.T.) e Gerson Amaral (G.A.)

MDC – Como vocês contextualizam essa obra no conjunto de toda a sua produção?

E.T. – Nós (Architectus) atuamos há 20 anos no mercado de projetos públicos, nesse tempo tivemos a oportunidade de projetar uma vasta gama de temas, seja na área da arquitetura, do urbanismo, do paisagismo e disciplinas de engenharia.
O Parque Rachel de Queiroz, por sua dimensão e interação direta na malha urbana de Fortaleza, impactando 14 bairros, nos trouxe muitos desafios e ao mesmo tempo a oportunidade de adotar técnicas e conhecimentos diversos adquiridos nesses 20 anos de intensa atividade profissional.

G.A. – O Parque Rachel de Queiroz, pela sua grande escala, complexidade e impacto social, foi uma grande oportunidade de propor soluções projetuais que já haviam sido testadas em projetos anteriores, em menor escala, viabilizando a aplicação de princípios de requalificação urbana, ecologia e sustentabilidade que até então foram inéditos para a capital cearense nessa escala de intervenção.

MDC – Como foi o mecanismo de contratação do projeto?

E.T. – Licitação. Através dessa concorrência pública ganhamos o direito de projetar os 203ha do Parque Linear Rachel de Queiroz. O projeto compreende um Parque Linear de 19 trechos, destes 5 trechos foram executados até o momento. O projeto foco desse artigo compreende o último trecho inaugurado: trecho 6.

MDC – Como foi a fase de concepção do projeto? Houve grandes inflexões conceituais? Vocês destacariam algum momento significativo do processo?

E.T. – Após uma demorada fase de Levantamento Topográfico Cadastral, vimos que as conexões urbanas ainda existiam e a partir daí os conceitos foram firmados. O Parque Linear seria possível desde que houvesse algumas desapropriações e remanejamentos pontuais. Além das conexões, havia problemas com alagamentos e necessidade de melhorias na qualidade das águas residuais, além de espaços qualificados ao esporte, lazer e contemplação.

G.A. – O sistema de wetland concebido para alguns trechos do parque surgiu de uma análise crítica feita de outras intervenções feitas em corpos hídricos na cidade em contextos ambientais e urbanos semelhantes. O projeto do Parque Rachel de Queiroz propôs uma nova forma a lidar com a dinâmica do Riacho Cachoeirinha (que corta o trecho 6) com uma solução de infraestrutura que reconfigura a paisagem a partir de sua dinâmica natural, viabilizando uma recuperação ambiental alinhada com as características e usos urbanos.

MDC – Nas etapas de desenvolvimento executivo e elaboração de projetos de engenharia houve participação ativa dos autores?

E.T. – Na concepção dos projetos da wetlands tivemos a participação ativa de engenheiros das áreas de hidráulica, terraplenagem e estruturas de concreto; estes desenvolveram os complementos necessários que tornaram realidade os espaços e soluções projetadas por nós.

G.A. – A concepção do sistema hidráulico das wetlands foi todo desenvolvido pela equipe de urbanismo e paisagismo. O pré-dimensionamento do sistema foi avaliado e submetido ao cálculo hidráulico que apontou os ajustes necessários de vazão e níveis, os quais foram devidamente compatibilizados pelos autores.

MDC – Houve variações de projeto decorrentes da interlocução com esses outros atores que modificaram as soluções originais? Se sim, podem comentar as mais importantes?

G.A. – Houve uma certa resistência, desde o princípio, na adoção do sistema de wetland pela falta de uma referência nacional de sistema semelhante. Ao longo do processo de desenvolvimento de projeto diversos surgiram propostas de modificação do sistema para soluções mais tradicionais como barragens, piscinões em concreto ou impermeabilização das margens das lagoas, mas todas foram descartadas dando prioridade a soluções mais naturais.

A pedido da fiscalização do projeto por parte da Prefeitura Municipal, toda a proposta de urbanismo teve suas áreas pavimentadas reduzidas ao mínimo necessário para atender a legislação ambiental vigente. Igualmente foram reduzidas consideravelmente as propostas de construção de quiosques, guaritas e equipamentos que ocasionassem a impermeabilização do solo.

MDC – Os autores dos projetos tiveram participação no processo de construção/implementação da obra?

E.T. – Sim, felizmente o cliente (Prefeitura Municipal de Fortaleza) sempre pedia nossa participação nas principais tomadas de decisão na obra, desde a modificação de especificações de materiais a determinação de níveis e vazões a serem adotadas nas lagoas. Lutamos muito para que tudo se mantivesse conforme projetado.

G.A. – O acompanhamento do projeto foi fundamental para assegurar a manutenção do conceito do sistema, fazendo com que os ajustes necessários durante as obras mantivessem os princípios que balizaram as soluções.

MDC – Vocês destacariam algum fato relevante da vida do edifício/espaço livre após a sua construção?

E.T. – Vários fatos: melhorias reais na qualidade das águas, recomposição da flora e fauna, garantia de mobilidade, permeabilidade e acessibilidade, impacto positivo na cultura local, no esporte e lazer, além de um intenso uso da população. Conseguiu-se dar o uso adequado a essas áreas de fundo de vale urbanas, fazendo nascer a sensação de pertencimento e consequente cuidado por parte da população local.

G.A. – A apropriação da população foi imediata, transformando uma área antes abandonada e degradada em uma nova centralidade para toda uma região da cidade. Poucos meses após sua inauguração o espaço já passou a figurar como um dos cartões postais da capital, atraindo visitantes de toda a cidade e região metropolitana.

MDC – Se esse mesmo problema de projeto chegasse hoje a suas mãos, fariam algo diferente?

G.A.– Conceitualmente os princípios adotados seriam os mesmos. Eventualmente seriam feitas modificações em detalhes construtivos específicos como mobiliário urbano e nos dispositivos de conexão entre as lagoas.

MDC – Como vocês contextualizam essa obra no panorama da arquitetura contemporânea do seu país?

E.T. – Ainda são poucos os projetos no Brasil e no mundo que abordam o manejo sustentável das águas superficiais aliado aos aspectos urbanos e comunitários. O projeto do Parque Raquel de Queiroz mostra que é possível avançarmos com esse olhar inovador da arquitetura e do urbanismo.

G.A. – Percebemos que o trecho 06 do Parque Rachel de Queiroz tem sido frequentemente citado, em sites e publicações especializadas, como um bom exemplo de sustentabilidade urbana. O contexto socioeconômico e ambiental onde se insere parece ter sido o grande diferencial dentro da produção contemporânea, ao se tornar um exemplo exitoso de aplicação dos conceitos de Soluções Baseadas na Natureza (SBN) para a recuperação ambiental de um recurso hídrico associado a requalificação urbana em zona pobre e em um país tropical.

MDC – Há algo relativo ao projeto e ao processo que gostariam de acrescentar e que não foi contemplado pelas perguntas anteriores?

E.T. – O Projeto do Parque Rachel de Queiroz trata-se de uma grande Requalificação Urbana com extensão de 10Km atravessando diversos bairros de ocupação consolidada e densa da capital cearense. Todos os 19 trechos do Parque margeiam recursos hídricos e áreas verdes plenamente possíveis de interligações. Ao adotar a drenagem como eixo estruturador para o projeto, viu-se que esses recursos hídricos tinham alta carga de matéria orgânica, por isso a adoção da técnica de wetlands (alagados construídos) com uso de margens vegetadas para melhoria da qualidade dessas águas e valorização da fauna e flora locais. O conjunto desses alagados faz também o importante papel de lagoas de retenção na ocorrência de enxurradas acabando com as inundações que constantemente aconteciam.

Quando executado em sua completude, o Parque Rachel de Queiroz será o segundo maior parque da cidade de Fortaleza.


projeto executivo


EXECUTIVO COMPLETO

8 pranchas (pdf).
30,52mb


localização e ficha técnica do projeto

Local: Fortaleza – CE
Ano de projeto: 2022
Área total do parque: 2.030.000,00 m²
Área total da primeira etapa (trecho 6, 1ª etapa): 90.969,41 m²
Arquitetura, urbanismo e paisagismo: Architectus – Elton Timbó, Mariana Furlani, Alexandre Landim, Ricardo Sabóia, Gerson Amaral, Jaqueline Martinez (autores); Tatiana Rocha, Fernanda Frota, Carolina Vieira, Vitor Alencar, Jairo Diniz, Paulo André, Flaviane Rodrigues (equipe)


Construtora: Athos Construções
Estrutura metálica:
Eng. Francisco Holanda
Estrutura de concreto:
Eng. Juarez Santiago
Instalações:
Eng. Américo Farias, Eng. Osvaldo Holanda, Eng. Allisson dos Santos, Eugênio Mesquita, Erasmo Carlos
Orçamento: Lyncoln Freitas, Carmilson Andrade
Consultoria ambiental: Gabriel Theophilo (Eng. Agrônomo), Ricardo Augusto (Geólogo), Juarez Santiago (Eng. Civil)
Contratante: prefeitura municipal de Fortaleza


Fotos:  Joana França
Contato: comercial@architectus.com.br


galeria


colaboração editorial

Renan Maia

deseja citar esse post?

TIMBÓ, Elton. FURLANI, Mariana. LANDIM, Alexandre. SABOIA, Ricardo. AMARAL, Gerson. MARTINEZ, Jaqueline. “Parque Rachel de Queiroz”. MDC: Mínimo Denominador Comum, Belo Horizonte, s.n., set-2023. Disponível em //www.28ers.com/2023/09/13/parque-rachel-de-queiroz. Acesso em: [incluir data do acesso].


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Joana Fran莽a – mdc . revista de arquitetura e urbanismo //28ers.com/2023/07/11/paroquia-sagrada-familia/ //28ers.com/2023/07/11/paroquia-sagrada-familia/#respond Tue, 11 Jul 2023 18:21:06 +0000 //28ers.com/?p=11156 Continue lendo ]]> Por arqbr + Luciana Saboia
9 minutos

Paróquia Sagrada Família (texto fornecido pelos autores)

?em>Encontrei-me no altiplano, aquele horizonte sem limite, excessivamente amplo. É fora de escala ?como um oceano com imensas nuvens movendo-se sobre ele. Colocando a cidade no meio, nós poderíamos estar criando uma paisagem.”? As palavras de Lucio Costa sobre as percepções e sensações iniciais ao deparar-se com o sítio escolhido para a edificação da Nova Capital do Brasil, Brasília, evoca um dos signos constituintes da concepção urbanística, bem como da representação de suas paisagens: a presença do horizonte. Para além do sentido de organização e orientação, o horizonte expressa a visão do todo e, primordialmente, o vínculo entre o observador e o ambiente, condição necessária ao aparecimento da paisagem.

Fotografia: Joana França

Do gesto projetual à inscrição no território, as quatros escalas – monumental, gregária, residencial e bucólica – assinalam a sensibilidade contemplativa dada à paisagem, a consideração às ambiências urbanas, assim como as distintas formas de tratá-las. Mas será precisamente a escala bucólica, que definirá o caráter de Brasília enquanto cidade-parque, ao evidenciar a proximidade com a natureza intocada e um continuum estético entre espaços habitados, espaços livres, grandes extensões do cerrado, parques, cinturões verdes esparramados ao longo de eixos viários e o horizonte sempre desimpedido.

No processo de expansão urbana iniciado antes mesmo de sua inauguração segundo o modelo de cidades-satélites, o sentido de continuidade e visibilidade do conjunto urbano será dado pelas estradas parques, inspiradas nas parkways de Olmsted e Vaux e projetadas como instrumentos de planejamento regional. Às margens da EPIA, Estrada parque Indústria e Abastecimento, uma das principais componentes do sistema viário radioconcêntrico implantado para resguardar o Plano Piloto idealizado por Lucio Costa, encontra-se o sítio destinado à Paróquia Sagrada Família.

Fotografia: Joana França

Caracterizada por uma exuberante alameda de eucaliptos que emoldurava a entrada da cidade, a EPIA, federalizada em 2004, foi transformada recentemente em via expressa, tendo seu leito principal ampliado e o tráfego de passagem segregado do tráfego local. Com a poda de quase a totalidade das árvores para abrigar vias marginais, o entorno esmaeceu de seu caráter bucólico distintivo, reforçado pelo parcelamento do solo, crescimento extensivo de moradias de alto padrão e grandes empreendimentos comerciais, criando rupturas no tecido urbano e conformando uma paisagem genérica em mutação constante. Assim, a função urbana da estrada, a atenção às qualidades cênicas e a experiência sensível do percurso dão lugar a velocidade, a eficiência e a fluidez sob uma lógica rodoviarista.

Implantação

O partido adotado desdobra-se segundo a relação entre espiritualidade, natureza e comunidade. A espiritualidade comunica-se na religião católica através de seus ritos, celebrações e signos sagrados. O sentido de sagrado permanece e renova-se no contato sensível da natureza, que evoca a presença divina e a integração com o cosmos. Por sua vez, a arquitetura tem sido o espaço privilegiado de manifestação do sagrado por aquele que a ocupa, onde a luz penetra com delicadeza ou o silêncio da pedra manifesta-se no murmúrio das preces. A nave circular traz como conceito esse gesto de acolhimento quando aproxima o altar dos fiéis.

Fotografia: Joana França

A luz natural penetra pelo anel circular da cobertura, transformando a espacialidade interna da nave, disposta meio nível abaixo da cota natural do terreno, o que permite o transbordamento da paisagem através de uma pequena abertura rente a rés-do-chão à medida que preserva a intimidade do espaço interno. Tal visada só é possível pela elevação do volume circular de concreto aparente, suspenso por seis pilares integrantes da estrutura de fundação encaixada na topografia. Ao revelar a presença do horizonte, a arquitetura torna-se elemento constitutivo da paisagem, uma abertura para a dimensão poética do mundo, entrelaçando a realidade material ao olhar de seu espectador.

Corte e detalhe ampliado

Fotografia: Joana França

O traçado gerador do projeto é determinado por dois eixos principais. O eixo noroeste-sudeste interliga a nave circular, o anexo e a edificação existente ao fundo, onde localizam-se as atividades paroquianas. Ao longo de sua extensão, configura-se uma praça linear, um espaço de estar voltado para a cidade, que atua como suporte ao percurso errático daqueles imersos no ato ritualístico ou mesmo ao viajante da estrada, na busca pela suspensão do cotidiano ou de um refúgio dos tormentos do próprio existir. Perpendicularmente, o eixo nordeste-sudoeste preserva a visão contemplativa: o cruzamento da linha do horizonte com o volume vertical do campanário sinaliza e orienta o visitante ou àqueles que à distância passam em grande velocidade na via expressa.

Plantas térreo e subsolo

Pode-se afirmar que o partido arquitetônico sintetiza três premissas fundamentais presentes em Brasília: a implantação edilícia inscrita delicadamente na topografia e sua abertura ao horizonte; a indissociabilidade entre o urbano e sua arquitetura, entre o espaço público e o privado e, por conseguinte, entre a comunidade e o sagrado; e terceiro, a consideração da paisagem enquanto elemento estruturante e fundamental da configuração arquitetônica, reconhecido no tombamento da cidade como patrimônio mundial da humanidade pela UNESCO.

1 –  COSTA apud SHOUMATOFF. Profiles [Brasília]. The New Yorker. New York, nov. 1980, p. 94.


Sobre o projeto: Entrevista exclusiva para MDC.

por Eder Alencar (E.A.)

MDC – Como você contextualiza essa obra no conjunto de toda a sua produção?

E.A. – É uma obra de importância significativa, pois marca o início do ARQBR e possui, em sua concepção, os princípios que nortearam toda a produção posterior do escritório, tais como a definição de eixos que regulam a ocupação do lugar, a relação com a topografia a partir do desenho do chão e o diálogo com a paisagem, tornando-a parte integrante do partido arquitetônico.

MDC – Como foi o mecanismo de contratação do projeto?

E.A. – Foi uma concorrência fechada, com uma comissão julgadora formada por membros da comunidade, pessoas de diversas áreas profissionais. O projeto vencedor foi escolhido com base em parâmetros estabelecidos pela própria comissão. Cada membro dessa comissão, individualmente, atribuiu suas notas a cada parâmetro e o projeto vencedor foi aquele que atingiu a maior média.

MDC – Como foi a fase de concepção do projeto? Houve grandes inflexões conceituais? Você destacaria algum momento significativo do processo?

E.A. – A concepção se deu com total liberdade de proposição, sem interferência do cliente, como em um concurso. O processo foi um tanto linear, sem grandes inflexões. Logo de início, após algumas reflexões, foram estabelecidos os conceitos que norteariam a definição do partido arquitetônico – espiritualidade, natureza e comunidade.

MDC – Nas etapas de desenvolvimento executivo e elaboração de projetos de engenharia houve participação ativa dos autores? Houve variações de projeto decorrentes da interlocução com esses outros atores que modificaram as soluções originais? Se sim, pode comentar as mais importantes?

E.A. – Sim, fizemos a indicação dos profissionais responsáveis pelas demais disciplinas e fomos responsáveis pela coordenação dos projetos. Houve duas mudanças relativas a questões da estrutura, sem, no entanto, alterar o partido estrutural e também relativas a necessidades acústicas, como a adição do ripado de madeira, com tratamento absorvente por trás, e o forro acústico micro perfurado.

MDC – Os autores dos projetos tiveram participação no processo de construção/implementação da obra?

E.A. – Tivemos participação durante todo o processo, por meio de visitas semanais à obra e reuniões em nosso escritório. Com o intuito de realizar a melhor técnica, foi constante o diálogo entre os autores do projeto e todos os profissionais envolvidos.

MDC – Você destacaria algum fato relevante da vida do edifício/espaço livre após a sua construção?

E.A. – A obra proporcionou à paroquia novas possibilidades para a realização de eventos e de reunião da comunidade, oferecendo um espaço com diversas potencialidades para a cidade. Cabe ressaltar que o anexo e a casa do padre ainda estão em processo de conclusão.

MDC – Se esse mesmo problema de projeto chegasse hoje a suas mãos, faria algo diferente?

E.A. – Acreditamos que seria natural, após 13 anos, revisitarmos o partido adotado, sem, no entanto, desviar da simplicidade e daqueles princípios que orientam a nossa prática. Possíveis mudanças se dariam menos na esfera conceitual e mais em proposições técnicas. O aprendizado adquirido ao longo da obra, que se estende até hoje em virtude das dificuldades financeiras enfrentadas pela paroquia, certamente nos conduziria a uma solução estrutural mais econômica.

MDC – Como você contextualiza essa obra no panorama da arquitetura contemporânea do seu país?

E.A. – A relacionamos com valores que reconhecemos em Brasília, os quais entendemos serem inerentes a uma arquitetura moderna brasileira. O diálogo da edificação com o chão livre e contínuo desenhando uma nova topografia e a presença da paisagem, em Brasília fortemente marcada pelo horizonte e amplitude do céu, como elemento estruturante do partido arquitetônico. Valores presentes nos projetos da Rodoviária do Plano Piloto, na Praça dos Três Poderes e nos prédios residenciais das Superquadras.

MDC – Há algo relativo ao projeto e ao processo que gostaria de acrescentar e que não foi contemplado pelas perguntas anteriores?

E.A. – A obra da Paroquia da Sagrada Família, em conjunto com a produção geral do escritório, trouxe a reflexão sobre como a obra, ao realizar-se, quando passa do desenho à sua materialização, ganha autonomia. Para além do domínio técnico, inerente às disciplinas de projeto, a obra torna-se objeto da experiência do outro e da coletividade, alcança o ser humano em suas dimensões individual e coletiva.


projeto executivo


PARTE 1:
PLANTAS, CORTES E ELEVAÇÕES

23 pranchas (pdf).
19,50mb


PARTE 2:
AMPLIAÇÕES – ÁREAS FUNCIONAIS

9 pranchas (pdf).
3,49mb


PARTE 3:
ESQUADRIAS E CAIXILHOS

9 pranchas (pdf).
5,76mb


PARTE 4:
MOBILIÁRIOS E OUTROS OBJETOS

19 pranchas (pdf).
7,46mb


localização e ficha técnica do projeto

Local: Brasília – DF
Ano de projeto: 2012 – 2015
Ano de obra: 2019 – 2022
Área Construída: 3.915 m²
Autores: Arq. Eder Alencar, Arq. André Velloso e Arq. Luciana Saboia
Colaboração: Arq. Paulo Victor Borges e Margarida Massimo
Estagiários: Rodrigo Rezende, Pedro Santos e Julia Huff

Arquitetura: ARQBR Arquitetura e Urbanismo
Construção: Técnica Construtora
Estrutura metálica:
Comini Tuler
Estrutura de concreto:
Breno Rodrigues
Instalações:
Alencar Costa
Luminotécnico:
Beth Leite
Acústica:
Síntese Acústica Arquitetônica
Paisagismo:
Quinta Arquitetura, Design e Paisagismo
Conforto Ambiental:
Quali-A Conforto Ambiental e Eficiência Energética

Fotos: Joana França
Contato: contato@arqbr.28ers.com


galeria


colaboração editorial

Renan Maia

deseja citar esse post?

ALENCAR, Eder. SABOIA, Luciana. VELLOSO, André. “Paróquia Sagrada Família”. MDC: Mínimo Denominador Comum, Belo Horizonte, s.n., jul-2023. Disponível em //www.28ers.com/2023/07/11/paroquia-sagrada-familia/ . Acesso em: [incluir data do acesso].


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